Antes de querer ganhar o mundo, conheça o seu vizinho

Certa vez, aprendi com um amigo uma grande lição, provavelmente sem nem ele ter se dado conta. Jamais comentei com ele (por pura falta de oportunidade), mas agora, como vou tornar pública a história neste texto, provavelmente vai saber.

Há pouco mais de quinze anos, saíamos em turma aqui em Jaboticabal. A gente tomava nossa cervejinha em frente a conveniência na 13 de maio, jogava sinuca numa das várias mesas no segundo andar de um bar instalado em um prédio antigo na mesma rua ou entrava em algum boteco. Nos anos seguintes, frequentávamos um pub.

Lembro de umas fotos desta época. A turma com os copos em riste, firmes. As expressões e os olhares, ao contrário, quase nunca eram firmes. Claro, dependia do grau etílico no momento da pose para a foto, mas quase nunca. E meu amigo sorria sempre um sorriso discreto, sossegado e muito honesto. Eram horas legais da sexta ou sábado à noite que a gente curtia bastante.

Anos depois, o amigo mudou de cidade para fazer mestrado. Lá, com a nova turma dele, mais fotos de boteco e o mesmo sorriso. Em seguida, mudou de país: estágio e depois doutorado na Alemanha. Fotos em Berlim, Amsterdam e outras cidades / países vizinhas(os). O mesmo sorriso. A mesma alegria. O pensamento que construí observando estas similaridades foi: "não importa se você tem dez reais pra tomar uma no bar da esquina, se tem cem pra tomar um chope no Pinguim, mil reais pra bebericar em Copacabana ou dez mil para um happy hour em outro continente. O importante é saber apreciar o momento".

Era um tempo em que as fotos ainda eram reveladas e não "postadas" às centenas em redes sociais. Não padeciam do atual comportamento frenético de se tentar transmitir uma alegria exagerada e duvidosa. Tenho certeza que se meu amigo não tivesse cruzado o mundo e ainda morasse em Jaboticabal, a alegria de boteco - e os sorrisos - iam ser exatamente os mesmos.

Li certa vez um ditado. Não lembro de cabeça as palavras, nem seu autor, e o doutor Google não trouxe nenhuma luz em minhas buscas. Mas é algo como "ser feliz não é procurar incessantemente o que você deseja, mas aproveitar ao máximo o que você já tem ao seu redor".

Tem gente que já teve a capacidade de ir a Nova York, bater palmas para as supostas maravilhas da terra do tio Trump (ou Sam? Ou os dois?), e não conhece Brodowski. Sim, Brodowski, leitores. Conhecem? Recomendo! Por que citei Nova York e Brodowski? Eis a relação: a última é terra de Portinari, exala arte em vários quarteirões e cantinhos. Tem esculturas de Bassano Vaccarini próximas à rodoviária e diversos muros coloridos com belos desenhos. Portinari, o menino de Brodowski, tem trabalho exposto em Nova York, nada mais nada menos os painéis "Guerra e Paz" na sede da ONU. Não sabe do que se trata? Pesquise porque vale a pena! Vai por mim! Junto com a recomendação, deixo uma pergunta aqui pra gente pensar: quantos brasileiros que foram a Nova York - especialmente aqueles sorridentíssimos das selfies na Time Square - tiraram um tempinho para ir apreciar os grandiosos Guerra e Paz?

Vai investir (ou fi... nan... ci... arrrrr) uns dez ou vinte mil em viagem? Pra quê essa mania de ir prum lugar que botaram na sua cabeça que é "top" (odeio essa palavra, mas uso aqui para se alinhar ao clima de clichê turístico) se você pode usar esse valor para umas quatro ou cinco viagens e descobrir aqueles lugares incríveis que ninguém nunca vai?

Antes de querer ganhar o mundo, conheça seu vizinho. O vizinho de casa, o jardim vizinho, a cidade vizinha, o rio vizinho, o estado vizinho. Ou mesmo o país vizinho. Talvez você nunca tenha se dado conta mas, por experiência própria afirmo: a felicidade mora, sim, ao lado.

(Nota: o texto faz referência a localidades da região de Ribeirão Preto, interior de São Paulo)