Erros que se repetem. Aonde vai a esquerda brasileira?

Nessas eleições de 2012, a História se repete como tragédia ou como farsa? O PT segue firme no rumo da adaptação e Adilson Pires será o vice na chapa de Eduardo Paes. O mesmo Paes que até ontem era do PSDB, tão combatido pelos petistas. A aliança de partidos de um trajetória de esquerda com o PMDB do Rio é absolutamente imoral! O governador Sérgio Cabral Filho é um político fascista que fez prisões políticas no ato contra Obama, na manifestação dos bombeiros e na greve de bombeiros e policiais e reprimiu todas as greves e manifestações dos profissionais de educação com violência desmedida. Eduardo Paes promove as remoções de famílias pobres para as obras da Copa do Mundo e das Olimpíadas e praticamente acabou com bairros inteiros, como o Campinho, bairro de Jacarepaguá, próximo de Madureira, Oswaldo Cruz e Vila Valqueire. O lugar onde eu cresci e falo desse caso de maneira absolutamente pessoal, assim como é pessoal para mim denunciar as prisões políticas, tendo sido um desses presos, assim como minha esposa, no ato contra Obama. Em política, quando entra a repressão e a moral, se você tem sangue nas veias, sempre é pessoal!

O contraponto à falência da esquerda no poder seria a Frente de Esquerda, que, com todos os problemas, conseguiu dar o seu recado nas eleições de 2006, apresentando uma alternativa política para a juventude e para a classe trabalhadora. Mas de lá pra cá, esse projeto desandou. Em 2010, a oposição de esquerda saiu toda fragmentada, com candidaturas próprias do PSOL, do PSTU, do PCB e do PCO. Resultado: nenhuma dessas candidaturas conseguiu sequer arranhar a burguesia. Incomodou. Mas só. Agora, estamos numa encruzilhada: existem duas candidaturas em especial que podem virar o jogo a favor dos trabalhadores e são elas a candidatura de Marcelo Freixo, do PSOL, no Rio de Janeiro e a candidatura de Amanda Gurgel, do PSTU, em Natal. Mas isso não pode ser realizado somente com as figuras. É preciso que exista um amplo movimento de base, um movimento de movimentos, uma frente de partidos e de sua militância, um movimento real que dê consistência às candidaturas e um programa que reflita não as vontades, desejos e opiniões dos candidatos, mas as reivindicações dos próprios movimentos sociais a partir de suas vozes, construído em Conferências Eleitorais Democráticas que votem as chapas e seus programas. Isso parece óbvio para uma candidatura de esquerda e dos movimentos sociais. Mas não é o que se tem visto. As movimentações de Freixo em busca de um vice, indo primeiro atrás do PV, depois de Romário, depois do PCB, mudando imediatamente para Marcelo Yuka, artista crítico e progressista, também do PSOL demonstram falta de método e personalismo na construção da chapa. E tudo isso sendo informado pelos meios de comunicação burgueses.

Diante disso, ao que parece, o PSTU irá lançar Cyro Garcia para prefeito do Rio de Janeiro. Eu militei neste partido por 7 anos e, sem dúvida, iria me sentir totalmente desrespeitado pela recusa do principal nome da oposição de esquerda no Rio hoje em procurar o partido que dirige a principal central sindical de oposição que é a CSP-CONLUTAS. Num momento em que uma deputada do próprio PSOL, Janira Rocha, é atacada pela burguesia fluminense e pelo governador Cabral, através de Cidinha Campos, sendo ameaçada de ser cassada como parlamentar por defender a mobilização dos bombeiros e policiais e ajudar na sua organização, algo absolutamente legítimo, sendo a atual maioria da ALERJ hoje, a tropa de choque do Cabral, pior do que o ARENA, que, na época da ditadura militar, teve muitos deputados que se recusaram a cassar o mandato de Marcio Moreira Alves, tendo o governo militar de lançar mão do AI-5 para fazê-lo; sendo esta mesma deputada membro licenciada da Executiva Nacional da CSP-CONLUTAS; e estando tanto o PSTU quanto a CSP-CONLUTAS a defendê-la, deveria ser considerada questão de honra dentro do PSOL a Frente de Esquerda no Rio, ainda mais no enfrentamento de um governo fascista como o de Cabral-Paes. Apesar disso tudo, será um erro enorme se o PSTU lançar candidatura própria. Ficará totalmente isolado da vanguarda na campanha e só enfraquecerá uma candidatura que pode realmente tirar votos de Paes e levar essa eleição para o segundo turno. Uma coisa deve ficar clara realmente: Marcelo Freixo quer ou não quer aliança com o PSTU? Deve dizer publicamente SIM ou NÃO. Declarações vagas como aliança "não com os partidos, mas com a sociedade civil" não são aceitáveis em política, ainda mais num país como o Brasil, em que a política (eleitoral, pelo menos) é feita através de partidos. Não estamos nos Estados Unidos, onde indivíduos podem ser candidatos. ONG´s não podem lançar candidatos, nem nenhuma organização da sociedade civil, movimento social, o que seja, somente partidos políticos, e o referido candidato faz parte de um.

Assim, não posso deixar de expressar o meu descontentamento. Devo dizer, antes de continuar, que pretendo votar em Marcelo Freixo, em primeiro lugar, por uma questão de responsabilidade política. Freixo não tem chance de vencer essa eleição e nem de ir para o segundo turno. Os seus votos serão concentrados na Zona Sul e em setores mais politizados e esclarecidos do funcionalismo público, do meio acadêmico, do meio artístico e dos movimentos sociais. Ouso dizer que muitos petistas votarão em Freixo. O voto é secreto e o PT pode esperar que a sua base não vai deixar barato essa traição que é a aliança com um político direitista, cria do César Maia, como Eduardo Paes. Um sujeito que nomeia Cláudia Costin, que ficou na memória do funcionalismo publico federal como aquela que implementou o projeto de privatização do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, como secretária municipal de educação. Com isso, Freixo deve alcançar entre 3% e 7% talvez, mas dificilmente chegará a 10% dos votos. Paes terá uma campanha milionária, bancada por todo o empresariado envolvido nos negócios da Copa e das Olimpíadas, além de ser o candidato da Rede Globo. Rodrigo Maia e Clarissa Garotinho terão tempo de televisão e os votos da Zona Norte e da Zona Oeste, além dos votos dos evangélicos, graças à influência de Garotinho, e de parcela significativa dos servidores públicos municipais, graças ao ex-prefeito César Maia. Rodrigo Maia deve ir para o segundo turno com Eduardo Paes. Mas uma votação expressiva em Freixo será fundamental para que as eleições sejam decididas no segundo turno e no caso bastante provável de reeleição de Paes, que ele assuma mais enfraquecido e, portanto, com menos capacidade de aplicar projetos como a reforma da previdência municipal - o PLC41 - que tramita na Câmara dos Vereadores.

Em segundo lugar, tenho uma dívida pessoal com Freixo por ter prestado auxílio num momento difícil como o da nossa prisão, garantindo, e eu vi quando ele o fez, que ficássemos numa cela separada em Água Santa, naquela situação de total arbitrariedade. Pessoalmente, encontro-me em situação bastante difícil, pois tenho bastante respeito e admiração por Cyro Garcia, acordo programático, e também total gratidão por ter sido incansável em nossa campanha, em especial para a nossa libertação. Por isso mesmo, sinto-me na obrigação de lembrar o que nos levou a isso: a eleição de Cabral no primeiro turno deu-lhe força total para atacar violentamente os pobres e os movimentos sociais. Ainda em 2010, ocupou militarmente o Complexo do Alemão. Em março do ano seguinte, efetuavam-se as prisões, sob suas ordens, que fique claro, com a presença da chefe da Polícia Civil, Marta Rocha, na delegacia, quando da decretação da prisão arbitrária e ilegal dos manifestantes do ato contra Obama. Nos jornais na segunda-feira, dia 20 de março, saía a notícia de que o esquema de segurança empregado era um teste para a Copa do Mundo de 2014. Não podemos permitir que isso se repita. A repressão no último ato contra o PL1005, que desviava recursos da Saúde e da Educação para o pagamento das aposentadorias dos servidores, foi um aviso. O governo Paes em nada fica atrás do governo Cabral. O movimento deve se preparar para se enfrentar com o Choque de Ordem também nos protestos. Os camelôs e as famílias removidas já conhecem o fascismo de Eduardo Paes. Está na hora de barrar esse projeto autoritário, elitista e higienista.

César Maia pode ser um direitista, mas é um bom estrategista. Será candidato a vereador e elegerá uma bancada expressiva do DEM. A oposição de direita crescerá consideravelmente na Câmara e poderá emperrar os projetos do Executivo. É possível que tenhamos uma Câmara com maioria de oposição na próxima gestão. A direita já fez a parte dela. Se o SEPE-RJ e outros sindicatos e associações dos servidores públicos municipais denunciarem sistematicamente os vereadores que votaram a favor do PL 1005 no ano passado e os partidos da oposição de esquerda lançarem candidatos fortes, de peso, para as eleições para vereador, a vitória de Paes poderá ter um gosto amargo, uma vitória de Pirro! O meu raciocínio obedece a lógica, o cálculo político e a necessidade da classe trabalhadora e não o meu fígado, tampouco vaidades e pretensões de ascensão numa carreira política. Todo militante de esquerda deve combater a ideia de carreira política e defender a ideia de luta política, representação política e coerência política. O PSOL no Rio deve ser maior do que em qualquer outro estado. Pelos meus cálculos, tem 7 parlamentares: Chico Alencar e Jean Wyllis como deputados federais, Marcelo Freixo e Janira Rocha como deputados estaduais e Renatinho, Paulo Pinheiro e Eliomar Coelho como vereadores, os dois últimos do Rio e o primeiro de Niterói. Isso, sem dúvida, é capaz de cegar qualquer um. Mas se deve levar em conta o peso que o PSTU tem no movimento social, na direção de sindicatos e entidades estudantis, na CSP-CONLUTAS e na ANEL, isto é, muito superior ao do PSOL. Então, por que não combinar o peso político e eleitoral do PSOL com o peso do PSTU nos movimentos sociais? Por que não somar forças no campo da oposição de esquerda? Essa pergunta precisa ser respondida por todos os candidatos de esquerda e não se enganem, serão questionados por isso ao longo de suas campanhas. Onde está o PCB nessa história? Não me lembro de ter visto suas assinaturas no manifesto divulgado no ano passado com assinaturas de militantes do PSOL e do PSTU. E é um partido que tem grande importância política e precisa interferir nesse debate. Quanto ao PSTU, é preciso que declare publicamente o seu apoio à candidatura de Marcelo Freixo. Tem grande responsabilidade nesse processo. Poderá, com isso, lançar Cyro Garcia candidato a vereador e fazer de sua campanha uma campanha para prefeito, como César Maia fará com a dele. Poderá ainda concentrar forças, girar militantes e nacionalizar a campanha de Amanda Gurgel, a campanha da educação, dos 10% do PIB para a educação e de apoio às greves e paralisações dos profissionais de educação em todo o país. Este é o desafio que está colocado.

Quanto a mim, por uma questão de coerência e de responsabilidade, devo dizer que votarei em Freixo para prefeito. Para vereador, votarei no candidato do PSTU e farei campanha. Votarei em Freixo já sem muito entusiasmo, infelizmente. Apostar numa campanha midiática e que rompe com qualquer tradição das candidaturas dos movimentos sociais (basta ver o exemplo de Chico Alencar em 2008, que teve Vera Nepomuceno, militante do PSTU e coordenadora-geral do SEPE-RJ como sua vice, e o amplo apoio dos movimentos e de todos os partidos da Frente de Esquerda - PSOL, PSTU, PCB), é um retrocesso político, ideológico e programático e que reflete um desespero diante de uma realidade que não tem a menor possibilidade real de se concretizar, que é a eleição de Freixo ou sua ida para o segundo turno, sendo quase certa a sua posição como terceiro colocado. É lamentável que não se enxergue que uma candidatura que é infinitamente menor em sua dimensão política e histórica e de sua inserção na classe e mesmo na classe média do que foi a candidatura de Heloísa Helena, que foi conduzida pela Frente de Esquerda e que teve até um Manifesto Programático, não tem a menor chance no cenário atual e que melhor do que fazer votos, nesse contexto, é fazer política. É importante lembrar, no entanto, que também naquele caso, o PSOL bancou o candidato a vice, que foi César Benjamin, que depois saiu atacando o próprio PSOL. E mesmo assim, o PSTU participou da Frente de Esquerda. É preciso que se tenha a mesma disposição política e toda serenidade nesse momento. Não é hora de marcar posição. O momento é de travar a luta consequente e sem trégua contra o verdadeiro inimigo que é o candidato dos governos e das grandes empresas - Eduardo Paes. Não tenho nada contra Marcelo Yuka. Pelo contrário. É um dos poucos artistas do Brasil hoje que tem um compromisso social, político e ético com os explorados e com os oprimidos. Mas política não se faz da maneira como vem sendo feita. Não se pode fazer um discurso despolitizado anti-partido, comparando as alianças que se dão no marco da direita, nas negociatas e conchavos, como os que fizeram César Maia e Garotinho, com a aliança entre os partidos de esquerda. O primeiro serve para derrotar a classe trabalhadora. O segundo serve para potencializar a força da classe trabalhadora e sua capacidade de resistência. De qualquer modo, já estou cansado dessa disputa política que mais parece briga de torcida. O meu voto é esse que declarei. Em 2014, não sei em quem votarei. Mas uma coisa é certa: se a esquerda não se acertar até lá, em 2016, meu voto é nulo! Não deserto da luta e existe ainda um processo em curso, mas a continuidade e aprofundamento desta dinâmica só consolidará a fragmentação da esquerda e dos movimentos sindical e estudantil e a dispersão das lutas, fazendo com que as energias se dispersem em cada processo específico, sem convergir para um centro político capaz de irradiar a força acumulada em cada batalha. Com o AI-5 da Copa, a proibição de greves durante a Copa do Mundo, medida que deixará sequelas na democracia brasileira, se ainda restar algo que possa ser chamado de democracia, a oportunidade histórica, aberta com a eleição de Lula em 2002, terá se perdido de vez, completando o processo de fascistização do Estado Brasileiro. Somente os tolos lutam sem estratégia e sem armas. A coragem também pode ser uma arma, mas é uma lâmina sem corte sem a inteligência, e a inteligência é um potencial sem valor sem a oportunidade. Estamos perdendo a oportunidade, destruindo nossas armas e ignorando qualquer estratégia, qualquer estratégia séria, pelo menos. Apoiar tal atitude chega a ser irresponsável. Espero estar equivocado e que o futuro seja promissor, mas seguirei minha razão e meus instintos e votarei na Frente de Esquerda nas próximas eleições, saindo ela ou não!

Rafael Rossi