Amanhas Coloridos
 
No final daquela tarde, Tereza, depois de dar uma parada para comprar flores, entrou pelo portão de trás do Cemitério da Colina e foi seguindo pelo gramado até o lugar do jazigo. Respirou o ar frio, apreciando a solidão do lugar. O túmulo estava no topo da elevação com vista para o Jardim das Magnólias. Ela viu a lapide e a dor voltou como se nunca tivesse ido embora.
Ela se ajoelhou e colocou as flores na sepultura.
─ Já faz dois anos, querido amor ─ disse, sentindo as primeiras lagrimas brotarem dos seus olhos.
Riu alto.
Estranha vida. Escrevemos nossa própria historia, e uma vez escrita, será.  Que grande piada!
Os que a conheciam, a viam como uma senhora desprotegida entrando nos seus 80 anos, sofrida e destruída pelos quase 60 anos vivendo ao lado de um psicótico.
Uma analise deturpada, pensou. Sinto sua falta como jamais imaginei um dia sentir. Eu o amava. À sua maneira, sei que também me amou mais que a própria vida.
 
Muitos a amaram. Outros tantos se aproveitaram dela. Alguns a julgaram. Nenhum a mimara. 
“Tereza não reclama de nada não”. “Tudo está bom pra ela”, diziam.
Como se eu não fosse gente. Como se não precisasse de alguém para segurar minha mão. De um coração para entender-me.
Ela não conseguia imaginar-se, a não ser uma jovem. De espírito pelo menos. Bela ainda, por que não? A velhice não a tornara feia: simplesmente lhe dera uma beleza diferente.
Sou jovem? Sou velha? Não sei! Metade de mim ainda é menina. A outra é maturidade.
 
Aquela senhora de 79 anos que os filhos insistiam em ver, não era ela.
Eles estranharam a sua rebeldia. Esperavam continuar a ver nela a mulher dócil, a submissa, aquela que aceitava tudo que a vida lhe dava.
Vendo-a como uma vitima tratavam-na como uma incapaz, sem perceberem que essa liberdade forçada não estava propriamente em reviver o passado, mas sim em aprender com ele, descobrindo finalmente, que ela era e seria a única responsável por aquilo que acreditara e deixara tomar conta da sua vida.
Para eles sou uma idosa sem sonhos. Sem paixão pelo viver. A velha à espera da aventura final. Tolos!
De verdade, ela era uma menina pronta para sair correndo pelos campos, de braços estendidos para a vida. 
Muitos amanhas coloridos esperavam por Tereza Sampaio.
 
Em homenagem a alguém que conheci. Que não colocara um ponto final em suas esperanças.
Que acreditava que ainda há o que fazer. Ainda havia muito que plantar e o que amar nessa vida.




(*) Imagem: Google




 
Marisa Costa
Enviado por Marisa Costa em 29/10/2013
Código do texto: T4546970
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