A VIRTUALIDADE DILUÍDA

Entendo que a virtualidade é um meio de se achegar ao Outro, uma forma de doar um cumprimento, um beijo e/ou um abraço e obter retorno, porque tudo isto representa os desejos gregários da criatura humana: o vai-e-vem numa via de duas mãos. Um andarilhar em que o amor à criatura humana se faça presente com o lirismo de sempre, tolerando-se até a polêmica literária como antítese ao que se concebe ou no qual se atua com ótica e/ou forma ou formato diferenciado. Um redondo “zero” ao antagonismo tolo e inconsequente. Espera-se que através da codificação tecnológica chegue a boa nova – em privado – quando for confessional, intimista, sigilosa. Ou em aberto, para que cada um seja o embrião do ‘Nós’ ao alcance do ‘Outro’, interagindo como proposta e exercício de humanidade. Se assim for, a virtualidade se justifica como veículo neste milênio terceiro, em que se poderá pretender o espiritual num patamar mais digno e altissonante. Que andemos de mãos dadas e não mais nos percamos, pois juntos somos mais fortes, mais densos. Parece-me, em santa ignorância, que o humano ser começa a prestigiar aquilo que não é o “ver para crer”... E se imanta, enfim, daquilo que não é apenas matéria animada por míseros ponteiros em movimento, no restrito, costumeiro e mediano tempo de viver. Com o exercício dos recursos virtuais, é bem possível que se antecipe a certeza de que podemos exercitar a nem sempre serena lucidez do amar, vez em quando, aqui ou noutros territórios deste mundão de possibilidades, nos incomensuráveis domínios do Absoluto.

– Do livro A VERTENTE INSENSATA, 2017.

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