O mentiroso

Lembro-me do dia em que conheci o Elgrat como se fosse hoje. Era um menino calado e que acabara de se mudar para o nosso bairro. Avistei-o sentado na calçada, pensativo, apoiando a cabeça nas mãozinhas, com camisa xadrez e as canelas de fora. De quando em quando, acabrunhado, suspirava.

Perto dali encontrava-se um grupo de garotos jogando uma pelada; não muitos, talvez quatro ou cinco. Foi quando eu, após me desvencilhar de um ciclista barbeiro, disse-lhe:

- Vá jogar bola garoto, está tudo bem.

- Está tudo bem? - perguntou ele, com espanto.

- Sim.

- Tudo?

- Tudo.

Seus olhos brilharam como o sol do meio-dia e um sorriso estendeu-se sobre o seu rostinho como uma cortina sobre uma janela. Ali, então, eu entendi o quanto a minha resposta era de fato egoísta e que, sem a intenção, havia-o enganado. O ingênuo, de súbito, levantou-se com os olhos lacrimejantes e pôs-se a correr até a sua casa para noticiar à sua mãe que tudo estava bem e que todos os problemas do mundo haviam sido finalmente resolvidos.

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