RESILIÊNCIA
Guida Linhares

O nome dele irei manter em sigilo. A sua aparência se assemelha ao homem da foto. Internado no hospital desde janeiro deste ano, por complicações da pleura adquiridas através de duas bactérias sendo uma resistente aos antibióticos, tendo passado por quatro cirurgias, seu estado de saúde inspira os cuidados de uma equipe de médicos.
Quando o conheci há um mês atrás, nã
o imaginava o seu quadro e nem perguntei como de praxe, deixando que ele num dia qualquer me contasse, porque estava há tanto tempo internado.
Era meu primeiro dia de voluntariado e ja havia visitado várias alas em companhia das veteranas. Depois sozinha comecei a percorrer os corredores e numa das alas em que comecei a entrar nos quartos para as palavras de apoio, eu o encontrei.
Sereno, tranquilo, sentado numa poltrona, com um livro na mão.
Cumprimentei, ele levantou-se e me ofereceu o lugar e então perguntei se estava gostando da leitura e o nome do livro.
A grande síntese de Pietro Ubaldi, ele disse e logo abriu numa página e começou a ler um trecho, que ouvi com muita atenção e começamos ali um debate sobre as questões existenciais, e pude perceber nele um espírito avançado e iluminado e digo porquê:
- aprendi na Psicologia sobre resiliência que é uma propriedade da física aplicada aos seres humanos que sofrem perdas, e/ou violências, e/ou sofrimento e conseguem retornar ao ponto inícial em que estavam antes do trauma. E ele se tornou um exemplo vivo desta faculdade, quando me contou o seu drama.
O que quero passar com este relato, é a observação de que as reações de uma pessoa diante de seus problemas, vão ajudar muito na sua resolução.
Todas as semanas quando o encontro, mostra um semblante radiante e muita paz. Outros livros já foram lidos e comentados e hoje vou levar a ele alguns livros meus para que possamos prosseguir nas reflexões sobre os mistérios da vida.
De onde vim, para onde vou, quem eu sou e o que faço aqui são perguntas que me perseguem desde muito nova e são também os questionamentos deste novo amigo, o que me faz pensar que nada acontece por acaso.
Quando perguntei a ele como conseguia ser tão calmo diante de si mesmo ele respondeu:
- Não se pode focar o problema. Temos de pensar numa solução e deixarmos que o tempo se encarregue dele. Enquanto isso aproveitamos para fazer outras coisas, que talvez antes o cotidiano não nos deixasse. Agora estou num tempo de pesquisa, num tempo de conhecimento, embora o local seja um hospital, porém estamos onde o coração nos situa. São os desígnios do homem, um grande mistério para o próprio ser humano.

Santos/SP/Brasil
05/10/12


Foto de Daniel Korzeniewski

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