Provas de Insanidade - Julieta com G

INTRODUÇÃO

Era uma vez uma menina nos seus doze anos de idade, cheia de sonhos, ainda brincando de bonecas e de faroeste com meninos na rua. Era inocente e endiabrada, pura e estudiosa, um exemplo, uma criança como outra qualquer.

Eis que essa menina conhece um rapaz, menino ainda, nos seus quinze anos de idade, mas para ela, um verdadeiro príncipe encantado.

Lá pelos anos 70, o rock, a revolução sexual, a mulher soltando as amarras do seu velho cordão umbilical... E a menina, apaixonada, sem saber direito o que era isso.

Eis que se conhecem e ficam amigos, imaginem só, dois amigos de verdade, com encontros diários, jogos e conversas ao pé de ninguém. Pura amizade que teimava em virar amor no coração da pequena.

Que trapalhada hein! A menina tinha uma boneca e vivia para cima e para baixo exibindo os vestidinhos novos que sua mãe, pacientemente, fazia para ela. O engraçado é que o mesmo frio na barriga que sentia ao ver sua boneca com um vestido novo, também sentia ao ver o rosto de seu amado nas muitas vezes em que se encontravam.

Amor de infância? Não. Primeiro amor! Tão forte quanto o primeiro beijo, o primeiro filho, o primeiro sonho realizado... Ele era sua fantasia, seu ar, seu motivo, seu tudo!

Romeu era seu nome? Sim. O sonho de toda Julieta, apesar de não se chamar assim, ela se sentia a própria e rezava para que não precisasse morrer por ele, apesar de ter certeza de que o faria se fosse o caso.

Romeu. O cara bonito, o cara seguro, bom filho, bom amigo, responsável, divertido, bom de papo, bom de tudo. O Romeu da Julieta com G. Dela. Seu.

Os anos se passaram e os dois seguiram rumos diferentes, ele para o norte, ela para o sul.

Quando novamente o destino brincou com os sonhos da garota. Destino malvado, Romeu era vizinho do fundo numa cidade estranha. Era tudo de bom, poder olhar pelo seu quintal e ver seu amor de menina chegando do trabalho, ouvindo música, tomando cerveja ou simplesmente abrindo sua janela. Que maravilha! A janela de seu quarto ali, ao alcance de seus olhos.

Ela agora com quinze e ele dezoito. Idade perigosa para uma menina, pior para um rapaz. As descobertas, a puberdade e a crescente vontade de fazer besteiras, típicas de uma adolescente.

Mas era tímida e esse defeitinho a fez recuar. Talvez tenha sido sua salvação ou perdição, sei lá. O fato é que olhares existiram, conversas e muitas dicas, de um lado e de outro. Ela por estar apaixonada desde sempre. Ele, talvez, pelo instinto de macho, de sempre ter que seduzir ou se insinuar. Ela nunca teve esperanças, sabia que seu sentimento era platônico e vivia assim... Sem reclamações. Seu amor bastava.

Um dia percebeu que ele era cobiçado por uma garota e quase teve uma síncope! Chegou junto! Deu bronca na gata, um verdadeiro chega prá lá... Coisa de louca mesmo! Idiota! Se tivesse a mesma coragem que teve para demarcar território, para se declarar, talvez essa história fosse outra...

Olhares, conversas, mãos dadas, discos e músicas na lembrança... Só lembranças!

Os dois se separaram novamente, cada um numa direção, rumos diferentes com pessoas diferentes.

A menina namorou outras pessoas, casou, teve filhos, experiências, desgostos, felicidades... Viveu!

Sem nunca esquecer o garoto. Sempre seu rosto na lembrança e muito amor no coração.

Amor verdadeiro? Não sei. Talvez fruto da não vivência, amor de fantasia, amor de fumaça...

Mas rendeu uma história!

E hoje resta a inspiração e muitas cartas. As cartas que ela gostaria de ter escrito, coisas que gostaria de dizer, palavras soltas ao vento, cravadas num papel que não existe...Cartas virtuais.

Julieta com G são suas cartas para o Romeu!

APRESENTAÇÃO

O Romance "Julieta com G" é o resgate de um sentimento escondido há 39 anos.

Um menino e uma menina que se perderam no tempo. Dois seres que foram amigos e tiveram uma linda história de amizade, mas que poderia (deveria?) ter sido de amor.

O Romance é o resumo de muitas histórias a partir de uma única vivência.

Muitas pessoas cultivam a lembrança de alguém que foi importante no passado. O que resta sempre são fotografias desfocadas e amareladas com o tempo, mas, muitas vezes, nítida na mente de quem as vê. Isso quando se trata de uma história mal resolvida. O que não vivemos dá margem às fantasias mais mirabolantes. Às vezes o que não era nada, torna-se tudo, o banal torna-se vital.

O Romance torna-se real a partir de uma grande vontade de resgatar o que não foi vivido. Realidade misturada à fantasia.

"Julieta com G" não tem data para acabar. Assim como veio do nada, pode ir se evaporando com o decorrer das linhas...

O importante é o registro de um grande amor... Ou seria de uma grande ilusão?

Porém existe o lado científico. Um terapeuta poderia taxar esse como mais um caso de obsessão. Talvez frustração com a atual vida e, por isso, o interesse obsessivo no passado. Pode ser...

Nesse caso trataríamos essas cartas como “provas de insanidade”? Provavelmente...

De qualquer forma, vamos em frente que atrás vem gente...

Bem vindos à "Julieta com G".

Cartas

De minha casa, 10 de julho de 2011

Olá Romeu,

Lembra da nossa rápida conversa ao telefone? "Precisamos nos encontrar para falar sobre as coisas que ficarão lá atrás...". Essa conversa nunca aconteceu. Talvez porque para você tudo tenha um significado mais simples, o complicado se fez assim, com o passar dos anos, somente na minha cabeça. Não sei...Não quero fazer suposições sobre o que passa no seu coração, mas sim relatar com toda sinceridade o que o meu sempre sentiu.

Lembra daquele casarão antigo onde a gente se encontrava para conversas inocentes? Eu tinha doze anos e ainda brincava de bonecas. De sexualidade nada sabia, apenas que, olhar para você me fazia sorrir sem motivo, sua voz me fazia perder a noção da hora. Eu não entendia direito aquele sentimento, apenas sentia e cada vez mais, a cada encontro.

Lembra do casal de velhinhos que lá morava? Era o modelo de relacionamento que eu sonhava. Olhar nos olhos deles e me imaginar ali, cabeça branca, com você ao meu lado, com os mesmos cuidados e mimos que os dois tinham um com o outro, sem se importarem com nossa presença. Eu os via tão apaixonados que até hoje não sei quem morreu primeiro, só sei que poucos meses depois, o outro o seguiu, de tanta solidão.

Romeu, até hoje penso que meu nome devia ter sido "Julieta"...Anos e anos vivendo distante e você nos pensamentos mais secretos, tanto nas alegrias, como nos momentos tristes.

Lembrar de seu rosto tornou-se um vício, tanto que 20 anos depois de nos perdermos pela vida, um dia acordei sem conseguir lembrar dele... Nossa! Foi um dia muito triste! Lembro que chorei e antes de dormir pedi a Deus para sonhar contigo. Ele atendeu: Você estava nos fundos de sua antiga casa e eu no muro que dava fundo à minha, como tantas vezes eu ia para te ver no final da tarde, quando você chegava do trabalho. Eu vi seu rosto e mentalizei para nunca mais esquecer. Acordei bem feliz naquele dia..

Romeu, não sei o que se passou contigo naquela época, se seus sentimentos eram os mesmos que os meus ou não. Tive alguns indícios de que me queria, mas toda pessoa muito apaixonada vê o que quer ver, nem sempre a realidade é o que se observa....Por isso me calei. Não tive a coragem de...

E agora, depois de uma vida conturbada sem muito amor, me vejo sonhando com o passado e imaginando como teria sido se...Se... Palavrinha doída essa! Por isso sempre que me pedem conselhos amorosos eu digo: Viva! Não tenha receio de tentar. O máximo que ouvirá é um"não". Garanto que será menos doído do que o arrependimento de não ter tentado.

Por hoje é só isso meu querido.

Da sua

G

De uma Lan house, 11 de julho de 2011

Querido Romeu,

Aqui estou eu fazendo minha inscrição para a Universidade! Pois é, passei no vestibular. Dizem que nunca é tarde para se fazer o que gosta, pena isso não se aplicar a nós dois, supondo que um dia tivesse existido essa possibilidade...

Uma das coisas que mais gosto de fazer nessa vida é estudar! Depois de escrever, é claro. Não sei se sabe, mas até já publiquei um livro. Mais isso é outra história. Tanta coisa se passou sem que soubéssemos um do outro. Eu, sinceramente, espero que você seja uma pessoa feliz. Eu sou. Bem feliz, posso dizer, afinal faço tudo o que gosto. Trabalho, estudo, tenho minhas horas de lazer, eu posso dizer que sei viver, apesar de ser bem caseira.

Lembra de quando tínhamos sonhos? Eu acho que consegui, afinal sempre disse que queria ser escritora... Talvez um dia até faça um livro dessas cartas... Quem sabe?

Bom, falei que era feliz no trabalho, no que faço por lazer, meus filhos e toda a carga de experiência que adquiri durante a vida. Não me arrependo de nada que fiz! Claro, no amor conheci bem pouco... Posso dizer que só namorei uma pessoa estando apaixonada e não passou de namorico. Amor de verdade só conheci o seu e, veja bem, platônico e primeiro. Meu primeiro amor! Isso me deu boas lembranças... Vamos lá:

Uma cena hilária onde eu dizia a uma amiga para deixar você em paz, que era meu! Ela tinha acabado de me confidenciar que estava a fim de ti e olhe, eu tinha acabado de te conhecer, poucos dias mesmo.

Outra, eu entrando dentro de uma caixa d'agua para te ajudar a lavá-la, rs, claro, mais atrapalhei que ajudei. Eu era uma criança, mas via você como meu príncipe encantado.

A mais marcante foi você segurando minha mão e me puxando para dentro de sua casa durante uma festa. Aí eu já tinha meus 16 anos e confesso, achei que ia rolar um beijo, torcia para isso... Não rolou.

Bom, por hoje é isso.

Até a próxima doido...(até parece, a doida aqui sou eu com essas cartas, eu assumo, rsrs)

Um beijo

G

De casa, 12 de julho de 2011

Romeu,

Eu sei que pareço uma doida obsessiva, mas te asseguro, não é nada disso. Escrever essas cartas aqui no blog e só agora, talvez pareça estranho, mas vou tentar explicar:

Eu sempre pensei em você, no passado, em como foi nossa convivência e, confesso, fantasiei várias vezes no que teria sido se tivéssemos juntos. Não por obsessão, talvez por você ter sido meu único sincero amor, o amor inocente da juventude, o primeiro, aquele que se diz nunca esquecer. Também por ter tido relações sempre conturbadas, sem amor (só com o passar do tempo percebi) e estar sempre achando que a vida ficou me devendo algo mais forte, sei lá, talvez o que não vivi. Bom, essa é a questão, talvez meu amor por você tenha ficado tão grande pelo fato de não termos tido uma relação. Dizem que o que não se bebe é que nos mata de sede, eu concordo. O fato é que ficar fantasiando nunca é bom, pois nos impede de viver. Por outro lado já vivi muitas coisas, somente não um grande amor.

Bom, trabalho muito e agora, de férias, decidi escrever essas cartas como desabafo, inspirada por um filme que assisti outro dia na TV: "Cartas para Julieta". No filme eles se encontram 50 anos depois e vivem o tão sonhado romance. Não sou Julieta, mas também tenho um grande amor, mesmo que platônico. O amor é sempre amor, não importa o tipo. Se for a dois melhor, mas no meu caso, mesmo sendo só eu a sentir, confesso que é uma boa lembrança que me acompanhou e acompanha, nas alegrias e nas tristezas. Sou uma romântica incorrigível? Sim, sou. Dizem que lembranças boas são um bálsamo para alegrar os dias quando a idade chega, principalmente quando se está sozinha. É verdade. Eu gosto de pensar em ti. Obsessiva? Jamais! Nunca iria atrás de ti. Você é o meu Romeu dos anos 70, aquele que mora na minha cabeça e coração. O que respira aí na sua casa está vivendo a história que escolheu viver, eu não me meteria nela. Mas essa história fictícia aqui na minha cabeça é só minha. E é dela que falo aqui. Do meu amor. E ponto! rs

Bom, por hoje é isso.

Da sua

G.

De casa, dia 13 de julho de 2011

Querido Romeu

Eu tinha esquecido como é bom acordar tarde são 11 da manhã, rs.

Tenho que enviar uns documentos para a Universidade e já estou atrasada.

Tem gente que me diz: Você é louca! Nessa altura da vida voltar a estudar... Trabalhos, provas, falta de tempo...

Eu amo estudar, escrever mais ainda. Se eu não estivesse sozinha e se tivesse, nessa altura da vida, vivendo um relacionamento baseado num grande amor, se eu estivesse com você, talvez não sobrasse tempo para tudo isso, preferisse tomar conta da gente... Mas, enfim, essas coisas se tornaram maiores, não sei viver sem elas e estou bem feliz em ter conseguido.

Hoje me lembrei do seu bom humor, da sua voz forte e da maneira que fala comigo, passando segurança e firmeza...(eu ouvi você recentemente, lembra? recentemente, hehe, 7 anos atrás se torna recente para quem se distanciou há tanto tempo...).

Beijo

Da sua

G

De casa, 14 de julho de 2011

Romeu,

Preciso contar como me afastei de ti lá no passado. Foi minha primeira decepção.

Minha irmã era uma pessoa avançada para a época. Hoje em dia é comum os jovens ficarem com várias pessoas sem compromisso algum, numa mesma noite dizem beijar não sei quantos ou saem com alguém e dizem "estou só ficando". Bom, ela fazia isso lá no passado e por isso era mau vista. Você deve lembrar, com certeza. Bom, ela sabia dos meus sentimentos com relação a você e tentava, de alguma forma, apressar as coisas. Do jeito torto dela, ela julgava estar me ajudando, agindo da forma que agia. _"Quando estiverem conversando dê um beijo nele! Se não fizer isso, eu faço!"

Um dia, chegando no casarão para mais um de nossos encontros, deparei-me com vocês, sentados na sala, lado a lado, num beijo da forma que eu sempre sonhava que daríamos. Foi minha primeira decepção amorosa

Parei de ir ao seu enccontro. Decidi desistir daquele sonho infantil e nos afastamos.

Minha família mudou de cidade e passei a viver minha adolescência normalmente. Tive meus primeiros namoricos e, dois anos depois, reencontrei você.

4 anos se passaram desde que nos conhecemos. Eu estava com 16 e você 18. Quando te vi meus sentimentos voltaram mais fortes. Mas, dessa vez, eu entendia o que se passava e o que queria. Apenas não tinha certeza dos seus. Alguns indícios de que me queria, mas fui covarde. O medo de ser recusada foi maior.

Voltei a falar com minha irmã, graças Deus, nos tornamos amigas depois de anos de convivência. Isso foi bem legal, pois ela viria a falecer um tempo depois.

Bom, um dia alguns amigos vieram me visitar e, por coincidência, você tomou um porre. Fiquei feliz, para mim era por ciúmes, mas não tinha certeza. Sua irmã me disse que não, era apenas porque você e seu pai haviam brigado.

Eu tinha me enganado e visto o que queria ver...

Tempo depois passeamos de mãos dadas na sua casa durante uma festa. Eu jurava que ia rolar um beijo. Não aconteceu e tive a certeza de que me considerava apenas uma grande amiga.

Afastamos-nos e minha última lembrança de ti foi na minha festa de casamento. Você se embriagando de vinho e ameaçando fazer um escândalo. Um amigo seu te segurou de fazer a besteira que me daria certeza de que me queria. Mas era tarde, mesmo que me desse essa certeza, era tarde demais para nos dois.

Essa é a minha história de amor. Passei anos tentando adivinhar a sua. O que se passou dentro do seu coração? Você é feliz hoje com suas escolhas? Eu gosto de pensar que sim, espero muito que sim. É que eu vivi muitas escolhas depois de ti, mas não consegui ser feliz com elas. O que me fez a mulher feliz que sou hoje foram os frutos de minhas relações, as minhas realizações pessoais, meus amigos, tantos... Posso dizer que se voltasse lá atrás faria tudo igual. Menos naquela noite da festa! Eu teria te dado o beijo! Seria uma boa lembrança...

Amanhã tem mais...

Sua

G

De casa, 15 de julho de 2011

Olá,

Eu acordei pensando no tempo, como acontece tantas coisas, alegres e tristes, envelhecemos, construímos, nos perdemos, nos encontramos, mas, por dentro, continuamos as mesmas pessoas. O espelho é nossa única referência...

Minha vida toda eu sonhei com independência, ser a dona da minha vida, a única responsável pelo que coloco à mesa. No fundo sempre tive um grande medo de não conseguir. Fui criada com a imagem de um provedor macho, fui ensinada assim.

Por isso, em 1994, quando consegui meu primeiro emprego (antes tarde do que nunca, rs), fiquei muito confiante no futuro. Eu sabia que iria acabar sozinha, era meta de vida.

Quando enfim me separei enfrentei um batalhão de neuroses, desde as mais simples, como não saber dormir e acordar sozinha, até o pavor de não conseguir colocar comida na mesa.

Mas consegui... Cresci.

E em 2003, quando consegui meu segundo trabalho, numa das noites em que esperava ônibus para ir para casa, eu reencontrei você. Foi maravilhoso e assustador. Fiquei paralisada, literalmente. Você não deve ter entendido nada, mas jamais passou pela minha cabeça te ver ali e quando parou perto de mim, eu surtei... Fiquei dias e dias envergonhada de minha atitude. Ver-te me deu ânimo para continuar tentando conquistar meus sonhos.

E, enfim, em 2007/2008, pela primeira vez passei a tomar conta sozinha da minha vida, sem depender de mais ninguém. Eu explico: Recebia uma ajuda financeira de um ex e consegui, a partir dali, não contar mais com ela. Passei a ser minha única provedora. Parece bobeira, mas foi a melhor sensação da minha vida. Eu tinha a necessidade de provar para mim mesma que conseguiria, e consegui.

Bom, hoje sei que posso qualquer coisa. Lanço meus escritos, livros, trabalho com o que gosto e sei onde você está. Eu lembrava de você mas sem saber direito onde estava, se era feliz ou não. Hoje sei onde vive e sei que é feliz. Isso me basta. Posso dizer que sou feliz também.

Bom, a gente se encontra de vez em quando, em ocasiões nada agradáveis, nos funerais, como dois velhos parentes... Mas a vida não é isso? A preparação para os funerais...

Mas, (bate na madeira) preciso acreditar que teremos outros motivos para nos vermos que não esse...

Até a próxima carta,

Da sua

G

De casa, 16 de julho de 2011

Oi Romeu,

Eu estava respondendo um email e pensando em como a vida nos coloca situações simples, mas que não conseguimos resolver por estarmos envolvidos demais. É como um médico que não opera parentes. Eu sempre fui considerada a conselheira sentimental de plantão. Na escola as amigas corriam atrás de meus conselhos a cada problema que surgisse em suas vidas. Até hoje, pessoas me pedem conselhos em questões íntimas. É como se eu tivesse uma placa no rosto: A Conselheira.

Eu sempre gostei de ajudar, sempre tive conselhos sensatos na ponta da língua. Resolver a vida dos outros se tornou tão fácil!

Mas o duro de quem dá conselhos é que não admite existir alguém bom o suficiente para nos aconselhar quando o problema é com a vida da gente. Eu nunca confidenciei o que sentia por ti. Nunca pedi conselhos a esse respeito. É como se fosse um segredo só meu e que passasse longe da compreensão das outras pessoas.

Estranho, não é mesmo?

Eu deveria ter seguido a carreira de psicóloga. Mas como ajudar os outros se não consigo ajudar a mim mesma?

Questões sem resposta...

Bom, hoje ajudei alguém... Isso é o que importa.

Beijo

G

Casa, 20 de julho de 2011

Romeu,

Envelhecer... Nada tem tanto peso! As pessoas nem percebem e quando param para pensar, já foi...

O tempo é implacável! Por isso a importância de jamais deixar algo pendente.

Um dia encontrei uma antiga amiga na internet, faziam mais de 20 anos que não nos víamos... Como mudou! Foi a partir daí que tomei consciência do tempo que passou. Não somos mais aqueles jovens do passado. A G e o Romeu ficaram lá longe, nas lembranças, no tempo que não volta mais...

Às vezes tenho esses rompantes. Passam logo, mas enquanto presentes são bem consistentes.

Por isso parei com as cartas...

Até breve

G

De uma Lan, 02 de agosto de 2011

Romeu

Depois de um período afastado volto a te dar notícias. Eu sempre faço isso, me afasto por um tempo, mas sempre volto, sempre volto...

Às vezes eu me vejo num espelho implacável de auto-análise. A imagem de uma mente solitária... Só uma mente solitária faria essas cartas existirem. Cartas para uma pessoa que ficou no passado... Quase um fantasma!

Quando me vejo assim, afasto. Mesmo sabendo que mais adiante voltarei, sempre e com mais força!

Até breve!

Sua G

De casa, 7 de agosto de 2011

Meu querido Romeu

Senti vontade de te dizer coisas que nunca disse, de te contar das vezes que me peguei pensando em ti...

No almoço, quando como arroz com feijão, mesmo quando a mistura é só um ovo. Eu mastigo e penso se você também come... Do cafezinho forte e quente, do seu aroma. Você também é obcecado por café?

Dos dias de chuva e frio, quando me enrolo num cobertor e assisto a um filme na TV. Imagino você caçoando, pois adoro um drama romântico e sei que você zoaria comigo.

Das músicas lentas... Seu corpo colado!

Do meu trabalho, quando olho o telefone e imagino que vai tocar e, sua voz firme, inconfundível, me fazendo tremer...

A noite na minha cama, todo amor que sempre sonhei, você me fazendo voar... Será que você é tudo aquilo que fantasio? Deve ser melhor...

Dos momentos tristes, do seu abraço; dos alegres, o seu aperto... Sua pegada!

Das cartas que não te mandei, dos beijos que não te dei, não te dei nada do que queria...Do que quero.

O meu amor é assim: Voa longe, longe!

Um beijo

Sua G

Do trabalho, 11 de agosto de 2011

Querido Romeu,

Finalmente minhas férias acabaram! Eu prefiro a rotina atrapalhada de trabalho/casa, casa/trabalho. Sinto-me mais útil e com menos tempo para pensar besteira. Eu sou muito preguiçosa, já havia acostumado a levantar bem tarde, umas onze da manhã, rs. Também, com o frio do inverno, acordar tarde é um grande ganho! Odeio o frio! Vai ver é porque não possuo "cobertor de orelha", hehehe.

Hoje me lembrei do seu trabalho, eu adoro o cheiro de seu trabalho... Também, desde pequena fui acostumada com isso. Lembra do meu pai? Imagens da minha infância sempre surgem quando sinto o aroma no ar... Por que não digo o nome do cheiro? Tenho certeza de que você não precisa que eu diga, quanto às outras pessoas, não precisam que eu diga. Nunca esqueço que estou publicando essas cartas num blog. A curiosidade matou o gato! kkkk...

Estou feliz hoje! Nem sei direito o porquê, só sei que estou... Não preciso de motivos. Sou uma doida e os doidos não precisam explicar seus sentimentos.

Sinto vontade de ter aquela conversa que ficamos devendo um ao outro. Lembra? Pois é... Mas não sei se é uma coisa possível de acontecer um dia. Talvez não.

Estou com saudades de ti. Sempre estou...

Um beijo da sua

G

Do trabalho, 15 de agosto de 2011

Olá!

Hoje cedo, enquanto me aprontava para trabalhar, via um filme na TV, onde duas pessoas se encontravam 20 anos depois e descobriam que foram separadas por um oportunista, no passado.

Estavam casados com outras duas pessoas e a paixão voltou a toda quando se viram. Tiveram que se encontrar para passar a limpo o que sentiam e, pasmem, se beijaram algumas vezes, só que não sentiram o mesmo que imaginavam que sentiriam. Não sentiram nada mais do que sentem, dois grandes amigos.

Puderam, finalmente, seguir em frente...

Uma maneira de resolver o que ficou travado. Gostei do filme. Uma boa forma de terminar com uma grande ilusão.

O dia começou bem...

Beijos da sua

G

Do trabalho, 19 de setembro de 2011

Romeu,

Já se sentiu mal em ver seu reflexo no espelho? Um dia você acorda e ao se olhar no espelho leva aquele susto! O tempo foi implacável! Como se eu tivesse adormecido por uns dez ou quinze anos. Quando eu perdi minha contagem de tempo?

Eu passei anos sem coragem de ver minhas fotografias. Quando alguma surgia na minha frente, rapidamente eu olhava através dela, não a via... Acho que isso é próprio das pessoas solitárias, não querer ver o envelhecimento.

Durante muito tempo não gostei de mim mesma. Cheguei ao cúmulo de tentar apagar, até mesmo, a sua lembrança. Eu achava que ninguém jamais iria querer alguém como eu. Eu não conseguia gostar de mim mesma. Com o tempo aprendi a me admirar por dentro, muito mesmo, não trocaria meu interior por nenhum outro. Mas, do exterior, desse eu procuro fugir. Acho que perdi muito tempo com coisas que não me faziam felizes e agora, que posso ser eu mesma, não gosto de ver no que me transformei. Eu sei que é muito ruim não aceitar as marcas do tempo, mas é um defeito que não consigo superar. Quando me vejo no espelho ainda olho através dele.

Sou uma pessoa feliz, realizada, mas solitária, assumo. Tomei algumas atitudes ao longo de minha vida que me trouxeram insatisfação. Por isso tive que dar um basta e continuar meu caminho, sozinha. Não me arrependo, não, nem por um segundo. Eu era uma pessoa infeliz e me tornei alegre e satisfeita a partir dessas decisões. O problema é que demorei muito para dar um basta e agora é bem tarde para algumas coisas. Mas sou realizada profissionalmente, sou realizada como mãe, tenho grandes amigos. Apenas não tenho aquela pessoa especial que acho imprescindível para poder viver a vida como ela é. Por isso eu penso tanto em você. Que coisa!

Mas não se preocupe, é inofensivo. O amor platônico tem dessas vantagens, não fere.

Bom, você hoje leu um pouquinho da minha alma.

Um beijo

Sua G

Do trabalho, 08 de setembro de 2011

Olá Romeu

Lembra do 11 de setembro? Pois é, domingo faz 10 anos. Parece que foi ontem... A sensação de inutilidade, a surpresa de ver tamanha barbárie cometida por um ser humano e todos os sentimentos ruins que esse fato causou.

Ontem eu assistia um filme sobre o ocorrido, "O Vôo United 93", e não conseguia parar de pensar em como somos imperfeitos. Pessoas que matam sem um sinal de arrependimento ou dor, não se importam com os sentimentos de seus semelhantes. Monstros que me fazem ver, que isso que sinto por você é puro, inocente e bom, ao contrário do resto. É uma fantasia? Uma ilusão de uma pessoa solitária? Uma neurose, psicose, etc... e tal? Não importa! Alimentar isso escrevendo essas cartas me faz feliz. Faz-me bem! Não machuca ninguém...

Isso é bem maior que a realidade lá fora!

Até a próxima...

Sua G

Do trabalho, 20 de setembro de 2011

Olá Romeu,

Vou bancar a reclamona agora: Coisas que eu gostaria de ter ganho de ti:

• Rosas vermelhas, nossa, como seria legal aquelas rosas cheirosas com um cartãozinho bem meloso, hehe...

• Um anel! Puxa! Não sabia que eu era tão mulherzinha! Um anel seria tudo de bom!

• Uma caixinha fechada... Tanto faz o que vier dentro, o importante é ser surpresa e melhor ainda, escolhida por você.

• Uma fotografia. Já tive desesperada por uma fotografia sua. Seria bem legal!

• Uma carta... Dizendo qualquer coisa. Lembra o que me confidenciou ao telefone? O que você mais gostava em mim quando nos conhecemos... Foi um elogio e tanto, não esqueço as palavras, tampouco sua voz... Não importa que eu não tenha mais os mesmos atributos, o bom foi ouvir você dizer.

• Um elogio... Esse eu já tive, mencionei aí em cima. Um dia, há pouco tempo, você me disse ao telefone. Foi o máximo!

• Um abraço, um beijo...

• Um aperto de mão. Esse eu tive e guardei na lembrança esses anos todos.

• Um colar, um diamante, um cartão de crédito, um... kkkkk. Brincadeirinha!

O mais importante e que substituiria todas essas coisas, você! Seria tão bom ter você!

Um beijo

Sua G

Do trabalho, dia 14 de dezembro de 2011

Olá!

O ano está acabando, passou tão rápido! Tempo, tempo, tempo...

Desculpe a demora em te escrever, às vezes fico tão desanimada... Como se isso tudo fosse uma loucura da minha cabeça.

Romeu, Romeu, Romeu... A sensação é que você faz parte do tempo e o tempo de você. Ambos tão presentes na minha vida!

O Natal chegando, as férias da Universidade, agora sou universitária! À volta às origens...

O recesso do trabalho, a saudade do ano que acaba e o medo da incerteza do que começa.

Eu sou o futuro e às vezes me assusto com isso. Será que dou conta?

Romeu, que seu Natal seja agradável, com saúde, fartura e alegria! Que o ano que se inicia te traga felicidade e realização.

Para mim apenas desejo que o tempo se apresse mais ainda. Quem sabe depois dele eu te alcanço!?

Saúde para os meus, alegrias, dias plenos de luz!

Beijão! Muitos beijos!

Sua

G

.........

Pensam que acabou? Nada!

Os sonhos ainda vivem, os protagonistas ainda respiram e nossa Julieta com G, em camisa de força, promete continuar com as cartas ou, com alguma notícia que indique mudança nesse quadro de psicose obsessiva, seja num final feliz, numa continuidade de sua infeliz procura ou no derradeiro suspiro de seu sonho mais secreto. Secreto? Agora não mais! Não mesmo!