Abduzido






O vilarejo estava numa agitação como se tivessem jogado um vespeiro no centro da sua única pracinha. A reduzida população que ali morava estava às voltas com a presença de um novo personagem que tinha chegado não se sabe de onde e nem por onde.Um belo rapaz de tez alabastrina, olhos amendoados, cabelo mais negro que a mais escura das noites,voz melíflua,andar solitário e respostas vagas .Havia cinco dias que se escontrava naquele pacato vilarejo e nem dona Zica a dona da pensão onde ele tinha alugado um quarto,para pagar no dia da sua saída, nem o padre Altino que além de padre era o conselheiro de todos, nem dona Filó a professora mais antiga já aposentada por livre e espontânea vontade, nem seu Álvaro o pai da lunática Esmeralda que vivia a olhar o céu, sorrindo e conversando sozinha, ninguém, absolutamente ninguém tinha conseguido saber de onde ele tinha vindo e em qual tipo de transporte.

Não tinha chegado pela ferrovia,nem pela marinete, nem de montaria, afirmava dona Mariquinha a vendedora de mingau que percorria,a pé, todo o vilarejo, diariamente ,com um tabuleiro contendo um caldeirão com mingau, copos bem lavados e canela em pó, acomodado sobre uma rodilha no topo da cabeça.Ela se incumbia de fazer com que as notícias não criassem mofo ou teia de aranha em um só lugar e saía,com a sua língua afiada, a espalhá-las daqui pra lá e pra acolá.

Naquele dia de domingo, após a missa, as mulheres aos magotes resolveram descobrir alguma coisa daquele misterioso moço. Rumaram para a pensão da dona Zica no intuito de obterem ajuda da mesma. Alí,foram bem recebidas e atendidas pela dona da pensão que se dizia religiosa fervorosa mas não gostava de missa por ser coisa de beata. O que mais dona Zica queria era saber quem era o seu hóspede. Após um breve diálogo, surrupiou a chave do quarto do mancebo, que estava dependurada no quadro por detrás do balcão,o que indicava a ausência do hóspede e liderando a turba feminina rumaram para o quarto de número vinte e dois, após subirem dois lances de escada. Abriu a porta com cuidado e sentiram, todas elas, de imediato, um doce e leve aroma de rosas se espalhando por toda a pensão.Aroma que descia as escadas, subia pelas paredes, penetrava frestas não deixando um só cantinho sem a sua presença. Sobre o leito bem feito se escontravam botões de rosas em número das mulheres que ali se encontrava ,incluindo dona Zica. Aproximaram-se da cama, cada uma pegou para si um botão de rosa levando-o às narinas aspirando o adorável aroma em longos haustos.

Dona Filó,mulher dada às letras e ao estudo, pensou logo em um documento. Devia ter algum  guardado na gaveta da mesinha que fazia as vezes de escrivaninha. Vamos ver, disse resoluta. Abriu a gaveta,em frenesí deparando-se com o tão almejado papel que ao que tudo indicava tratava-se de uma certidão de nascimento. Antes, porém, de ler comentou em voz alta para que fosse ouvida por todas as amigas: 
   - Caso seja a certidão do moço vamos à delegacia pedir para que Dr.Everaldo faça uma investigação sobre este camarada. Todas assentiram com um movimento significativo  de cabeça .

A professora  desdobrou, cautelosamente o papel para que não se rasgasse, passou os olhos pelo mesmo e a sua face tornou-se lívida.Procurando com cuidado as palavras pronunciou com voz soturna:
    - Só há um nome aqui que deve ser o do dito cujo. Leia...leia...falaram todas em uníssono. 
   -Abduzido, disse dona Filó e calou-se. 
   -Ab o quê? pergutaram. 
   -Abduzido repetiu dona Filó, muito intrigada com a folha na mão e as amigas a perscrutá-la por sobre os seus ombros. Após frações de segundo em silêncio dona Filó resmungou entredentes: 
   - Será o nome do capeta?! 
Todas se benzeram e cantaram como se fosse o coro de uma ladainha: Cruz credo!! Abduzido!!
E saíram da pensão em silêncio, contritas, orando
fervorosamente.
A partir deste dia nunca mais viram o ser misterioso.





Bjjjsssssssoninha.PAZ!
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