Hamsterfobia

Minha hamster é como nós.

Eu tenho um hamster. Na verdade, é uma hamster. Fêmea, ao menos foi o que me disseram quando eu comprei minha companheira por ínfimos 20 reais. Uma mulher velha e gorda me trouxe a dentuça chinesinha que eu, sem nem sequer ter autorização, nomeei de Eva.

Fazia dias (quiçá semanas) que eu não limpava seu aquário. Ela vivia lá, na sua serragem imunda, com seu túnel imundo e sua casinha pequena e escura. Sua água estava podre, parecia ter vindo direto de Mariana para o seu pote. O bichano, por vez, quase nunca desfrutava de tudo aquilo.

Mesmo tendo pouco espaço pra se divertir, preferia limitar-se ainda mais a sua pequena casa. Lá, pouco se movia, pouco se via, pouco se vivia. Eu, nada fazia. Aliás, quem sou eu pra me intrometer na vida do roedor?

Um dia, ao passar pelo meu quarto, me deparei com a mísera situação que ela vivia. Estava encardida. Peguei seu lar e juntamente a ela, fui limpá-la.

Depois de fazer todo aquele processo monótono (e nojento para alguns), coloquei-a de volta à origem. Estava assustada, estava perturbada. Se movia velozmente, como se algo de terrível a tivesse acontecido. Preocupado, coloquei a mão para pegá-la, e quem sabe, assim conseguir entender o problema.

Ai! Ela me mordeu. E não foi como sempre, foi diferente dessa vez. O que apertou no meu dedo, não foi somente seus pequenos dentes, mas sim, todo o seu ódio e cólera guardado após dias e dias trancada na sua casa.

Dificilmente, depois de tanto ser mordido, peguei o demônio e segurei carinhosamente na palma de minha mão. O bicho estava mais assustado do que eu. Estava com medo, era como se depois de tantos dias vendo a mesma coisa, fosse introduzido a um mundo totalmente contraditório.

Suas verdades se revelaram mentiras. Seus aprendizados de nada serviam. Pacientemente, esperei o bicho se acalmar para coloca-la de volta na caverna. Depois de minutos e minutos de sofrimento interno, a companheira de Adão se acalmou. Coloquei vagarosamente de volta. Ao entrar, ela correu para sua casa.

Fico triste pra falar a verdade. A hamster, ao entrar em contato com o diferente, se escondeu, evitou, preferiu viver dentro da sua bolha. Se ela soubesse que o mundo aqui fora não é tão diferente com o dela...

Decidi agir: Tirei sua casinha. Ela correu, se esperneou, tentou se esconder em todos os lugares. Ela ficou fragilizada, presa em sua própria liberdade. Foi difícil, mas ao sair, percebeu que vendo o mundo real com os próprios olhos a vida é mais prazerosa.

Talvez nós deveríamos fazer igual. Já tirou sua bolha hoje?