Análise do Filme "Encantada"

1. SINOPSE:

Qual o resultado da mistura de Branca de Neve, Bela Adormecida, Cinderela, um pouco de Ariel, uma pitada de Bela e talvez deveria arriscar até um toque de King Kong? Jogue então essa mistura num mundo real e frio com uma dose cavalar de realidade.

No início do filme, tudo se remete a um conto de fadas convencional, onde se abre o livro encantado e se começa uma história de romance. A mocinha sonha com seu príncipe encantado e acredita que irá encontrá-lo. Quando se encontram, se apaixonam no mesmo instante, e ele propõe casamento para o dia seguinte. Ela aceita se casar com ele, mas a madrasta não aceitando a perda da coroa, resolve mandá-la para o mundo real. Ela é “jogada” em Nova York, e se sente totalmente perdida, com tantos sons, ruídos, vocabulário, sentimentos que dantes não conhecera, mas conhece uma família que a acolhe, e que a tratam muito bem, e o homem dono da casa se sente balançado pela doçura do olhar dela. O príncipe, desesperado, parte para o mundo real em busca de sua donzela, que também se sente perdido em meio à realidade. A madrasta dele, por sua vez, manda o mordomo ir atrás para ter plena certeza que ela não voltará para o mundo irreal em vida, e para isso mandou maçãs envenenadas para o mordomo induzi-la a comer. O mordomo não tão sagaz como a rainha não consegue induzi-la, o que fez subir a ira da rainha e ela mesma se transportar para a realidade. Ao chegar no mundo real ela consegue induzir a moça de morder a maçã, que já cai desacordada no chão. Um beijo do amor verdadeiro a faria voltar à vida, que quem deu foi Robert, o dono da casa. A madrasta tentando a destruir, vai para o alto de um prédio com Robert, e ela sobe atrás para salvar o amor da sua vida. Consegue detê-la a tempo, casa-se com ele e vivem felizes para sempre na realidade, enquanto o príncipe encantado Edward casa-se com a ex-namorada de Robert, Nancy, e vão para o mundo encantado viver feliz para sempre.

2. DA GISELLE

A protagonista acredita em todos seus sonhos, e que tudo é possível se acreditar. Suas atitudes são fantasiosas, pois ela conversa com os animais, os entende e eles a obedecem através de apenas um canto. Sua voz é doce, melodiosa, e seu tom de voz é sempre de felicidade. Seus sentimentos são sempre bons, pois ela é uma donzela, a parte boa da história, ela não conhece sentimentos torpes, que faz com que o coração deseje mal, ou apenas pense mal. Dá para se entender melhor esse tipo de sentimento quando ela vai conversar com um mendigo, achando que é um bom velhinho, e este rouba sua coroa. Ela fica perplexa com a situação, e no momento que tenta falar algo para ele, diz apenas: “Você não é um velhinho muito bom!” Isso é uma clara demonstração que ela não consegue enxergar maldade, tem a inocência de uma criança, e não conhece os sentimentos, nem o vocabulário voltado para este lado mal.

Giselle fala como se fosse cantando, e em todos os momentos ela encontra espaço para cantoria. Quando ela entra para o mundo real, literalmente tudo vira de cabeça para baixo. Ela se sente completamente perdida. E quando na cena parece que ela está nas estrelas, ela está no asfalto, brilhoso por refletir as luzes dos carros e da rua. Já neste momento notamos que o tipo de fala dela não condiz com a realidade. Não só o tom de voz e a forma como ela fala, mas também sua capacidade mental parece um pouco abalada, pois ela sai de um mundo perfeitinho, onde o mal é feio e amedrontador, e entra para um mundo onde nada é fantasioso do jeito que ela estava acostumada. Ela tem a vivencia e a ingenuidade de uma criança. Aos poucos ela vai contagiando todos que estão a sua volta com seu encantamento, pois a principio achavam que ela estava blefando, ou que tinha alguma deficiência, mas depois entendem que ela realmente não era real.

3. DO EDWARD

O príncipe encantado aparece bravio, corajoso, pois ele é o belo, o bom. Dentro do conto de fadas tudo se remete à filosofia, onde podemos dar exemplo de Platão, que dizia que o bom é belo, formoso, sensível, corajoso, entre outras e muitas qualidades, e o mal é feio, e guarda em si todos os defeitos possíveis.

Sua voz é normal para um conto de fadas, desde que não saísse dos desenhos, mas não é o caso de Encantada. Quando ele aparece nas ruas de Nova York falando daquela maneira, não parece nem um pouco encantado, mas sim um rapaz meio bobo querendo parecer esperto.

Edward tem tudo que um príncipe precisa ter para impressionar, e ser admirado. Mas quando ele entra na realidade, nada disso cabe, é como se tudo que ele tem de bom não fizesse sentido na realidade. Mas realmente não faz sentido pelo fato de que o perfeito não existe. Existe um biótipo de perfeição inserida no mundo da magia que não cabe na realidade. A perfeição não está presente nos dias contemporâneos, pois a bondade existe, mas ela independe da beleza, e da coragem. A beleza também existe, mas também não está acoplada a bondade e a sensibilidade emocional.

O que existe são qualidades presentes nas pessoas, mas não apenas, mas também defeitos. E o que mostra em Edward é que ele é perfeito, de tal maneira, que o seu discurso e a sua vivencia não cabe no mundo real. O perfeito não existe. Existe uma realidade complexa, que dentro dela existe tentativas de perfeição, mas não a perfeição propriamente dita.

4. DO MORDOMO NATHANIEL

O mordomo da rainha é típico. Por ser mordomo, ele tem todo um estereotipo, típico de filmes infantis. Ele tem voz mais fina, e fala mais compassado, de maneira que um homem comum não falaria.

Dentro do contexto histórico, denomina-se mordomo ou eunuco aquele que serve ao Rei, tem-se estabelecido nele uma confiança, de maneira que os bens, suas mulheres e suas filhas ficam sob responsabilidade do mordomo. Mas para tanto, é necessário que o mordomo seja emasculado, ou seja, que não seja mais viril. Há três tipos de eunucos: há eunucos que nasceram assim; e há eunucos que pelos homens foram feitos tais; e outros há que a si mesmos se fizeram eunucos. O primeiro tipo é do homem que já nasce com baixa virilidade, e não sente desejos sexuais. O segundo tipo é o eunuco que foi castrado, para perder a virilidade, e automaticamente os desejos já mencionados. O terceiro tipo de eunuco são aqueles que aceitam o celibato (mencionado biblicamente), por desejarem uma vida após esta.

Por esta razão, os eunucos têm um jeito peculiar. Uma voz mais mansa, um jeito mais especifico. Isto não significa que eles sejam homossexuais, mas são homens dignos de respeito e confiança. Mas por não serem homens sexualmente ativos, os eunucos tem um diferencial comportamental.

5. DA NARISSA

Ela é uma bela dama que ocupa o lugar de rainha.

Por ser uma rainha ela é bela, pois governa o povo e deve passar uma boa imagem. Além disso, ela é um personagem com mau caráter, mas que esconde atrás de uma bela fisionomia a maldade que impera no seu interior.

Bela e charmosa, a imperatriz governa seu trono com soberania. Mas quando ela resolve fazer algumas maldades, sua fisionomia se transforma completamente.

Podemos dizer que isso se remete à falsidade ideológica. Ela tenta mostrar uma coisa que não é, mas por ser omisso aos contos de fadas tradicionais, cada vez que ela vai fazer alguma coisa que não condiz com sua imagem, ela transforma sua fisionomia em grotesca e perturbadora. Isso tem por razão a caracterização da sua personalidade. Ela não pode mostrar-se uma boa mulher com a péssima fisionomia, pois a bondade vem acoplada a beleza, o belo é bom. E ela não pode também se mostrar uma pessoa má no corpo de uma bela mulher, pois a maldade está junto com a feiúra e degradação. Após o conhecimento da personalidade que ela possui no filme, ela consegue fazer maldades possuindo o próprio corpo, belo e formoso, mas com remissão a opressão.

Sua voz é firme, tom de imposição. Essa questão é histórica, pois na antiguidade os filhos dos nobres eram ensinados a retórica na Ágora, pois governariam um povo e deveriam saber falar adequadamente. Por essa razão o tom de voz dela é firme. Mas ao mesmo tempo é melancólico, pois é uma pessoa fria e solitária, é viúva e vive em função de despistar ao máximo seu enteado de um próspero casamento.

6. DO ROBERT

Robert é um advogado que trata especialmente de separação de casais. Por ter sido abandonado por sua mulher, desacredita da beleza dos sonhos, e ainda mais, da magia dos contos de fadas. Sua visão é de que nada é perfeito, e tudo pode conter margem de erro, por estar inserido na realidade, e compreender que na realidade podemos tentar ser perfeito, mas não atingiremos a perfeição.

Educa sua filha Morgan para a frieza da vida. Ao invés de incentivá-la a ler contos de fadas, a incentiva a ler livros de personalidades célebres, que conquistaram o que tem na vida com muito esforço e dedicação.

7. DO PEEP

Peep é um esquilo adorável, que tem por sua finalidade ajudar a protagonista. No mundo encantado ele é um animalzinho esperto que ajuda a futura princesa quando tem algum problema.

Na realidade ele é uma espécie de consciência da princesa, que através dele ela consegue entender a presença do mal nas pessoas que ela não imaginaria fazê-lo.

Podemos também considerá-lo como um amigo imaginário, que a princesa conversa e ouve, mas que na realidade não existe, porém ela consegue o ouvir e falar. No momento que ela acha que ele morreu, ela fica deprimida, pois sabe que não poderá mais o ver. Isso acontece com frequência nas crianças. Eles inventam amigos imaginários que sabem tudo do mundo, e os ajudam em muitos momentos. A partir do momento que ele pensa que o amigo sumiu, ele se entristece, mesmo tendo noção da realidade, de que este ser nunca existiu, mas na vida dele esteve presente.

8. DO FILME

Tudo se inicia com um desenho 2D, a princesa sonhando com seu príncipe encantado. Tudo em magia, e tudo que se deseja pode acontece, pois é tudo reflexo da perfeição que se deseja na realidade, mas não é alcançada. O cenário é humilde, onde tem sinônimo de pobreza, mas o ideal dela é morar no castelo, onde tudo é muito refinado. A musica faz parte da vida dos personagens da animação, pois ele a encontra através de uma musica, como se encontrasse a voz perfeita.

Quando ela vai para Nova York, seu mundo literalmente vira de cabeça para baixo, e ela chega em Nova York achando que é uma cidade longínqua de Andalásia, mas que há possibilidade de voltar. Mas então ela nota que é um lugar frio e sem magia, e é quando Robert diz a ela: Bem vinda à Nova York, e mesmo sabendo já que ali era o caos, ela ainda acredita na bondade das pessoas.

Mediante as pessoas do contexto real, ela não parece uma pessoa muito esperta, não por falta de capacidade, mas por querer encontrar o perfeito no caos.

Ela vai para a casa do Robert, e acha que os panos que ele usa para fazer cortina servem para ela se vestir, e embora ele não queira acreditar em contos mágicos, ele admira muito a postura dela, uma pessoa sorridente e bem humorada independente da situação que a cerca. Não sabe dizer não, apenas espera que tudo dê certo à medida que ela deseja. Na realidade as pessoas não conseguem mais acreditar na beleza do sentimento, e nem que ele possa transformar uma vida.

O fato do príncipe realmente ir atrás dela não significa que os desejos se materializam, mas que as forças maiores conspiram ao nosso favor para que as coisas fluam como deveriam. Os pensamentos negativos intervêm para que as belezas dos desejos não se concretizem, pois se há alguma possibilidade de você lutar pelo seu ideal, os pensamentos negativos não colaborarão para você enxergar. É exatamente isso que ela mostra para Robert, quando ela idealiza a chegada do príncipe, e ele realmente vem. Na nossa realidade não é tudo tão material, mas o lúdico nos mostra um seguimento de pensamentos.

Quando Robert a beija, ele nota que o amor é de uma força suprema, que não foi apenas um simples toque de lábios, mas uma razão para a vida. No nosso contexto social, podemos dizer que o amor pode salvar uma vida, não de maneira lúdica como mostra o filme, mas subliminar, é amando que se aprende a amar, e é sendo amado que notamos as coisas belas da vida.

Quando a Narissa se transforma em dragão e o leva para o alto de um prédio, o filme nos mostra de maneira lúdica o que a força da inveja pode causar. O impacto visual é muito grande, mas a mensagem é de que o sentimento de ódio e inveja pode muitas vezes estragar uma vida, ou muitas vidas, e tentar arruinar uma família, e a força que ela usa para fazer tal coisa não é física como no filme, mas cognitiva e afetiva.

E por fim, o embate entre o bem e o mal é vencido, provando que a força do bem sempre prevalecerá contra o mal. E embora ela esteve esperando por um príncipe encantado, o amor verdadeiro dela estava ao seu lado. Isso significa que nem sempre cobiçar o majestoso é a nossa felicidade, mas sim onde nos sentimos bem e acolhidos.