O arrependimento de um filho por não ouvir os conselhos do pai.

Juvenal era um próspero fazendeiro na região do Paraná. Tudo o que tinha fora obtido com muito esforço e trabalho. Aos quarenta anos, já possuía um grande patrimônio. 
Ele era um solteirão convicto, muito cobiçado pelas mulheres da região, e costumava ter vários relacionamentos que nunca duravam mais de três meses. Seu coração nunca havia conhecido o amor, até que um dia encontrou Regina.
Juvenal estava indo a uma consulta de rotina, na clínica de seu amigo, Dr. Rogério. Ao entrar no local, esbarrou em uma jovem e imediatamente se desculpou. Quando seus olhos se cruzaram, ele não conseguiu mais parar de pensar nela.
Parecia que o destino os havia colocado frente a frente, para que o seu coração fosse dominado por ela.
 — Rogério, esbarrei em uma moça que acabou de sair da sua sala, quem é ela?
— Juvenal, ela é minha paciente.
— Eu sei, mas me fale dela, onde mora, se está passando por alguma situação grave.
— Não posso falar sobre meus pacientes, mas posso dizer que ela é solteira.
Os olhos de Juvenal brilharam neste momento. Após a consulta, Dr. Rogério solicitou diversos exames e exigiu que desta vez fossem realizados.
Juvenal dirigiu-se à secretaria e, muito persuasivo, conseguiu obter o endereço comercial de Regina.
Dois dias depois, resolveu procurá-la ao saber que Regina trabalhava em uma loja de móveis planejados localizada em um shopping.
Com a desculpa de solicitar um orçamento para uma nova cozinha, deu detalhes de como queria o projeto e, assim, desenrolou uma boa conversa entre ambos.  Dois meses depois estavam namorando, e após seis meses já estavam casados.
O desejo de Juvenal era ser pai em breve, porém, foram necessários alguns anos para que fosse concretizado.  Regina precisou passar por vários tratamentos e, quando completaram três anos de casados, ela ficou grávida.
A gravidez não foi fácil, acompanhada de várias complicações;  na hora do parto, os médicos tiveram dificuldades em virar o bebê. O parto se prolongou por mais tempo do que o esperado, a placenta se descolou e Regina sofreu uma forte hemorragia que não foi controlada. Infelizmente, os médicos conseguiram salvar apenas o bebê.
Paulo nasceu forte e saudável, mas Juvenal não teve forças para comemorar o nascimento do filho, pois a dor da perda era maior e incontrolável.
Juvenal sabia que precisava ser forte para enfrentar a situação, pois o filho precisava muito dele. Com isso em mente, encontrou uma força muito grande para tocar a vida adiante e, mesmo com uma cicatriz aberta que nunca se fechou, com a ajuda dos criados, conseguiu criar seu filho.
Quanto mais Paulo crescia, mais ficava parecido com a mãe. Ele era uma criança muito alegre, inteligente, tinha tudo do bom e do melhor. Juvenal não economizava na educação do filho e o matriculou na melhor escola, pois queria prepará-lo para a vida.
Quando completou doze anos de idade, surgiram as primeiras reclamações e Juvenal foi chamado várias vezes na escola, já que Paulo frequentemente se envolvia em brigas com os colegas.
Apesar da vida atribulada, Juvenal sempre encontrou tempo para cuidar da educação do filho e procurava estar sempre por perto, conversando e o aconselhando a trilhar o caminho do bem.
                Para sensibilizar o garoto e despertá-lo para a vida, procurava mostrar o quanto ele era uma pessoa privilegiada. Sempre o levava consigo quando tinha alguma boa ação a fazer, como na época do Natal, quando doava brinquedos às crianças carentes. Com essa atitude, desejava mostrar ao filho que a maioria da população vivia com muito pouco, e que ele deveria ser grato a Deus por não passar por necessidades.
Aos dezoito anos, Paulo ganhou de presente de aniversário seu primeiro carro, momento em que sua independência foi decretada. A partir de então, começou a sair com mais frequência, voltando sempre de madrugada. Seu círculo de amizades aumentou significativamente, estando sempre rodeado de dezenas de amigos.
Juvenal não estava gostando do rumo que as coisas estavam tomando e chamou o filho para conversar:
— Paulo, você concorda com vida que está levando? Está acabando com a sua saúde.
— Pai, estou apenas curtindo a vida. De que vale ter tanto dinheiro se não puder aproveitar tudo que ele pode me oferecer?
— Filho, você acha que todas essas pessoas estariam ao seu lado se você fosse pobre? Eles são um bando de bajuladores que o abandonariam se o seu dinheiro acabasse.
— Que nada, pai, são pessoas que sempre estarão comigo, nunca me negaram nada.
Juvenal viu que, naquele momento, não seria capaz de fazer o filho mudar de opinião. Só queria que ele levasse uma vida mais regrada, que se cuidasse, afinal, mais cedo ou mais tarde, a vida poderia lhe dar uma lição.
Paulo não lhe deu ouvidos e continuou por vários anos levando uma vida de boêmio, sempre chegando de madrugada e dormindo praticamente o dia todo.
 
Até os trinta anos de idade, Paulo ainda não havia mudado de vida. O pai, já com idade avançada, continuava insistindo. Chamou--o e entregou-lhe uma Bíblia, já bastante desgastada pelo tempo, dizendo:
— Paulo, quero que fique com essa Bíblia. Ela pertenceu à sua mãe, e foi nela que encontrei forças para superar minha dor quando ela se foi.
— Pai, por que está me dando ela agora?
— Eu estou muito velho, não vou estar aqui para sempre e quero que você me prometa que, quando eu me for, fará tudo que peço agora.
— Pai, você ainda vai viver muitos anos! Não é necessário termos esta conversa agora.
— Paulo, quando eu me for, você herdará tudo isto. Será necessário ter muito juízo para não perder tudo que conquistamos. Se continuar rodeado por esses bajuladores, não conseguirá cuidar dos nossos bens.
— Pai, eles são meus amigos, sempre estarão por perto. Não vou desistir deles.
— Eu sei, você está cego. Entretanto, um dia seus olhos se abrirão e você perceberá o que venho tentando lhe mostrar. Se vier a perder tudo que temos e for abandonado por seus amigos, não tendo mais para onde ir, prometa que voltará para cá.
Neste momento, Paulo deu uma gargalhada e ironizou as palavras do pai, mas Juvenal o interrompeu e continuou falando:
— Você vai voltar para cá. Está vendo aquela cabana? Mandei construir para você e lá dentro há uma forca. Quando estiver desiludido com a vida, sem dinheiro algum, sem amigos e passando por grandes dificuldades, quero que coloque a corda no pescoço e se enforque.
Paulo ficou perplexo com o pedido inusitado do pai, e, sem saber o que falar naquele momento, prometeu que faria exatamente como ele pediu.
 
Juvenal faleceu três meses depois. Foi preparado um velório muito simples, com a presença de diversos amigos e de todos os seus empregados, sem exceção. 
Paulo estava extremamente triste, lembrando-se da última conversa que tiveram. Sabia que não havia levado o diálogo a sério, tendo pensado que seu pai estava delirando e havia perdido a razão, e que aqueles eram apenas conselhos de um velho.
Não deu muita importância e decidiu que iria embora daquele lugar, pelo menos por um tempo. Deixou os negócios nas mãos de uma Administradora e resolveu viajar pelo mundo. Conheceu vários países e não economizou seu dinheiro nos lugares que visitou, acreditando que sua fortuna jamais acabaria. Foi então que, certo dia, recebeu um e-mail da Administradora sobre a necessidade de uma conversa pessoalmente, afinal, os negócios não iam bem e seu retorno era necessário.
Assim que retornou à fazenda, Paulo notou que o lugar estava muito diferente. A grama estava alta, o jardim dominado pelas ervas daninhas, as paredes da casa descascadas, não restando dúvidas de que tudo estava abandonado.
Os empregados, antes fiéis ao seu pai, não demonstravam a mesma gratidão a ele e decidiram partir. A safra daquele ano havia sido totalmente perdida pela seca que assolava a região, o que fez o banco entrar com uma ação de execução devido à falta de pagamento dos empréstimos contraídos.
Paulo não acreditava na situação em que se encontrava, em como havia conseguido acabar com o patrimônio que seu pai havia construído ao longo dos anos.
Resolveu procurar pelos velhos amigos que, um a um, recusaram seu pedido de ajuda ao alegar que não tinham dinheiro, que já estavam comprometidos com investimentos a longo prazo, que haviam acabado de comprar algo e que até poderiam ter ajudado se Paulo tivesse aparecido antes. As desculpas foram as mais variadas possíveis e não havia ninguém disposto a ajudá-lo.
Ao ser abandonado por todos, Paulo mal tinha dinheiro para se alimentar e passou a levar uma vida miserável. Desconsolado, começou a lembrar do pai e da Bíblia que tinha recebido de presente. Encontrou-a e, ao folhear suas páginas, notou que algumas estavam marcadas. Depois de muitos anos, começou a ler a Bíblia novamente e, por coincidência, seus olhos pousaram em Lucas.
“Não muito tempo depois, o filho mais novo reuniu tudo o que tinha e foi para uma região distante; e lá desperdiçou os seus bens vivendo irresponsavelmente. Depois de ter gasto tudo, houve uma grande fome em toda aquela região, e ele começou a passar necessidade”.
Começou a refletir sobre o que havia lido e, ao se enxergar naquelas palavras, ficou por horas acordado enquanto refletia se aquilo era um aviso, até que caiu no sono.
Sonhou com a última conversa que teve com seu pai e no pedido que ele havia feito. Lembrou-se da sua promessa, acordou assustado e falou em voz alta:
— Pai, serei motivo de orgulho para você, terei coragem de cumprir com a minha palavra.
Após a execução dos bens, somente a velha cabana lhe sobrou. Ficou sentado por horas enquanto olhava em sua direção, até que arrastou-se em sua direção, ergueu os olhos para o céu e pediu perdão ao pai por ter sido tão tolo e irresponsável, afirmando que faria tudo diferente se tivesse uma segunda chance.
Subiu na cadeira que parecia estar à sua espera, posicionou o pescoço no laço da corda e a empurrou com os pés, sentindo seu pescoço apertar. Neste momento, ouviu um grande estalo. A madeira que sustentava a corda era oca e se partiu, caindo de dentro dela dólares, joias, diamantes e uma carta. Pegou a carta nas mãos, reconheceu imediatamente a letra de seu pai e, muito emocionado, começou a lê-la.
 
Paulo, se você está lendo esta carta, é porque tudo aquilo que comentei infelizmente aconteceu. Saiba que só quis alertá-lo e não quero neste momento lhe dizer que você foi avisado, pois a vida se encarregou de lhe mostrar o que você não queria enxergar.
Quero lhe dizer que te amo muito e que o seu abraço me faz uma grande falta. Ainda me lembro de você pequeno, dependente de mim, e de toda a felicidade que senti em vê-lo aprender a falar e descobrir o mundo.
Filho, você cresceu e, em algum momento, se esqueceu dos valores que tentei lhe ensinar, mas não há problema. Nunca é tarde para mudar.
Está é a segunda chance que a vida está lhe dando, quero que agora seja tudo diferente. Recomece com dignidade e com Deus em seu coração. Aproveite esta nova oportunidade e seja muito feliz.
Assinado: Seu pai.
 
Ao terminar a carta, seus olhos lacrimejaram e ele não conseguiu se conter, chorando copiosamente por alguns minutos.
Colocou a Bíblia junto ao seu coração e agradeceu novamente a Deus por dar tanta sabedoria ao seu pai que, mesmo sendo desprezado, nunca desistiu de recuperá-lo.
Calbertosantos
Enviado por Calbertosantos em 31/08/2015
Reeditado em 28/01/2018
Código do texto: T5366263
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