Estava tudo pronto. Malas feitas, passaporte na bolsa e passagem na mão. Havia decidido enfim ir buscar seu coração, o desertor ingrato que a quase um ano a abandonara para morar na Itália. O músculo infiel a tinha deixado para bater junto aos belos olhos italianos que causaram esse triângulo amoroso: ela, ele e o fugitivo órgão.
     
     Quem era ela para condená-lo? Quem nunca sonhou morar na toscana ao céu e sol da Europa, num romance intercontinental, quase coisa de filme? Até ela, sempre tão racional. Mas a vida não é rodada num cenário locado e transportável, precisava escolher se ficava na sua segura e estável vida conseguida a tanto custo ou se embarcava na loucura. Era loucura mesmo?
   
 Ela nunca tinha percebido como tinha pouco, até desejar mais que uma "vidinha comum" com as ambições que nunca foram dela, a ensinaram a ter.
Agora sentada sozinha, com o oco no peito, se lembrava dos dias de sua infância, quando tudo que sonhava era ser professora, e não a executiva bem sucedida que o destino lhe tornara. Só aquele sorriso doce com dentes desalinhados a fez se perder e se encontrar.

     Assim estava ela, a ponto de partir sem olhar para trás, apenas com sua mala. Mesmo perdendo o insípido tudo, se sentia ganhando o céu e as estrelas, com cobertura de brigadeiro. Fechava os olhos e conseguia sentir o sabor.