Quebra de protocolo
Eram três da manhã em Vorkuta, nos Montes Urais, quando o telefone tocou no apartamento do marechal Aksakov. O velho militar acordou de supetão e estendeu a mão para o aparelho ao lado da cama:
- Aksakov!
Do outro lado da linha, ouviu uma voz conhecida:
- Yablonsky. Desculpe acordá-lo à esta hora da madrugada, mas temos uma quebra de protocolo em curso.
Aksakov sentou-se na cama, totalmente desperto. Ao seu lado, a mulher, também acordada, apenas o encarou sem pronunciar palavra. Não era a primeira vez em sua vida que tivera o sono interrompido por alguma ligação fora de hora, e sabia que o melhor a fazer era não importunar o marido com perguntas.
- Quem foi desta vez?
- O Pioneiro Dmitry Alekseev. Talvez lembre-se dele...
- Sim... - murmurou Aksakov. - Um jovem muito promissor. Onde ocorreu?
- Em trânsito para um planeta habitado por uma cultura neolítica, no quadrante de Novaya Zemlya 4...
- E como aconteceu?
- Fizeram com que desligasse o transponder da nave.
Aksakov engoliu um palavrão.
- Por que alguém faria uma estupidez dessas? Exige atividade extraveicular! No hiperespaço!
- Sim, sim, sabemos - aduziu Yablonsky num tom de voz cansado. - E também sabemos o que ocorre DEPOIS que alguém faz isso dentro de um túnel de manutenção. Mas, claro, essa última parte é informação classificada. O que nunca nos ocorreu imaginar é que um dia alguém teria a péssima ideia de fazer justamente isso, no hiperespaço.
- Quanto tempo faz?
- Pelo retardo na transmissão, o transponder deve ter sido desligado há mais de dez horas. Provavelmente, não há mais nada a fazer, mas estou deslocando a nave de pesquisa mais próxima para as últimas coordenadas conhecidas.
- Previsão de chegada?
- Três semanas, em velocidade máxima.
Na penumbra do quarto, Aksakov apenas balançou a cabeça num gesto negativo. Suspirou.
- Tarde demais. Mas afinal... de quem foi a ideia para esta manobra suicida? E qual a justificativa?
- Bem... pelo que pude apurar, a ideia partiu do chefe da Inteligência de Novaya Zemlya 4, o major Spiridon Vladimirovich. Confesso que se eu não conhecesse a real importância do transponder, provavelmente teria tido a mesma atitude frente ao problema identificado. Mas é algo estranho demais para que eu explique por telefone. Tomei a liberdade de mandar um transporte trazê-lo à Sverdlovsk.
Um silvo de motores ouviu-se, cruzando os céus escuros de Vorkuta. Em seguida, luzes vermelhas piscantes passaram em frente à janela do quarto, velada por persianas, tomando o rumo da rua, quatro andares abaixo.
- São rápidos, já estão aqui - comentou Aksakov. - Nos vemos em meia hora!
Colocou o fone no gancho e virou-se para a mulher, ainda silenciosa:
- Uma emergência. Terei que sair.
Ela sentou-se na cama, expressão conformada:
- Sasha, quando me disse que havia se aposentado, eu acreditei.
Antes de erguer-se, o marechal inclinou-se sobre a mulher e beijou-lhe a face.
[24-08-2014]