Fake

- Não, você não está sabendo ser livre.

- Não? Por quê, não?

- Joga essa bandeira no chão. Queime essa bandeira!

- Jamais!

- Está vendo? É justamente essa veneração que te aprisiona.

Cheguei em casa e fiz algumas anotações sobre a conversa que tive com um jovem que se dizia revolucionário, mas que carregava bandeiras antigas e cantava músicas ultrapassadas. Preparei a aula do dia seguinte e pus uma observação para que me lembrasse de falar sobre essa conversa antes de começar a aula. Jantei e fui dormir.

- Bom dia.

- Bom dia!

- Antes de começar a aula gostaria de compartilhar com vocês sobre um ocorrido entre mim e um jovem revolucionário, na rua do canal, no downtown.

- O senhor e suas histórias…

- Sim, mas essa é bem ilustrativa…

Depois que contei o ocorrido e depois de algumas gargalhadas dei sequência à aula. Estávamos falando sobre o existencialismo do pós-guerra, mas comecei introduzindo Kierkegaard. Almocei no refeitório do college. Conversei com Arthur e tirei algumas dúvidas sobre as eleições e a party. Participei de uma reunião com o director, tinha algumas propostas de trip para mim. Aceitei uma para Netherlands e recusei a de Cuba. Meu ano sabático se aproximava e precisava de elementos nórdicos para meu book. Em casa dei comida para o dog. Preparei uma comida congelada e cochilei na poltrona. Entrei no google maps e viajei virtualmente nas ruas de Netherlands. Fui dormir de madrugada, mas acordei num salto ao ouvir gritos do lado de fora. Fui até a janela e olhei lá fora. Uma turba com bandeiras e alguma coisa que queimava. De relance percebi uma sombra escorada na parede de minha casa e próxima à janela. Era o jovem revolucionário que pichava minha parede. Um deles que carregava alguma coisa com fogo gritou e o pichador deu um salto, pulou o muro e saíram correndo desaparecendo na escuridão das ruas de iluminação marrom. Fui até lá fora e vi que o jovem que lutava por liberdade pichara: ABAIXO OS FASCISTAS!

- Ah, sei! E é você que vai me ensinar ser livre?

- Não, meu caro, eu não, mas essa viagem você terá que fazer sozinho, entende? Sem bandeiras, sem instituições e, principalmente, sem violência contra a liberdade do outro.

- Fascista! Fascista!

Resolvi me retirar, pois até mesmo as definições mais básicas se tornaram fakes.

Rodiney da Silva
Enviado por Rodiney da Silva em 23/06/2017
Código do texto: T6035620
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