Roubando rosas...

ROUBANDO ROSAS...

O relógio Champion marcava pouco mais de meia-noite, a rua Virgilio calada como sempre depois da volta pra casa da turma que estudava a noite... Mas era quinta-feira... Noite de roubar rosa pra levar para as meninas que a gente paquerava...

Eu estava no Cachorro-quente com o Orsi e o Peva, esperando o Fabiano Japonês e o Fabrício dentro do fusca do Orsi ouvindo “Another Day in Paradise” do Phil Collins e falando que aquele ano Senna seria bi-mundial de F-1, falando do filme Ghost.... Tempos bons... 1990...

Eis que os dois chegaram com suas RD 135 e pronto, vamos roubar rosa!

Roubar rosas era simples. Casas com um jardim acessível com uma roseira, uma boa tesoura, muito silêncio e pronto!

Como éramos seis rapazes, fomos no meu Opalão. O Peva na frente com a tesoura e a lista de casas que durante o dia já tinham sido “cadastradas” como as fornecedoras. Fazia frio, todo mundo de tênis tipo corrida, calça bag e cacharrel ou aquelas jaquetas com forro de imitação de pele, moda na época.

A música continuava internacional, “What it takes”, Aerosmisth, lançamento!

Chegamos na primeira casa, próxima do antigo Asilo. Estilo antigo, apenas uma mureta baixa e um portãozinho de entrada lateral. O jardim gramado diante da janela exibia linda roseira entre outras plantas. A gente já chegava com o embalo do carro um pouco adiante, motor desligado, som desligado, calados...

O Peva desceu, silêncio mortal na rua. Tirou o par de tênis novo pra não sujar e colocou sobre a mureta. Pulou. Caminhou até a roseira e na hora que foi dar o “tec”, a janela abriu e a senhora que morava sozinha na casa abriu a janela e gritou: - Peguei você!

O Peva pulou de volta rasgando e entrou pelo vidro aberto da janela do carro, eu já tinha ligado o carro e saí cantando pneu que nem maluco! E cinco segundos depois quem gritava era o Peva!

- Para! Para!

Taquei o pé no freio e todo mundo espantado perguntou:

- O que foi, maluco! Você tá doido, a mulher tá furiosa!

E o Peva responde com a voz entre desânimo e risos...

- Deixei meu tênis na mureta da mulher!

Aquele segundo de desespero no carro até todo mundo explodir de gargalhada!

Voltamos lá... Fazer o que... kkk

Mesmo esquema, motor do carro desligado e todos quietos. Tudo apagado. Nada do tênis. Descemos todos do carro e começamos a conversar baixinho sobre a situação e eis que a senhora acende a luz e abre a janela. Aquele calafrio em todo mundo... Mas como todo mundo era educado, fomos logo dando boa noite e ela respondeu em tom de voz até que razoável:

- Boa noite, senhores! Procurando algo?

- Meu tênis, dona...

- Então são vocês que estragam minha roseira? Que coisa feia...

- A rosa é pra levar pra namorada. Disse um de nós...

- Só que vocês arrebentam tudo com a minha roseira. Cadê a tesoura? Vou ensinar vocês a cortarem certinho pra não estragar o galho e a poda ser certa. Venham aqui.

Ficamos um olhando um para a cara do outro e o Fabiano e eu que somos mais despachados fomos com o Peva entrando lá, atrás da senhora. O Orsi foi buscar a tesoura no carro. Então ela nos ensinou que tinha um jeito certo de cortar pra “não ferir” a roseira e nos deu não só aquela rosa, mas outra que ela tinha colhido durante o dia. E devolveu o tênis do Peva.

A gente entrou de volta no carro com as rosas e ficou uns instantes um olhando para a cara do outro. Não liguei mais o som aquela noite, mas levamos as rosas para as moças com os bilhetes escritos em papel de guardanapo de lanchonete e caneta Sylvapen. Escrevendo nesses papéis que eu peguei gosto por escrever poemas...

Bons tempos... Onde se podia fazer coisas por amor e envolver pessoas...

Sandro La Luna 28/02/2017

Sandro La Luna
Enviado por Sandro La Luna em 26/02/2017
Reeditado em 26/02/2017
Código do texto: T5924686
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