VALENTINA: A garota misteriosa

Valentina sempre foi uma menina determinada. Desde a infância, ela detestava depender dos outros. Quando algo quebrava, ela estava sempre em busca de soluções, conseguindo consertar quase tudo ao seu redor, exceto as pessoas. Na escola, sua dedicação era notável, conquistando excelentes notas.

Embora fosse pouco sociável conseguiu fazer algumas poucas amizades, entre a principal temos: Rebeca, elas têm muito em comum, mas nem sempre foi assim. Rebeca costumava ser aquela garota que parecia um tanto desligada, alguém que Valentina inicialmente não consideraria como amiga. Não sei exatamente o porquê, pois Rebeca também era esforçada e inteligente. No entanto, arrisco dizer que o fato dela ter muitas amizades, sua falta de medo do perigo e seu riso alto que ecoava pela sala de aula, a incomodava, tirando sua concentração e dificultando seu aprendizado.

Mas, um dia, completamente do nada, Rebeca apareceu com seu grupo de amigas. No começo, Valentina não entendeu o motivo, já que nenhuma delas havia dirigido uma palavra a ela antes. No entanto, para surpresa de Valentina, esse encontro inesperado veio acompanhado de um pedido de amizade, que foi selado com um presente e um bilhete que dizia:

"Quer ser nossa amiga?"

Surpreendida por esse gesto, Valentina não hesitou em aceitar o convite. Assim, a alegria de Valentina deu lugar à tristeza no primeiro dia de suas novas amizades, o que foi verdadeiramente trágico. O primeiro laço se quebrou, restando apenas dois. Eventualmente, o quarteto se transformou apenas em Valentina e Rebeca, as companheiras de batalha, que passaram a compartilhar cada momento e qualquer situação independente da qual fosse nenhuma soltava a mão da outra, era elas por elas.Inclusive passou a dividir o título de esquisitas e de maria macho.

Ir para a escola tornou-se o melhor momento do dia para as duas, pois era quando podiam se encontrar e viver intensamente cada momento juntas. A amizade delas era tão contagiante que mesmo nos dias difíceis, ela iluminava a vida de Valentina, trazendo mais cores ao seu mundo. Agora, ela não precisava mais chorar sozinha, pois tinha uma confidente, uma amiga-irmã que torcia por ela com toda as forças.

Apesar disso, nem mesmo Rebeca conhecia os segredos que são guardados no coração bondoso da sua amiga. Os pensamentos que a tira do sério e atormenta aquela menina alegre e sorridente, que nunca, nunca teve coragem de revelar seu segredo de infância. Não era por falta de confiança e sim pelo simples fato dessas lembranças serem vagas, além do que, trazer à tona essa parte do seu passado seria como trazer uma mancha para o seu novo eu, ela só queria esquecer que um dia viveu aquilo, para que fosse possível continuar a caminhada sem o peso obscuro de uma parte especifica da sua história.

Durante toda a semana, a jovem garota dedicavase às atividades escolares e ao trabalho com sua família. O artesanato sempre foi a principal fonte de renda, e por isso, toda ajuda era bem vinda... Ao termino dos trabalhos, as meninas ainda tinham as tarefas de casa e os meninos vendiam os produtos em uma barraca que ficava próximoda casa assim como tantas outras crianças de lugares periféricos, Valentina e sua família não tinham luxo; o dinheiro dava apenas para o necessário. Sempre se viravam com o que tinham. As roupas, na maioria das vezes, eram doadas por alguém conhecido, e os brinquedos geralmente eram fruto de suas criatividades.

Às vezes, ganhavam de presente algumas bonecas; no entanto, devido à quantidade de crianças, não duravam muito tempo. Todos daquele lugar eram muito humildes, tanto de coração quanto financeiramente, mas isso não era suficiente para tirar o brilho do olhar dessas crianças, que viviam como anjos na terra, sem preocupações.Enquanto isso, os pais se desdobravam para colocar a comida na mesa e não deixar nada faltar. Muitas vezes, preocupados, faziam de tudo para que as crianças

não tivessem acesso a essas preocupações. Não havia tempo bom ou ruim; todo dia era dia de ir à luta, às vezes

com as crianças, outras vezes sozinhos.

Ao fim do dia, eles se recolhiam, e começavam a contar várias histórias/causos... Logo depois todos iam dormir para no outro dia continuar com o raiar do sol. Desde cedo, todas as meninas já desenvolviam o instinto materno para cuidar de seus irmãos e primos. Muitas vezes, os garotos mais velhos também ficavam responsáveis por essas tarefas, tanto dar banho nos menores, trocar de roupa e limpá-los quanto fazê-los realizar alguma necessidade, pentear os cabelos e colocálos para dormir.

Sobre Valentina, ela sempre foi uma garota tímida, vivendo em um mundo só seu, sempre com o ar de mistério. Desde criança, experienciou muitas coisas e nunca contou a ninguém. Agora já adulta os traumas a persegue, um dia, deitada em sua cama, surgiu uma vaga memória. Todavia, ela não sabia se era real ou apenas alucinações – cenas de um tempo distante, da época em que ainda era criança. Esse pensamento é muito recorrentenão importa quanto tempo passe, uma hora ou outra aparece para perturbá-la com a incerteza, com a tristeza e com a falta de uma resposta concreta.

Para todo mundo, ela era uma garota fria, sem sentimentos, o famoso "coração de pedra". Esses eram alguns dos tantos outras características que aquela pobre menina recebia. No entanto, ninguém sabia o quanto sua mente era atribulada, ninguém acompanhou os dias e as noites de choro, os fantasmas do passado, as inseguranças, o sentimento de que não era o suficiente para alguém. Ninguém teve acesso ao pensamento em que ela buscava a morte achando que seria a melhor saída para tudo. Isso aconteceu na sua adolescência, na época em que todos a conheciam como uma pessoa pouco sociável. Apesar dos confrontos internos, era uma menina muito sorridente e brincalhona com os seus, com as pessoas que ela tinha

intimidade e podia ser ela mesma sem julgamentos.

Todos os dias, ela seguia sua rotina. Quando seus pensamentos ficavam tenebrosos, procurava um lugar mais afastado da multidão, buscando isolar-se do mundo. Ficava lá até as coisas parecerem melhores. Vivia por disciplina, estudava, ajudava os pais, saía com os amigos. Continuava caminhando com o sorriso no rosto e um vazio no coração. Muitas vezes, ela era feliz, mas como todo ser humano, a tristeza chegava, e a felicidade nunca foi eterna.

O tempo passou, a mocidade não tardou a chegar. Todas as garotas da sua idade já estavam namorando, inclusive as mais novas, e ela nunca conseguiu ficar com ninguém. Apesar de ter uma beleza radiante poucos investiam nela. Esses poucos nunca conseguiram conquistá-la. E assim ela ganhou mais um título: a menina estranha.Desde cedo, em seu coração já existia alguém que nunca deu bola para ela. Era meio frustrante vê-lo abraçar outras garotas, investir pesado em quem não dava bola para ele, enquanto ela estava ali de coração aberto e cheio de amor para dar, e nem sequer um olhar recebia do seu amado.

É incrível como alguém consegue amar e mesmo assim fazer de conta que não sente nada, justamente por medo do que os outros vão achar. Deixando de lado a vontade de arriscar, de tentar pelo menos para ter certeza se é ou não aquilo que ela quer, Valentina tinha disso. Com medo dos julgamentos alheios, guardou para si uma parte triste da sua história. Por insegurança, por muito tempo descartou todas as tentativas de ter alguém. Por medo, deixou muitas oportunidades passar tantas vezes entre seus dedos em todos os âmbitos da sua vida. O mais impressionante é que tudo isso tinha um motivo.

Às vezes, nem ela compreende, mas seus pensamentos invasivos trazem muitas recordações que comprovam o fato da sua insegurança. Ela evitou por muito tempo ficar com o garoto que gostava, se fazendo de difícil e indiferente depois de ele ter começado a gostar dela. Nunca se viu uma menina tão difícil, não cedia de jeito maneira aos seus sentimentos e nem à vontade de estar com ele.

Pra quem não viveu o que ela viveu e fácil pensar:se era ele que ela gostava porque não ficar logo com o garoto? Isso não é tão simples, como tantos outros momentos, Valentina se vê sozinha e começa então a surgir cenas e mais cenas de um dado momento, quando ainda criança estava sozinha com alguém do seu círculofamiliar. Era o lugar e o momento certo para satisfaz com aquela criança seu desejo, em um quarto sem ninguém, livre de preocupações, pois, não chegaria ninguém pra

atrapalhar, ela começa a ser tocada por aquele homem, suas mãos desliza por aquela inocente figura, seu toque vai desde as partes menos inofensivas até as mais intimas, percorrendo todo seu corpo, a qual não tinha pra onde correr, não tinha quem gritar e foi obrigada a fazer parte desse momento nojento e ainda assim ter que conviver com a pessoa todos os dias e não conseguir contar a ninguém por medo de como seria recebida à notícia. E na sua cabeça ecoava várias perguntas do tipo: como as pessoas vão reagir? Será que vão acreditar ou não? E por medo de apanhar escolheu tentar esquecer esse dia e todas aquelas cenas. Nunca tinha falado dessas coisas para ninguém, nem se quer para Rebeca a sua eterna confidente. São pontos muito sensíveis da sua vida o qual ninguém nunca tinha tido acesso.

E assim o tempo passou e quebrando o silencio ela revela para sua amiga e nesse momento ela também descobre que não foi a única a sofrer abuso. Duas crianças, duas histórias parecidas, mas com homens diferentes e com isso, caíram na real que naquela região elas não foram e não serão as únicas. Por mais horrível que tenha sido conviver com tudo isso, as garotas conseguiram seguir em frente. Com o tempo elas conseguiram lidar com essa situação e tenta conduzir sua vida da forma mais leve possível, não permitindo que tudo que ela passou atrapalhe sua vida ao ponto de não conseguir ser amada. O perdão veio, e por isso as coisas se tornaram mais leves. A vida não pode parar, e infelizmente, a dor sempre fará parte e estará presente, independentemente do quanto isso pode nos causar. Por isso, Valentina e Rebeca vai tentando

aproveitar cada momento feliz e não parar para pensar naqueilo que um dia lhe custaram a paz.

Seu ar misterioso tinha nome e endereço, e como muitos, ele esqueceu enquanto ela seguia indiferente ao amor e vivendo na solidão... sonhando em um dia superar os traumas e se tornar “normal” aos olhos da sociedade.No fim, elas começaram a

superar os abusos vividos, trabalharam suas mentes e tornou-se duas grandes mulheres, vivendo o que sempre sonhou:

o prazer de amar e ser amada.

Quebrando correntes.

vivendo contente!

Enquanto a vida vai

Vai se tornando divertida.

vai se tornando digna de ser vivida,

vai se tornando um mundo colorido,

demonstrando que nem tudo está perdido.

O ar de mistério se desfaz

E escravas do passado elas não serão jamais.

Isabel scriptor
Enviado por Isabel scriptor em 18/05/2024
Código do texto: T8066094
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