A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS E SUA RELAÇÃO COM O MUNDO DO TRABALHO

A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS E SUA RELAÇÃO COM O MUNDO DO TRABALHO

Cláudia Cristina S. Bastos1

RESUMO

Diante de um mundo globalizado, onde o avanço tecnológico e das políticas educacionais vem se aperfeiçoando e tomando espaço na sociedade, urge a necessidade de debater e refletir sobre o processo avaliativo que é utilizado nas escolas públicas na atualidade. Baseado nesse entendimento pretende-se com este trabalho fazer uma análise reflexiva das práticas avaliativas que os educandos da Educação de Jovens e Adultos são submetidos e a relação dessas práticas avaliativas com o mundo do trabalho. Será analisada também a valorização que se dá às experiências trazidas pelos educandos da Eja e quais as contribuições que as avaliações aplicadas nessa modalidade oferecem a esses educandos trabalhadores. Espera-se que a partir dessas reflexões, atitudes transformadoras e emancipadoras que possibilitem a inserção dos educandos da Eja no mundo do trabalho, venham fazer parte da grande trajetória que se tem pela frente até que se possa galgar uma efetiva avaliação que oportunize novos saberes.

Palavras-Chave: Avaliação, Educação de Jovens e Adultos, Mundo do Trabalho.

A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS E SUA RELAÇÃO COM O MUNDO DO TRABALHO

INTRODUÇÃO

A priori, necessário salientar que o nosso sistema educacional por muitas vezes fere o que determina a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional-LDB, 9.394/96, principalmente no que se refere a avaliação. Lei esta, que determina de forma clara e precisa que a avaliação seja contínua e cumulativa e que os aspectos qualitativos sobreponham os quantitativos. Destarte, o sistema avaliativo contemplaria todos os aspectos significativos para a aprendizagem. No entanto, o que temos implantado no sistema educacional é uma avaliação pautada em mera mensuração, onde os educandos são medidos de forma que não possibilita o seu crescimento no que tange a aprendizagem. Avaliação esta que tem-se uma conotação punitiva, utilizada até mesmo como acertos de contas por alguns educadores e que de forma excludente, diminui as chances desses educandos inserir-se na sociedade e exercer sua plena cidadania.

Como cita Freitas (1995):

A avaliação não se restringe a instrumentos de medição, mas acaba sendo configurada como instrumento de controle disciplinar, de aferição de atitudes e valores dos alunos (1995, p.63)

Para Vasconcelos (1998):

A Avaliação deve ser um processo abrangente da existência humana, que implica uma reflexão crítica sobre a prática no sentido de captar seus avanços e possibilitar uma tomada de decisões, acompanhando a pessoa em seu processo de crescimento (p.43)

Para Luckesi (1996, p.165) “Avaliar significa identificar impasses e buscar soluções”. Mas será que se tem tentado buscar soluções para os impasses que se apresentam no processo avaliativo? A avaliação realmente serve de subsídio para diagnosticar a situação da aprendizagem do educando e possibilitar a busca de novos saberes de forma significativa? E o processo ensino-aprendizagem dos educandos da Eja é diferenciado das demais modalidades, haja vista as necessidades e experiências dessa classe são outras? Partindo dessas reflexões,

mister se faz entender quais os objetivos que os educandos da Eja buscam almejar no ensino para jovens e adultos, tendo em vista suas experiências do cotidiano e necessidades básicas. A própria LDB, no seu artigo 1º, parágrafo 2º estabelece: “A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social”. No entanto, as teorias e as determinações em leis geralmente ficam somente nos discursos, pois a prática fica bem distante. Tendo como base epistemológica o currículo na educação de jovens e adultos e sua relação com o mundo do trabalho faz-se relevante um estudo sobre como ocorre a avaliação da aprendizagem na Eja e como essa avaliação pode ou não possibilitar a inserção desses educandos no mundo do trabalho.

A AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS E SUA RELAÇÃO COM O MUNDO DO TRABALHO

Atualmente tem-se discutido muito sobre a avaliação da aprendizagem, principalmente na educação de jovens e adultos. Tal discussão vem possibilitando a reflexão sobre a importância de se repensar as práticas avaliativas que decorrem na Eja.

Faz-se mister entender qual o perfil dos educandos da Eja. Para Oliveira (1999, p. 59),

O adulto no âmbito da educação de jovens e adultos, não é o estudante universitário, o profissional qualificado que frequenta cursos de formação continuada ou de especialização, ou pessoa adulta interessada em aperfeiçoar seus conhecimentos em áreas como artes, língua estrangeira ou música, por exemplo. Ele geralmente o migrante que chega às grandes metrópoles provenientes de áreas rurais empobrecidas, filho de trabalhadores rurais não qualificados e com baixo nível de intuito escolar (muito frequentemente analfabetos) ele próprio com uma passagem curta e não sistemática pela escola e trabalhando em ocupações urbanas não qualificadas, após experiências no trabalho rural na infância e na adolescência, que busca a escola tardiamente para alfabetizar-se ou cursar algumas séries...

Compõe também a classe da Eja, jovens educandos multirepetentes, oriundos das turmas regulares ou aceleradas do diurno, que devido à distorção série-idade, são transferidos para a Eja no noturno, ou jovens que precocemente assumem o mercado de trabalho para ajudar no sustento da família. Com um perfil tão diversificado composto por uma parcela da população que de certa forma foi excluída da escola, urge o aprimoramento do fazer pedagógico numa perspectiva inclusiva e emancipadora.

Pautado nesse contexto educacional, a Eja requer a construção de novas diretrizes e práticas pedagógicas que atendam a especificidade desta modalidade. Para isso é necessário uma metodologia própria, um currículo específico que contemple as necessidades dos educandos da Eja, um projeto político pedagógico voltado para a demanda dessa população, formação adequada dos educadores e uma avaliação que possibilite a inserção desses educandos no mundo do trabalho.

Segundo Hoffman (2000, p. 72),

[...] a ação avaliativa deve partir do fazer do aluno, essa ação intenciona principalmente, a compreensão dos fenômenos e dos objetos. Cabe observar se o professor está atento a provocação necessária ao processo de compreender. Mais especificamente, uma ação avaliativa mediadora envolveria um complexo de processos educativos (que se desenvolveriam a partir da análise das hipóteses formuladas pelo educando, de suas ações e manifestações) visando essencialmente o entendimento. Tais processos mediadores objetivariam encorajar e orientar os alunos à produção de um saber qualitativamente superior, pelo aprofundamento às questões propostas pela oportunidade de novas vivências, leituras ou quaisquer procedimentos enriquecedores ao tema em estudo.

Na Eja, os conhecimentos dos educandos são diversos e originados das experiências de vida. Esses conhecimentos devem ajudar na compreensão do mundo e possibilitar ao educando intervir nele, transformando de forma significativa a sociedade. Destarte, ao planejar uma avaliação da aprendizagem especificamente para o educando da Eja, o educador deve ter a sensibilidade para compreender como esse educando entende a leitura do mundo.

A avaliação na Eja deve possibilitar a inclusão e emancipação dos educandos, garantindo assim a edificação do conhecimento e a valorização dos seus interesses e potencialidades. Essa avaliação deve ampliar perspectivas, favorecer a investigação, a problematização e apontar a necessidade de ressignificação da avaliação.

No nosso sistema educacional, a avaliação muitas vezes é utilizada como punição ou para medir o educando sob o ponto de vista do professor, num determinado momento, com certa avaliação específica. A avaliação diagnóstica não tem relevância e os educandos são avaliados sem levar em consideração a sua realidade, as suas experiências e demandas. Ainda hoje, a avaliação é considerada um “bicho papão”, sob a égide do medo, alicerçada na lógica da mensuração. Os educandos com melhores notas são geralmente supervalorizados e aqueles que não alcançam tal resultado são rotulados, desvalorizados, digo até desrespeitado. Na concepção de Luckesi as provas são instrumentos de classificação e seleção que não dão garantia do aprendizado nem possibilita o acesso ao sistema de ensino.

Pierro (2001, p. 263) ressalta que:

Superar a concepção compensatória de educação de pessoas adultas não implica, porém, negar que há desigualdades educativas a serem enfrentadas. [...] Isso não significa que a educação básica de jovens e adultos deva reproduzir as formas de organização, currículos, métodos e materiais da educação básica infanto-juvenil. Muito ao contrário, a experiência internacional recomenda flexibilizar currículos, meios e formas

de atendimento, integrando as dimensões de educação geral e profissional, reconhecendo processos de aprendizagem informais e formais, combinando meios de ensino presenciais e a distância, de modo a que os indivíduos possam obter novas aprendizagens e a certificação correspondente mediante diferentes trajetórias formativas.

Nesse diapasão, reforça-se a necessidade de utilizar práticas de aprendizagem que oportunizem aos educandos uma educação voltada à formação de sujeitos sociais que efetivamente participem do exercício e usufruto do mundo do trabalho. Compartilhando com o pensamento de Paulo Freire, é de suma relevância favorecer a autonomia dos educandos, estimulando-os a avaliar seus progressos e limitações e auxiliando-os na conscientização de como se realiza a aprendizagem, independente de suas dificuldades. A avaliação em si deve ter um significado na vida. Além de proporcionar conhecimentos deve correlacionar fatos, (re)descobrir valores, estimular o educando a inserir-se na sociedade e manter-se em harmonia com ela. Para tanto, os instrumentos avaliativos devem ser eficazes e eficientes, de modo que permita a verificação do desempenho, o avanço qualitativo na aprendizagem dos educandos, levando em conta as experiências das suas vidas, contextualizando com o seu cotidiano e suas necessidades básicas para a inserção no mundo do trabalho.

Para Moretto (2005, p. 100):

[...] a avaliação é eficaz quando o objetivo proposto pelo professor foi alcançado. [...] A eficiência está relacionada ao objetivo e ao processo desenvolvido para alcançá-lo. Diremos que a avaliação é eficiente quando o objetivo proposto é relevante e o processo para alcançá-lo é racional, econômico e útil. Portanto, para que a avaliação seja eficiente, é preciso que seja também eficaz.

Temos o parecer descritivo que vem despontando como novidade na forma de comunicar resultados de desempenho dos educandos. Melchior nos traz concepções sobre a avaliação por parecer descritivo. Porém, não adianta mudar a forma de avaliar se não mudar a intencionalidade. O educando tanto pode ser prejudicado com uma nota inferior quanto por um parecer cheio de preconceitos.

Segundo Vasconcellos (200, p.58-59, grifo do autor):

A avaliação deve ser contínua para que possa cumprir sua função de auxílio ao processo de ensino-aprendizagem. A avaliação que importa é aquela que é feita no processo, quando o professor pode estar acompanhando a

construção do conhecimento pelo educando; avaliar na hora que precisa ser avaliado, para ajudar o aluno a construir o seu conhecimento, verificando os vários estágios do desenvolvimento dos alunos e não julgando-os apenas num determinado momento. Avaliar o processo e não apenas o produto, ou melhor, avaliar o produto no processo.

O ato de avaliar é muito mais abrangente do que a simples atribuição de notas. Todo instrumento utilizado na avaliação envolve quantificação, contudo, não deveria restringir-se só a isso, precisa seriamente ser qualificada através de análises do educador para que se possa alcançar uma avaliação focada na construção de competências e habilidades. Deve-se dar importância a avaliação dos saberes, dos fatos, das atitudes, dos conceitos, dos procedimentos, enfim, considerar todos os aspectos que tornem a avaliação um instrumento imprescindível na construção de novos saberes.

Imprescindível trazer à baila a formação dos educadores da Eja. Formação esta que não contempla a educação de jovens e adultos e para agravar a situação, esta modalidade é utilizada muitas vezes para complemento de carga horária ou simplesmente um “bico”. É inadmissível que ainda tenhamos na Eja educadores sem formação específica para atender esta modalidade e que trata esse público da mesma forma que lida com os educandos das demais modalidades. Sem requisitos básicos necessários e fundamentais para o ensino-aprendizagem na Eja, como ter então uma avaliação que garanta uma aprendizagem efetiva e significativa que venha possibilitar a inserção desses educandos no mundo do trabalho?

Ressalto mais uma vez a urgência de um sistema avaliativo que sirva de subsídio na construção do conhecimento. Deve-se prestigiar uma concepção de avaliação que privilegia a aprendizagem acima de tudo. Os instrumentos utilizados nesse processo devem ser planejados com o propósito de subsidiar a análise que o educador faz acerca da aprendizagem dos educandos. Esses instrumentos avaliativos devem levar em consideração a linguagem utilizada, a contextualização, o conteúdo e sua significação, a coerência com o ensino, a capacidade de leitura, escrita e raciocínio. Tudo isso só terá realmente validade se o educando conseguir compreender a essência da aprendizagem, que é o seu significado na vida.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

É de suma relevância aproximar o dia-a-dia da escola do mundo do trabalho, contribuindo nesse processo sem deixar de lado as características iniciais da escola nem tão pouco perder de foco sua real missão. Características essenciais no mundo do trabalho devem ser incorporadas no cotidiano dos educandos em suas atividades escolares. Para tanto é indispensável uma avaliação que auxilie na construção do conhecimento, que privilegie a aprendizagem e que permita que o princípio ético norteie a prática avaliativa do educador. Os instrumentos avaliativos só têm a finalidade de acompanhar a aprendizagem e servir como eixo gerador de novos conhecimentos, possibilitando o desenvolvimento de competências e habilidades dos educandos e propiciando assim a transformação da prática avaliativa em prática de aprendizagem. É preciso redimensionar o processo ensino-aprendizagem de modo que contemple a valorização das experiências cotidianas e possibilite o liame entre escola, mundo do trabalho e práticas sociais. Contudo não poderia deixar de concluir com o texto do Estatuto do Idoso, no seu art. 21 que diz: “O Poder Público criará oportunidades de acesso do idoso à educação, adequando currículos, metodologias e material didático aos programas educacionais a ele destinados.” E o mesmo Estatuto nos traz sobre a participação dos idosos na transmissão de seus conhecimentos e vivências às demais gerações. Nesse aspecto volto a reforçar a necessidade de se valorizar as experiências dos educandos desta modalidade de ensino, equilibrando com a nova clientela da Eja noturno, os adolescentes, que por sua vez também são assegurados no art. 54 do Estatuto da Criança e do Adolescente, inciso VI, que trata da oferta de ensino noturno adequado às condições do adolescente trabalhador. Ciente da dificuldade que é trabalhar com turmas heterogêneas e com uma clientela com interesses e necessidades tão diferentes entre si, sugiro um estudo mais detalhado sobre a aplicabilidade da avaliação da aprendizagem nas turmas de Eja que tem como educandos: idosos, adultos, jovens e adolescentes.

Cláudia Bastos
Enviado por Cláudia Bastos em 25/10/2012
Reeditado em 25/10/2012
Código do texto: T3951257
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