Ô mainha!

Ô, mainha. A gente dá tanta volta nesse mundo pra quebrar a cara e dizer que a senhora tava certa. Eu lembro como se fosse hoje aquele dia em que eu te contei que meu sonho era fazer jornalismo e que eu tava indo embora em busca do meu sonho. Você chorou, lembra? Mas ao contrário do que eu pensava você me ajudou a fazer a mala e me deu as economias que a senhora tinha. Abriu a porta lá de casa com o coração na mão, abriu minha mala e o colocou lá dentro. Era pra eu levar um pedaço de você comigo. O mais especial.

“Vai e segue teu sonho. Vai atrás do que faz você feliz. Vai e não olha pra trás. Espera o que há de vir. Meu Deus sabe o que faz."

Foram tantas portas fechadas, tanta gente rindo da minha cara, do meu sotaque, dos meus sonhos, das minhas roupas. Eu pensei em desistir tantas vezes, ô mãe. Mas você tava lá comigo. Até naquele dia que eu tava com fome e tinha que escolher se pegava o ônibus ou comprava o lanche. E tenho certeza que aquela senhorinha que me ajudou foi um anjo que atendeu alguma reza tua, minha mãe. Você me ensinou tanto, sabia? Foi por causa daqueles teus Nãos, que eu aprendi a sofrer com honestidade. Foi por causa do seu orgulho quando eu tirava nota boa na escola que eu aprendi a me orgulhar de mim mesma. Minha escola foi lá em casa. Aprendi mais que matemática e essas coisas bobas que todo mundo sabe. Minha escola foi com dureza, sem muito mimo, com muita luta e muita força. Debaixo daquele sol quente indo pra o Galo Branco dar aulas, eu via que a senhora não desistia fácil. Meu choro e dos meus irmãos era o que te fazia levantar, eu sei. Minha escola era teu rosto. Tuas expressões de dureza que se transformavam em sorriso quando a gente mostrava que era feliz tendo pouco. A gente era feliz tendo muito de você, minha rainha.

“Não deixe ninguém dizer que você não consegue ser feliz. Tá vendo aquela plantinha ali no quintal? Ela não pode se mexer, não consegue levantar. Por isso que eu vou lá e rego todo santo dia. Ela tá bonita que só. Você é como aquela plantinha. Eu te ajudei enquanto eu pude e vou sempre ajudar você. A diferença é que você tem pernas pra escolher um caminho que não depende da minha vontade. Depende da tua força. Vai cair muita água, muita pedra, muita quentura e muita gente ruim. Vai ter cobra, urubu, erva daninha e todas aquelas pragas que a gente vê por aí. Mas você tem que ser forte. Olha pra frente e segue teu destino. Tua felicidade depende de você e de quem você é. Não esquece dos teus valores…”

No meio do caminho perdemos Voinho e Foi dureza, mãe. Mas eu consegui. Não aceitei drogas na faculdade, nem deixei de assistir aula pra ir pra os botecos. Enfiei a cara nos livros e enfio... Hoje é seu aniversário e eu só posso dizer que tudo que eu sou hoje, devo a senhora e a Painha, que mesmo nos sufocos, me ensinaram ser gente. Todos os meus certificados e meu diploma pertencem a você, e se tirar você de mim não sobra nada.

Te amo, feliz aniversário! Obrigada por tudo.

Ana Cristina Araújo
Enviado por Ana Cristina Araújo em 29/09/2017
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