A atualidade do Contratualismo: como forma de estruturação do Estado.

Parte I - O contexto histórico e sua participação.

O contratualismo é uma corrente filosófica-politica, criada nos séculos XVII e XVIII, pelos autores Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jacques Rosseau, imersos em um contexto histórico de revoluções burguesas na Inglaterra e posteriormente na França, os autores, através de suas respectivas obras: Leviatã - 1651; Segundo Tratado sobre o governo - 1689; Do Contrato Social - 1762, buscaram devolver ou demonstrar á nação, uma forma de união para conviver em sociedade, demonstrando-lhes a necessidade de um Estado que lhes traga: a paz pela ordem, com o discurso em prol da conservação humana, como em Hobbes, cujo "A causa final, fim, ou desígnio dos homens ao introduzir a restrição á si mesmos, que os leva a viver em Estados, é a preocupação com sua própria conservação e a garantia de uma vida mais feliz." (p.136); a garantia e a preservação da obtenção de bens privados, pelo viés de seu trabalho (defendida nas Revoluções Burguesas), por Locke, que destina como "o objetivo principal da união em comunidades sociais e de sua submissão a governos é a preservação da propriedade" (p.69); e, posteriormente por Rousseau, com a busca da legitimação do Estado como preservador da liberdade e dos direitos dos homens (defendida na Revolução Francesa), cujo, busca: " encontrar uma forma de associação que defenda e proteja toda a força comum a pessoa e os bens de cada associado, e pela qual, cada um, unindo-se á todos, não obedeça senão a si mesmos". (p.30).

Os autores debruçaram-se na mesma questão central, a "do que impulsionou ou de onde surgiu a necessidade para que os homens, livres na natureza, sacrificassem esta liberdade para viverem em sociedades?". Através de suas respostas é que os filósofos proporcionaram aos revolucionários a justificativa de um Estado e de sua ordem sobre os indivíduos. Deste modo, em tempos de crise (como a atual), é que através dos discursos dos contratualistas, que mantém-se as colunas da estrutura do Estado, exacerbando ás necessidades humanas e destinando-as ao próprio, do qual age como mediador entre paixões e razões, através de Hobbes e Locke; e enquanto por Rousseau, tenta aparentar-se como preservador da liberdade e dos direitos. Embora, só aparenta e não siga á risca tais ideias.

As divergências, que surgem entre os contratualistas, pautam-se do questionamento perante á essência humana ou a de que como configura-se o estado de natureza entre estes. Para Hobbes e Locke, o estado de natureza não permite, aos homens, garantias: o primeiro, caracteriza os indivíduos como guiados impulsivamente por suas paixões, sendo-os naturalmente ambiciosos e competitivos, onde que " Assim, mesmo que haja uma distribuição equitativa, o homem não se contenta com a parte que lhe cabe" (p.103), criando-lhes então inimizades, por conta de seus interesses particulares e portanto, os destinando á um constante estado de guerra, de modo que: "se não houver um poder visível que os mantenha em atitude de respeito, forçando-os, por temor á punição, a cumprir seus pactos..."(p.136), sempre estarão sujeitos á tal condição; o segundo autor, acrescenta como risco permanente no estado de natureza, a perca da propriedade privada - cujo, caracteriza como a ação humana (o trabalho) sobre a natureza, que dá-lhe o direito de apropriar-se de um bem que antes era comum á todos. "Sempre que ele (homem) tira um objeto no estado em que a natureza o colocou e o deixou, mistura nisso o seu trabalho e a isso acrescenta algo que lhe pertence, por isso o tornando sua propriedade."(p.42).

Rousseau, mostra-se oposto aos dois filósofos, defendendo a volta á natureza, o autor caracteriza tal estado, como o detentor da liberdade humana, onde que o homem naturalmente convive em harmonia, para o filosofo: " O homem nasceu livre e em toda parte se encontra sob ferros" (p.19), deste modo, o autor propõe aos homens recobrarem suas liberdades, perdidas da natureza, através do Contrato Social. Perante á Hobbes, Rousseau, acusa-o de destinar " a espécie humana dividida em rebanhos de gado" sendo "cada um com seu chefe a guardá-la, a fim de devorá-la" (p.21). Em relação á Locke, diverge-se na questão da propriedade privada, de modo que para Rousseau, o Estado não destina-se á preservar a propriedade privada (do qual á acusa como causa da desigualdade entre os homens), mas sim a preservação de toda propriedade comum á todos.

Como efeitos, Hobbes e Locke, proporcionaram ideologicamente ás Revoluções Burguesas, a conquista de maior liberdade á burguesia, porém, mantendo o Estado como garantidor de sua preservação. E Rousseau, proporcionou á Revolução Francesa, a conquista de diretos aos homens, garantindo-lhes maior participação e potencialidade na vida social.

Parte II - Sua presença atual como artifícios do Estado.

Diante desses clássicos da politica e em meio a nossa crise social, questionamos: Como, atualmente, tais ideologias mantém os Estados necessários aos indivíduos? Ou como, através destas, o Estado justifica-se como necessário? Visto que, os Estados em meio a crise social, tem cada vez mais sido abalado estruturalmente, estando propícios á sua completa ruína.

Sendo o detentor do monopólio de violência (herança de Hobbes), o Estado busca manter os indivíduos coesos á ordem, através da punição e exacerbando suas formas de repressão, dizendo buscar garantir a tranquilidade civil. O Estado também age como legislador entre as relações humanas, propondo-lhes garantir o direito as propriedades privadas, que estes possuem (herança de Locke), os direitos humanos e a sua participação (herdados de Rousseau).

Tendo tais respostas, chegamos á uma nova questão: Se o Estado herdou estes mecanismos para sua conservação, por que suas estruturas encontram-se frágeis atualmente?

Decorre daí, a longa distancia entre teoria e pratica, além do que essas teorias, em si, formam uma maneira diferente de organização do Estado: deste modo, o Estado que Hobbes propõe como defensor da segurança humana, que age imperativamente sobre o individuo, negando-lhe os impulsos das paixões, assemelha-se ao modo conservador de interpretar a sociedade, cujo, busca através da punição á ordem social. Mas, observemos nossa realidade atual e vejamos, se mesmo com este monopólio centralizado e coercitivo da violência, instalou-se a tranquilidade civil... Deduzo que não, e as noticias e fatos, a tamanha crueldade compartilhada e explicitada cotidianamente, comprovam minha dedução; ou estamos ainda no estado de natureza hobbesiano, de modo que o Estado ainda não instalou-se vigorosamente, ou o principio de Hobbes estava equivocado, afinal esta coesão por meio da punição não tem nos surgido efeitos louváveis.

O Estado cujo propõe, Locke, nutre os ideais liberalistas e posteriormente neo-liberalistas (Ideologia dominante na ordem atual), a reverência prestada a propriedade privada está, como nas Revoluções Burguesas, privilegiando aos que já são proprietários. Portanto, tal ideologia mantém a desigualdade entre os homens e fazendo então, prevalecer a competitividade entre os indivíduos, o que Hobbes já alertava como uma das causas do Estado de Guerra.

A concepção de Rousseau, para o Estado, tornou-se pioneira para os ideais progressistas, esta concepção, pautada na busca pela legitimação de um Estado de direito, que garanta a liberdade perdida na natureza e a participação ativa do individuo nas decisões em comum, é apenas disfarçadamente utilizada, atualmente, e serve somente como aparência para amenizar a violência do Estado.

O que o Estado pós-moderno procura fazer é estruturar-se como um "Frankstein", agrupando de cada teoria as melhores justificativas para conservar-se como necessário sobre o individuo. Ele utiliza da violência para lhe garantir força, a legislação para lhe garantir o poder sobre as leis e a concepção vendida de detentor do direito á participação para lhe garantir a tranquilidade civil. Formando assim, uma estrutura com partes divididas, sendo umas interdependentes das outras, de modo que, se uma delas mostram-se frágil compromete-se todo o Estado.

Podemos confirmar que o Estado não consegue manter estas partes sólidas, em todas elas, não consegue inteiramente mantê-las firmes. Pois, como já foi constatado, vivenciamos que a utilização da punição como forma de ordenação para que a sociedade viva em harmonia , apenas têm, com isso, incitado a revolta e a violência entre os indivíduos. Embora que ainda, seja o monopólio da violência que mantenha o Estado erguido. Observamos também, que a concepção de garantia da propriedade privada, exerce-se como potencializador das desigualdades, o que torna em dividir a sociedade, e que deste modo, não faz da lei uma igualdade, já que as condições são desiguais; não podemos ser iguais perante as leis, se nossas condições forem desiguais. Para completar esta má formação do Estado, embalam-se estas partes na ideia fajuta de soberania do povo, slogando uma democracia inexistente e a falsa impressão de participação comum da vontade geral.

Conclusão

Este imenso Frankstein, o Estado, utiliza-se dos melhores discursos do contratualismo, para vender a aparência de necessário, mas na realidade, na sua essência, tem sido o maior inimigo dos homens, á ponto de os prenderem sem ao menos que percebam o quão presos estão. Como a alegoria da caverna Platônica!

Faltam-lhes portanto, um verdadeiro contrato que realmente seja justo e inteiramente implantado, como nos demonstra Rousseau, um contrato que os homens preservando-se á si mesmos e aos outros, preservam-se juntos, onde que a vontade geral seja verdadeiramente a soberana e que todos unindo-se á todos não obedeça á ninguém. É deste real modo, que concluo que o Estado verdadeiramente justo, possa tornar-se realmente solido e preservador da espécie humana. Porém, sendo ele, formado pela soberania da vontade geral (a vontade do povo), é somente á este que pode realmente implanta-lo. Para implanta-lo necessita-se do povo unido e harmoniosamente destinado a lutar em prol de sua preservação, união esta que neo-liberalismo atual busca dissuadir, se apropriando dos preceitos hobbesianos para qual diz ser natural do homem e que a cultura atual divulga copiosamente, para manter-nos desunidos e competitivos entre si, fazendo-os pensar que somente o Estado é o unificador entre os indivíduos.

Referências Bibliográficas:

- HOBBES, Thomas. Leviatã:ou matéria, forma e poder de um estado eclesiástico e civil.1651.Trad:Rosina D'Angina.2ªedição. São Paulo. Martin Claret.2012.

- LOCKE, John. Segundo tratado sobre o governo. 1689.Trad: Magda Lopes e Marisa Lobo da Costa.

- ROSSEAU, Jean-Jacques. Do Contrato Social.1762. Trad: Ricardo Marcelino Palo Rodrigues. 1ªedição. São Paulo. Hunterbooks. 2014.