Chester

O garoto puxou o pai pela jaqueta ao ver o parquinho deserto.

- Pai, não tem ninguém. Não podíamos jogar uma bolinha antes de ir pra casa?

O pai parou e olhou ao redor. Não havia ninguém à vista na rua do subúrbio de classe média alta, com suas casas brancas e gramados verdes bem aparados. Era uma tarde de domingo, alto verão, e provavelmente a maioria dos residentes estaria na praia. Ou na Europa.

- É perigoso, filho. Leia o que está escrito na placa.

A placa, afixada na tela de arame que cercava o parquinho, dizia, em inglês e africâner: "OS EQUIPAMENTOS DESTA ÁREA DE LAZER SÃO RESERVADOS PARA USO DAS CRIANÇAS MEMBROS DO GRUPO BRANCO. NÃO É PERMITIDA A ENTRADA DE CÃES".

- Não podemos entrar? - A voz do garoto era pura decepção.

- Não, filho. Só estamos neste bairro porque é onde eu trabalho. E é bom irmos andando, antes que algum policial passe e nos pergunte porque estamos parados aqui.

- Está bem - conformou-se.

Seguiram caminho, rumo ao ponto do ônibus. O garoto novamente voltou-se para o pai.

- Pai, eu quero jogar no Springbok quando crescer... como o Tobias.

O pai balançou a cabeça, sorriso triste no rosto.

- O Springbok é um time de brancos, filho. Sim, o Tobias jogou com eles... o primeiro jogador negro da história a ser admitido na equipe... mas isso não muda nada, essa é que a verdade. Negros não torcem para o Springbok.

- Mas pai... se o Tobias ficar um bom tempo lá... e ganhar várias partidas... quem sabe os negros também não comecem a torcer pelo Springbok?

O pai balançou novamente a cabeça, negativamente.

- Não creio, filho. Muita coisa teria que mudar para que os negros torcessem pelo time nacional dos brancos. Mas você pode ser um grande jogador de rúgbi... talvez até mesmo jogar na Europa... mas aqui, terá que se limitar aos times de negros.

O garoto não se deu por vencido.

- Pai... vou te dizer uma coisa... eu vou ser mais famoso do que o Tobias. E vou jogar no Springbok!

O pai riu.

- Quanta determinação, Chester! Espero estar vivo para ver isso!

Chegaram ao ponto de ônibus, bem a tempo de ver o coletivo entrando na rua onde estavam. O pai fez sinal, e antes que o veículo parasse, ainda comentou:

- Se Mandela fosse libertado... puxa, poderíamos realmente acreditar em mudança nesse país!

- [19-08-2017]