Como lidar?

Como explicar para um garoto de catorze anos que não era amor?

Eu não sei. Até agora estou procurando uma forma de dizer isso a ele. Mas não é legal ver um moleque tão novo, jogado no sofá, chorando as pitangas porque a Sofia preferiu o Pedro a ele, só por ele ser da equipe de natação da escola e ter os olhos azuis. Como eu posso falar para esse garoto que corpo sarado e olhos bonitos não dizem nada?

Realmente não posso. Já tive catorze anos um dia e parti alguns corações por aí por querer namorar um garoto com cara de índio. Certamente esse não seria meu argumento mais eficaz.

Ele me mostrou a foto da tal menina e, sinceramente eu nem achei “grandes coisas”. Mas com certeza ela tinha alguma coisa que chamava a atenção dele. O Menino Desiludido falou de todas as coisas que fez pela Menina Destruidora de Corações, como carregar a mochila, comprar o doce preferido, levar até à porta de casa, com olhar tão triste que me deu pena. Não podia recriminar, pois já fui sonhadora assim um dia. Já fui apaixonadamente boboca por uns quinze garotos da minha escola, durante meus anos letivos. Vi um pedaço meu ali.

Tentei convencê-lo a ir ao Mc Donalds comigo, mas ele recusou.

Propus uma partida de videogame violento (que, modéstia à parte, sou muito boa neles), mas ele negou com a cabeça.

Ele não precisava de COISAS naquele momento. Ele queria respostas, discursos, papo cabeça.

Eu não sou a pessoa mais apropriada para aconselhar um pirralho, pois não tenho filho. Estou guardando meu estoque de sermões para quando o Daniel, a Mariana, o Felipe, o Rafael ou a Lívia (meus sobrinhos) precisarem. Mas eu raramente recuso um pedido de uma amiga. Ainda mais quando essa é mãe do Menino Largado Às Traças.

Pensei em começar com um “meu jovem”, mas ia parecer que eu tenho oitenta anos, quando eu tenho apenas vinte e oito. Até cogitei um “qual é, parceiro”, mas seria ridículo para minha idade. E se eu viesse com aquela ladainha de “quando eu tinha a sua idade”, eu iria fazer o garoto dormir. Então escolhi uma metáfora, coisa que eu domino muito bem.

- Lucas, lembra daquele tênis Mizuno Wave que você comprou há tempos e gastou um dinheirão? Aquele que na propaganda diziam que era super confortável?

- Claro que lembro. – ele respondeu.

- E lembra também que ele te machucou tanto que você foi à loja devolver e trocou por outro mais confortável? – perguntei.

- Claro, tia. Realmente aquele tênis acabou com meu pé. – ele disse.

- Então, amor é isso: quando começa a machucar, o melhor que temos a fazer é desistir dele e escolher outro.

Lucas se ajeitou no sofá e imaginei que ele me xingou em pensamento, mas não.

- Então quer dizer que eu sou o tênis apertado da Sofia?

Eu ri.

- Não, Lu. O tênis nessa história é ela.

Confesso, a analogia foi esquisita, mas de alguma coisa serviu.

Pelo menos ele saiu do sofá e foi preparar um sanduba.

ARYANE SILVA
Enviado por ARYANE SILVA em 22/04/2014
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