A AGONIA DE UM PÁSSARO

Numa árvore de galhos espaçados e tortuosos, um pássaro inquieto cantava de um jeito sofrido e solitário.

Aos pés da mesma árvore, um outro pássaro desfigurado de corpo inerte me fez encontrar a causa de tamanha inquietação do pobre pássaro de canto triste.

Percebi que aquele momento de agonia atravessava-lhe o peito. Se ao menos me fosse possível ampará-lo... apenas seguia-o com os olhos e acompanhei sua angustia ao aproximar-se do companheiro, que sem vida no chão, tinha as leves e rubras penas desfeitas e envolvidas numa terra escura com gravetos e folhas secas.

O pássaro inconformado tentava levantá-lo com o bico por vezes seguidas. Seu canto era de pura agonia. Afastava como se fosse buscar ajuda e pousava em volta do pássaro sem vida.

Quando de repente, o pássaro se afastou e foi parar em um dos galhos mais altos. Só então compreendi que havia filhotes no ninho e que entre uma busca e outra de alimento para saciar a fome dos filhotes, o companheiro saiu e por alguma infelicidade não retornou.

Recolhi o corpinho do pássaro e o envolvi numa folha, tentando diminuir a sensação de desconforto que emoldurava aquele cenário. Comecei a caminhar pensando que esta lei da sobrevivência às vezes é aprendizado bastante amargo, mas era natural.

Bastou alguns passos para que mudasse de ideia: um estilingue roubou brutalmente meus pensamentos e o conformismo deu lugar a indignação.

Nada pode ser mais covarde do que a insensatez do ser humano, quando faz do sofrimento dos animais um prova concreta da ausência de sensibilidade .

... e aquele canto triste se distanciava dos meus ouvidos, mas acompanhava-me o tormento...