O Escritor deve ser um Franco-Atirador

Um bom escritor deve ser algo como uma metralhadora giratória. Não disparando à toa, atirando apenas para atirar, mas no sentido de não se prender a nada para poder exercer livremente o seu direito (e dever) de disparar o seu verbo contra o que não julgar correto. É aquele velho “doa a quem doer”.

O que, logicamente, não é nada fácil. Há que se não ter o rabo preso nem com algo nem com ninguém. A liberdade total de expressão exige que paguemos um preço alto. O problema é que a maior parcela dos escritores de hoje em dia (e não só os escritores) não querem pagar preços, preferem receber pagamentos. Não necessariamente monetários, é claro. Vender-se é bem mais simples. E mais lucrativo. Obter-se favores com a delimitação do nosso verbo, também é uma moeda de troca. Pode-se até conseguir um sucessozinho, certa fama, até dinheiro.

Há desde os que se vendem para aparecer na mídia aos que se vendem a editoras. Há os que preferem não falar de certas coisas para evitar criar inimizades, ou para não prejudicar amigos, ou a si próprios, para não serem mal vistos, para não perderem determinados privilégios e benesses. Algumas vezes, é simplesmente porque não podem. Afinal, há que se sobreviver.

Porém também há um preço a se pagar ao não se ter a coragem de disparar a metralhadora. O preço é tornar-se exatamente um covarde e um medíocre. Nos casos mais graves, perde-se a honra e a dignidade. Torna-se um pau-mandado. Muitas vezes, o medíocre justifica-se a si mesmo, afirmando que tudo o que escreve é exatamente o queria escrever. E que está com sua consciência absolutamente tranquila. Mas, no fundo, ele sabe que não é bem assim.

Escrever é atirar. É óbvio que não é só isso. A literatura é uma das artes mais completas, se não for a mais completa, e possibilita uma gama infinita de expressões. No entanto, em nossos dias, é uma obrigação (mais do que um direito) do literato exercer todo o potencial de criticidade possibilitado pela literatura. Mas há que se ter muita coragem para fazê-lo, entre outras características mais, como uma funda e perspicaz visão do que acontece à sua volta. Para se atirar há que se não estar de acordo com a situação. A arte em si é, entre outras coisas, a reação a todas as situações.

Além do que, uma literatura sem “tiros”, torna-se, nos tempos atuais, insuportavelmente chata. O escritor deve ser um franco-atirador. Nunca curvado. Dobrar a espinha é o primeiro atestado de mediocridade. Talento sem coragem é como ter milho e não ter dentes. Para tanto, é mister a independência de quem escreve. Caso contrário, torna-se um touro capado. Que não é touro, é um boi. Sem força e sem moral.

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Alessandro Reiffer
Enviado por Alessandro Reiffer em 20/06/2012
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