O desejo de ser de Deus

“Eu sou de Deus, eu sou da paz, sou sangue bom, eu também sou filho de Deus, não o dono do mundo, mas sou filho do dono”. Já ouvimos essas expressões muitas vezes ou outras parecidas com essas. Isso nos leva à conclusão sumária de que parece absurdo cogitar que alguém não deseje ser de Deus. Todavia, a questão não é tão simples assim como parece à primeira vista, conforme iremos demonstrar.

Ser de Deus implica inicialmente em uma vontade. É preciso querer. Até para ser de Deus é preciso querer. Existe um princípio de que não se deve dar a uma pessoa mais do que ela deseja. O dar implica em uma disposição contrária para receber. É uma relação bilateral, onde alguém dá e outro alguém recebe. Apenas a título de argumentação, já dizia São Francisco de Assis que “é dando que se recebe”. Da oração característica ensinada por Jesus podemos ler em:

Mateus 6:12 e perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado aos nossos devedores;

Perdoa-nos, como temos perdoado. As ações não são unilaterais. São atos de reciprocidade. Outro exemplo a respeito do condicionante, são as palavras de Pedro que lemos em:

Atos 3:19 Arrependei-vos, pois, e convertei-vos para serem cancelados os vossos pecados.

Os pecados podem ser cancelados por Deus, já que resultam de práticas contra ele, é dívida contra ele e somente ele pode cancelá-la e o apóstolo diz que a dívida pode ser cancelada, desde que, desde que o outro lado faça a sua parte, o seu ato de reciprocidade, o seu ato de vontade: arrepender e converter. É uma condição dupla para uma ação tão importante como o cancelamento dos pecados, faz-se necessário o arrependimento e a conversão. Nos dois casos implica uma decisão de vontade, um ato pessoal que ninguém pode fazer senão apenas o interessado.

A Bíblia está cheia de exemplos sobre essa bilateralidade, mas vamos limitar-nos apenas a mais um exemplo., retirado de:

João 1:12 Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, a saber, aos que crêem no seu nome;

A disposição de tornar qualquer pessoa um filho de Deus é um ato de liberalidade condicionada da parte de Deus. É evidente que o processo pelo qual alguém que não é filho se torna filho é o processo da adoção. E, segundo a palavra do apóstolo, a adoção somente será viabilizada se houver uma disposição do adotando para fazer a sua parte no processo. Faz-se necessário que ele receba a Jesus como Senhor. Veja-se no contexto, no versículo anterior que o Verbo – que se fez carne em Jesus e habitou entre nós, conforme, Mt 1:21 e Jo 1:14 –, veio para o que era seu, mas os seus não o receberam. Jesus, o Deus unigênito (Jo 1:18) que hoje está no seio do Pai veio para providenciar a salvação daqueles que eram de Deus, que pertenciam a Deus, mas aqueles não o receberam. Então ele abre a prerrogativa de salvação para todos os que o receberem. Aqui está a obrigação que cabe à parte contrária. De um lado, Deus abre o direito potencial para que as pessoas interessadas, quaisquer que sejam porque ele não faz acepção de pessoas, de acordo com:

Atos 10:34 Então, falou Pedro, dizendo: Reconheço, por verdade, que Deus não faz acepção de pessoas;

Romanos 2:11 Porque para com Deus não há acepção de pessoas.

Em segundo lugar, é preciso ter consciência do que significa ser de Deus. A ação verbal é claríssima. Ser de alguém implica em pertencer a esse alguém, ser sua propriedade. É um ato de renúncia à própria vontade. Assim, antes de receber o prêmio, é preciso dar. E não apenas alguma coisa, mas tudo o que tem. O “ser de Deus” implica em entregar o comando da própria vida a ele, acatando a sua soberana vontade, fazendo o que ele manda. Tornar discípulo de Jesus e, conseqüentemente, passar a pertencer a Deus traz implícita uma disposição de vontade para fazer o que Jesus manda. Ele próprio diz isso em:

Mateus 10:24 O discípulo não está acima do seu mestre, nem o servo, acima do seu senhor.

João 15:14 Vós sois meus amigos, se fazeis o que eu vos mando.

A esse respeito há um bom complemento em:

Isaías 10:15 Porventura, gloriar-se-á o machado contra o que corta com ele? Ou presumirá a serra contra o que a maneja? Seria isso como se a vara brandisse os que a levantam ou o bastão levantasse a quem não é pau!

Dessa forma, vê-se que para ser de Deus é preciso ter primeiro o desejo, um querer ser e em segundo uma disposição interior para fazer. Mas isso é natural quando se trata de alguém vocacionado para essa condição. Nem todo mundo nasceu para isso. Há muitos que nasceram para ser senhores, não para serem servos. Por isso Jesus diz que é difícil àqueles que têm o poder das riquezas entrar no reino dos céus.

Marcos 10:23 Então, Jesus, olhando ao redor, disse aos seus discípulos: Quão dificilmente entrarão no reino de Deus os que têm riquezas!

E ele explica que isso se deve ao fato de que tais pessoas pensam que podem ser o que quiserem.

Marcos 10:24 Os discípulos estranharam estas palavras; mas Jesus insistiu em dizer-lhes: Filhos, quão difícil é para os que confiam nas riquezas entrar no reino de Deus!

Um exemplo de quem fez as coisas certas pode ser encontrado em:

Lucas 15:18 Levantar-me-ei, e irei ter com o meu pai, e lhe direi: Pai, pequei contra o céu e diante de ti.

Há um artigo do missionário Martinus van Driel, publicado em “O Noticiário Evangélico” nº 2 de 2002, no qual ele expõe como há uma tendência em fazer as coisas de forma contrária à orientação da palavra de Deus. Diz ele que, às vezes se quer empurrar alguém para o arrependimento mais rápido, para que a pessoa que cometeu a transgressão possa voltar à comunhão. E ele mostra que não é esse o procedimento correto. É preciso que brote dentro da pessoa a vontade de voltar à comunhão. O arrependimento tem que brotar dentro do coração da pessoa. Não dá para ser induzido.

Assim, o objetivo dessa mensagem foi mostrar como fazer as coisas certas. É claro que desejamos a volta dos irmãos que estão separados da comunhão, mas nós não podemos induzi-los a essa volta. Nós não conhecemos o coração uns dos outros. Somente Deus conhece. Por isso Jesus diz em:

João 15:16 Não fostes vós que me escolhestes a mim; pelo contrário, eu vos escolhi a vós outros e vos designei para que vades e deis fruto, e o vosso fruto permaneça; a fim de que tudo quanto pedirdes ao Pai em meu nome, ele vo-lo conceda.

O que podemos fazer, nós temos feito e vamos continuar fazendo, ou seja, apresentar o reino de Deus e todas as vantagens que teremos se nos tornarmos voluntariamente, sem nenhum constrangimento, mas por desejo próprio, seus servos. Continuemos agindo com amor em relação àqueles a quem amamos, da mesma forma que Deus agiu em relação a nós, expressando o seu amor por cada um de nós.

João 3:16 Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna.

Que Deus nos abençoe!