P A S S A G E I R O S IV

E N C U R R A L A D O S

O carro continua seguindo rumo ao “mundo” assim por dizer. Em breve, as pessoas estarão diante de outra realidade e sinceramente... Essa ideia tem mexido comigo. Não tenho certeza se elas estão preparadas para isso. Bem, sei que... Preparadas ou não, terão que lhe dar com essa nova realidade. Força e União! Talvez seja essa a fórmula capaz de nos salvar do que está por vir se é que existe alguma esperança. A voz de Maria está meio distante e ela está tagarelando sem parar num ritmo frenético. Efeito colateral da adrenalina que acabamos de passar lá atrás quando os oficiais vieram para nos matar. Penso! Pelo semblante dela percebo que o que está dizendo é muito sério, porém, o carro está a mais de 100 km p/h e o vento está entrando e abafando seu timbre, deixando-o distante. A avenida principal está congestionada. O carro está parando. Posso ouvir o que ela está dizendo agora. Está falando algo sobre Jhon. Estou confuso. Jhon? Será? Mas, não pode ser possível! Estou duvidando mais uma vez do meu sentido. Preciso entender que a partir do que se passou desde que entrei naquele avião tudo é possível agora. Sim. Eu ouvi o nome do Jhon e agora que tenho certeza posso vê-lo correndo para a coluna de beliches tentando se esconder. Mas, não é para qualquer coluna. É para a coluna onde está a minha cama. Ele está se enfiando em baixo dela enquanto os guardas disparam alguns tiros em gente inocente. Uma mulher está gritando seu nome e não demora muito até que ela tomba para o chão com uma bala em seu crânio. Jhon finalmente saiu de onde estava escondido. Espere! Ele está sujo de terra? Sim! Meu Deus, os guardas irão perceber o que ele estava tentando fazer e então meu plano irá por água a baixo. Como ele sabia? A resposta está de novo em Brendon e Maria. Claro. Jhon era a terceira pessoa de quem o Brendon mais se aproximava. Meu coração está disparado e quando o carro para por completo eu os questiono.

_O Jhon fazia parte da sociedade. – Sou direto. –Estou certo? –Completo. Sinto que minhas palavras saíram esganiçadas de mais e eles estão me encarando agora.

_Sim. –Maria responde rapidamente sem rodeios. –Aquele desgraçado traidor fazia parte da UFOLSECRETS. –Completa num tom de fúria.

_Traidor? –Pergunto.

_Exatamente. –Brendon está falando agora. –Acreditamos que ele tenha entregado nossa localização.

_Como? –Não posso acreditar nas palavras de Brendon. –Ele não poderia. –Digo. –Ele está...

_Morto? –Maria me toma a palavra.

_Sim. –Confirmo.

_Está enganado. –Diz Brendon. –Todos nós nos enganamos.

_O quê?¬–Estou perdido.

_Os corpos que recolhiam. –Brendon me encara. –Todos vivos! –Completa. –Continuam presos. – Não pode ser. Tudo está rodando. –Ratos de laboratório. –Continua ele. –Estavam apenas tentando amedrontar vocês, aos que continuavam na cúpula, fazendo-os acreditar que os outros estariam mortos. Mas... Não. Apenas eram recolhidos e levados à outra sala.

_Por quê? –Deixo escapar o horror?

_Controle. –Responde Marcos.

_E então... –Retomo! –Acreditam que o Jhon tenha nos entregado?

_É certo que sim. –Diz Brendon. –Não há outra explicação. Retiramos os microchips que estavam instalados em seus corpos.

_Mas... Por qual motivo ele faria isso? –Pergunto.

_Poder. Vingança... –Brendon não espera por outra pergunta minha. Meu semblante deve estar carregado de dúvidas e por isso ele continua poupando-me do esforço de articular. – Jhon sabia do plano de fuga, mas, ele queria vender informações para a NASA, então, Maria e eu, decidimos que ele precisava “morrer” - Ele está franzindo o cenho. –O Jhon sabia que seria levado e simulou uma fuga, restava apenas esperar pelos guardas e depois pela equipe de limpeza, assim, poderia ficar longe dos nossos olhos noutra sala e se aliar a eles.

_Você fazia parte da limpeza. Como não notou o que acontecia? –Questiono Brendon.

_Ele estava preocupado em salvar nossa pele caso você tenha se esquecido. –Maria está me fuzilando com os olhos.

Gostaria de rebatê-la e ouvir mais, mas, não há tempo. Isaac está apontando para dois carros atrás do nosso. São suspeitos. Precisamos sair de onde estamos e Marcos parece já ter uma estratégia. Temos algum espaço entre os outros carros e seguimos até tomarmos a lateral esquerda da pista. Estamos contornando para fora da avenida.

_Podemos avançar mais depressa pela BR. - Diz Marcos.

_Não acho que seja uma boa ideia. –Esse timbre eu ainda não tinha ouvido. É de uma garota esguia. Ruiva e com algumas sardas na maçã do rosto. Ela está ao lado de Isaac. É sua neta. Suponho. Certamente que é. Percebo a semelhança melhor agora. –Eles nos pegarão desprotegidos. –Continua ela.

_Não temos por onde correr aqui na avenida, já estamos desprotegidos. –Retruca Marcos,

_Não precisamos correr. –Ela é rápida. –Eles não seriam idiotas de nos atacar publicamente.

_A garota tem razão. –Jéssica está falando pela primeira vez agora desde que escapamos dos oficiais.

_Eles darão um jeito e nos pegarão na primeira oportunidade. Precisamos sair daqui e surpreendê-los. –Insiste ele.

_Surpreendê-los! – A garota não contém o esnobismo.

_Exatamente!

Marcos se apressa e puxa o porta luvas para baixo expondo as armas que estão lá dentro. Mal tenho tempo de processar a imagem das armas e Brendon e Maria já estão tomando-as para si e distribuindo. A garota ruiva aceita a oferta. Estou olhando para ela com olhar de reprovação, depois, devolvo a Maria o mesmo olhar de fúria com o qual costuma me encarar. Mais uma vez ela está colocando em risco a vida de um inocente. Não quero que a garota se machuque, então, volto a encará-la. Preciso protegê-la!

_Você não precisa...

_Aposto que atiro melhor que você. –Ela responde antes que eu possa completar. –Não posso retruca-la. Talvez, não seja tão indefesa quanto penso, mesmo assim, toma a arma de sua mão.

_Aposto que sim. –Digo. –Mas, de qualquer forma. –Respiro fundo. –Eu estou na janela.

Ela torce o bico e não diz mais nada. Estamos pegando a BR para fora da cidade. Espero que a garota não esteja certa. Mas, de qualquer forma, há de ter outros carros próximos ao nosso na BR, pouco menos do que teríamos na avenida principal dentro da cidade, mas, pelo menos teremos alguma companhia e isso poderá intimidá-los. Eles não irão atacar. Estou mentalizando. Repito, eles não irão atacar. Eles não irão...

O impacto da batida me faz morder a língua e sinto o sangue se espalhar dentro da boca. Preparo-me para outra batida quando ouço Brendon gritar que eles estão vindo e que é hora de usar as armas. Marcos enterra o pé no acelerador e não sei se estou com medo de ser pego pelos oficiais ou de tombar pelo desfiladeiro. Os dois carros estão em nosso encalço. Um deles consegue se colocar do nosso lado e está vindo com tudo para cima de nós. Ele quer nos mandar para baixo. O outro carro já se prepara para nos aparar e completar a ação. Então, o primeiro deles está vindo com tudo que tem para cima. Brendon dispara alguns tiros no pneu, vejo-o rodar, mas, ele continua vindo para nós. Marcos aciona ao freio rapidamente e estou sendo jogado para frente. Minha testa encontra uma estrutura sólida e sinto um corte se abrir. Tem sangue no meu olho direito e ele está ardendo agora, mas, ainda poço ver o que acontece. O carro passou direto e está quase despencando, falta apenas um empurrãozinho. Maria parece ter percebido e agora ela está disparando tiros também para o outro carro que se aproxima. Marcos se aproveita do rodopio e avança para ele fazendo-o capotar rumo ao outro, porém, ainda não despencaram. Estamos parados observando, torcendo para que tenha sido suficiente. Não! Eles estão tentando forçar uma das portas a se abrir. Se conseguirem sair estaremos perdidos. Brendon aponta para o vazamento de óleo em um dos carros. Ele está tentando mirar, mas, seu ângulo é ruim. Maria também fracassa. Eu sou o único que tem um melhor ângulo. Eles estão gritando para que eu dispare. Estou nervoso. Não consigo mirar. Minhas mãos tremem e eu perco a arma. Um oficial consegue sair. Ele está tentando puxar os outros para fora. Se eu não disparar vamos morrer agora. Estou procurando a arma, mas, ela não está mais ali. Onde está? Procuro e então vejo a garota disparar seu tiro. Tudo fora rápido demais. A explosão está vindo para nós. O tiro fora certeiro. Ela tinha razão. Sua pontaria era mesmo melhor que a minha. O fogo está vindo. Não podemos ficar parados. Além do mais, não sabemos se eram mesmo apenas dois carros nos seguindo. Novamente Marcos está enterrando o pé no acelerador. Tento me concentrar no horizonte, meu olho ainda está ardendo pelo sangue, há um pássaro surgindo ao fim dele. Um pássaro? Espreito mais aquela forma. Semicerro os olhos e vejo que algo está errado. Percebo rapidamente. Tenho pouco tempo para alertar aos outros e me preparar para o impacto.

Quando surgiu em meu campo de visão tive medo e preferi duvidar, mas, não, era mesmo um daqueles aviões que vira distribuir tiros quando a cúpula abriu e os prisioneiros começaram a ser abatidos. Estou com tanto medo agora! Mais ainda do que estava quando duvidei do pássaro que se aproximava do nosso carro. Ele está vindo. Rápido! Não sei onde eu estava no momento exato em que ele apareceu. Com medo, certamente. Os outros parecem estar apavorados também, mesmo assim, Marcos não tira a atenção do volante. Há um silêncio excessivo e posso ouvir a respiração ofegante de cada um deles. Maria está em um dos bancos da frente. Jéssica está ao seu lado e ela deveria nos guiar até ao jornal. Ela devia ter se mantido firme a opinião da garoa ruiva; Estaríamos a salvo, mas, não é tempo para lamentar e nem culpa-la, nossa preocupação agora é a de nos livrar daquele caça. Nos livrar! Que ironia, novamente a garota tem razão no que havia dito. Estamos em uma rodovia distante das ruas principais da cidade e isso permite que sejamos alcançados com mais precisão caso seja disparado um míssil. Eu não deveria ter pensado nisso. Meu pensamento acaba de atrair o maldito míssil. O silêncio é quebrado por Brendon gritando novamente para seguirmos para o precipício. Dejaví é a impressão que tenho agora, mas, não tenho tempo para recordar mais uma vez a fuga da cúpula, aliás, eu não quero mais repensar sobre isso já que não tenho tido outra escolha nos últimos dias que não seja essa. Estamos caindo. Rápido. Isaac está vociferando rapidamente para que mantenhamos a calma quando a água começar a entrar. Não quero morrer afogado. Não quero morrer! Estou pensando em tudo que passei desde que escapei da maldita cúpula, logo, estou pensando nela involuntariamente, mas que grande merda! O impacto do carro alcançando o mar chacoalha minha mente. A água está entrando pela janela e levando o carro para o fundo. Se eu não sair logo ela começará a entrar em meus pulmões também. Removo o cinto de segurança que estava a me prender e parto para a janela. Tem alguém puxando meu pé, mas eu consigo me livrar. Sinto uma dificuldade enorme para imergir. Merda! A perna! Só agora me dou conta da perna enfaixada de novo. Tenho que bloquear a dor, registro em meu cérebro e processo a mensagem. Feito! Estou imergindo e sinto que posso respirar agora.

_Rápido. Para a margem. Todos! –Esta é a voz inconfundível de Maria. Eu procuro o motivo pelo qual ela está gritando daquela maneira e quando o encontro desejo não tê-lo encontrado. O caça! Está contornando. –Vamos! –Repete Ela.

Eu estou nadando rápido com todas as forças que tenho, ignorando as pontadas fortes de dores na perna, rumo à margem. Jéssica está implorando por socorro. Não sei se consigo ajuda-la, mas, ela está afundando. Preciso chegar a ela. Consigo alcançá-la. O que faço agora? Mal tenho força para me levar à margem. Se ela não se acalmar morreremos os dois. Não vejo outra forma, ela não se acalma, então, estou lhe desferindo um soco no meio da testa. Ela está inconsciente agora, posso carregá-la. Espere! Alguém mais está se afogando. Os gritos de agonia ecoam em minha cabeça e estão partindo meu crânio. Isaac está pedindo para que eu a salve. É ela. Sua neta. A menina de boa mira. Ele sempre a protegeu. Morrerá sem eu ao menos saber seu nome. Talvez eu consiga voltar! Penso! Onde está Marcos? Brendon? Talvez eu seja rápido o bastante. Não o caça está perto, só posso carregar uma. Maria grita para que eu leve Jéssica se eu quiser minha família viva. Eu obedeço. Sigo lamentando enquanto os gritos desaparecem e a menina afunda.

Não acabou ainda. Pensei que estaria livre por pelo cinco minutos ou até recuperar o fôlego. A praia está cercada de oficiais. Eles estão armados. Não há como fugir. Eles já estão sobre nós, nos algemando. Eu poderia encará-los, mas, estou observando outra coisa. Fixo num ponto. Há um caça sobre as águas. Ele lançou uma rede sobre o mar e a está puxando agora. Eu rio com a imagem que vejo. A imagem da garota suspensa no ar é reconfortante. Não sei por que, mas, me vem à cabeça a imagem de um anjo. Meu coração está calmo. Sem nenhuma palavra eu apenas olho para Isaac. Seu olhar está fixo nela também, demora pouco tempo até que ele note o meu sobre ele e entende o que quero saber.

_É Melanie...

Esse é o nome dela. Seu corpo não se movimenta, mas, desejo de todo coração que ainda esteja viva. É o último pensamento que tenho. Tudo volta a ficar escuro... De novo!

Héryton Machado Barbosa
Enviado por Héryton Machado Barbosa em 25/04/2014
Reeditado em 01/05/2014
Código do texto: T4781825
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