Cartas Perdidas de Ocelot I - 8

Caro tio Donan,

Muitas coisas se passaram desde minha última carta. Tive de jogar fora toda a mobília que os soldados Yanshurianos quebraram e limpar a bagunça. Eles estiveram rondando nossas terras por semanas, por isso só pude lhe enviar esta carta agora, afinal, eles não deixavam ninguém se aproximar - nem mesmo os mensageiros viajantes.

Eu não sei quais rumores já chegaram aos seus ouvidos, mas com certeza deve saber que a guerra acabou. E por mais incrível que pareça, estou envolvido nisso até o pescoço. Com certeza, não por minha vontade, mas acredito que o certo deve ser feito mesmo que eu não me sinta confortável.

Quase uma semana após a visita de Omdoria III à minha casa, ele enviou uma carta através de um dos soldados. A carta falava sobre uma conversa de paz entre os três principados, a qual estaria acontecendo em total sigilo, mas precisava ocorrer presencialmente em um local neutro para acertos finais. O que Omdoria propunha na carta era que essa reunião ocorresse em minha casa. Não me recordo se terminei de ler, apenas a amassei e a joguei no lixo, junto com a mobília quebrada.

No dia seguinte, Dulcélia encontrou a carta e leu. Ficou bastante chateada por não tê-la contado, mesmo eu dizendo estar furioso com a canalhice de Omdoria. Mas o senhor sabe bem como ela é, sempre me vence no argumento e é absurdamente paciente comigo. Dulcélia me fez entender que a paz estava em jogo. A paz que eu tanto queria, e talvez não acontecesse sem essa reunião. Lembrei de meus conhecidos mortos na guerra, muitos dos quais sequer estavam envolvidos diretamente nela.

Na semana seguinte, minhas terras estavam repletas de soldados dos três principados. Havia tendas, armamentos e tudo o mais. Tive medo de que se algo desse errado na negociação ocorresse uma chacina. O primeiro governante a chegar foi Durcan III, líder de Carnaum, tinha aparência rústica e uma barba longa. À direita dele estava o líder militar, Stofer, que havia nos visitado após o soldado Anfur contar sobre minha ajuda. Depois apareceu Adamastor, governante de Irelia, diferente de Durcan, não tinha pelos na face, o que o deixava mais jovial. Estava acompanhado de Elhand, chefe da guarda pessoal de Adamastor, caso não lembre, foi Elhand que invadiu minha casa pela janela para ter aquela conversa. Por fim, chegou Omdoria, com a mesma pompa de antes.

Os soldados haviam preparado uma grande mesa redonda no centro da sala, com cadeiras simples e sem ornamentos. A casa estava cercada e todos lá fora estavam com espadas empunhadas. Havia uma tensão no ar, mas Dulcélia não saiu do meu lado em momento algum. Todos eles agradeceram por eu ter cedido o espaço e sem delongas começaram a reunião.

Tio, o diálogo foi tenso do início ao fim, mas ali pude entender porque aquilo estava acontecendo naquele momento. Não havia misericórdia para com o povo. Era apenas jogo de poder.

Descobri que o povo de Irelia e Carnaum detestavam seus governantes, tanto quanto o povo de Yanshur detestava Omdoria III. Descobri que os três governantes estavam cansados da guerra, talvez devido à velhice, mas sabiam que se parassem não durariam muito tempo no poder. Descobri, também, que Durcan e Adamastor não foram os mandantes do assassinato do filho de Omdoria, mas isso Odoria já havia descoberto. Então não havia justificativa para a guerra ter continuado, exceto por ego e raiva.

Além disso, descobri que quem sugeriu o acordo de paz para os governantes de Irelia e Carnaum, foram os dois visitantes de minha casa: Elhand e Stofer. Os dois sempre tiveram contato direto com seus respectivos líderes. Dessa forma, Adamastor e Durcan contataram Omdoria, já sugerindo meu lar como local neutro para reunião.

Por fim, eles entraram em um impasse: Com a paz, eles não durariam no poder e seus familiares e amigos também eram rejeitados pelos povos. Mas precisavam ter alguém que os obedecesse como governante da não que estava para surgir. Foi então que meu nome foi colocado em pauta. Ormano Ocelot, o “benfeitor de Yanshur”, foi aprovado por unanimidade. Me restava apenas aceitar ou declinar, ser o rosto do reino, com o poder nas mãos desses homens.

Muitas coisas passaram por minha mente, tio. Coisas boas e coisas ruins. Mas o olhar de Dulcélia iluminou meus pensamentos e eu aceitei. Escrevo esta carta a caminho da capital de Yanshur, a qual se tornará a futura capital de Panthea.

Com carinho,

Seu sobrinho, Ormano

M Henrique
Enviado por M Henrique em 05/05/2024
Código do texto: T8056759
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