CARTAS AO LEO

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Lagoa da Cruz, oito de junho de 2008

Já lhe reiterei, por diversas vezes, que não sou poeta; às vezes tento ser, porém logo desisto. Deus não me fez poeta.

Como não desenvolvi a prática de fazer versos, não sou a pessoa mais indicada para falar sobre a liberdade poética.

Todavia, com sua licença, estou lhe enviado a transcrição de um fragmento de Ensaio Sobre Poética: Escrito para a edificação e para instrução dos pretensos poetas (s.d.), um texto didático do Professor Trochee, uma das mais enigmáticas personificações de Fernando Pessoa; comenta o professor:

 “Espero escapar ao ridículo universal ao afirmar que, teoricamente, a poesia é susceptível de escansão. Gostaria, porém, que ficasse claro que concordo com o Senhor Fulano e Beltrano quando afirma que a escansão estrita não é de todo necessária para o sucesso e mesmo para o mérito de uma composição poética. E creio não parecer excessivamente pedante se procurar no armazém do Tempo, para citar como autoridade, algumas das obras de um certo William Shakespeare ou Shakspere que viveu há alguns séculos e que desfrutava de alguma reputação como dramaturgo. Esta pessoa tinha por hábito cortar, ou acrescentar, uma ou mais sílabas nos versos das suas numerosas produções, e se era inteiramente permitido naquela época de beleza quebrar as regras do bom senso artístico e imitar algum obscuro escriba, ousarei recomendar ao principiante o prazer desta liberdade poética.”

Ai está Leo o que pensa Fernando Pessoa a respeito da liberdade poética, cabe a você julgar se ele está certo ou errado.

Horácio, poeta e filósofo romano, certamente, concordaria com Pessoa, pois, certa vez, escreveu: “Aos poetas e aos pintores sempre foi concedida a liberdade de ousar qualquer coisa”.

Queira receber um forte abraço do velho amigo

RSérgio.

P.S.: Retirei o fragmento da obra Pessoa por Conhecer - Textos para um Novo Mapa, de Teresa Rita Lopes (trad. de Luísa Medeiros); Estampa, Lisboa, 1990. 

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Agradeço a leitura e, antecipadamente, qualquercomentário.

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