Um caso de cosmopsicopatologia

O mensageiro uniformizado entregou-lhe um envelope grosso de papel pardo, tamanho ofício, e estendeu um livro de protocolo:

- Ponha o seu carimbo e assine por extenso, doutor...

- Bosko. Lucjan Bosko.

O cosmopsicólogo aguardou que o mensageiro saísse e o deixasse novamente sozinho no pequeno consultório antes de abrir o envelope. Havia lhe chamado a atenção a chancela mecânica aposta na parte superior, do COMCON-2. Não era comum receber relatórios do ultrassecreto comitê, e quando isso acontecia, os casos a examinar eram quase sempre tão misteriosos quanto a própria entidade solicitante.

- O que quer de mim desta vez, COMCON-2? - Indagou-se Bosko, usando uma espátula para abrir o envelope.

De dentro, sacou cerca de 20 páginas impressas em apenas uma das faces numa impressora de alta velocidade. Além do escudo do comitê no cabeçalho de cada página, cada rodapé havia recebido um carimbo de "CONFIDENCIAL" em tinta azul.

- Isto parece ser... - começou a dizer após ler o resumo na primeira página. Calou-se e continuou a leitura até terminar, cerca de meia hora mais tarde. Voltou até a página 5 e em seguida digitou um pedido de informações no terminal de computador sobre sua mesa de trabalho. O computador retornou-lhe uma lista de casos potencialmente relacionados, mas nada, nem de longe, semelhante ao que acabara de ler.

- Ei, isso é novo! - Animou-se Bosko.

Havia um telefone na extremidade da mesa oposta ao terminal de computador. Tirou o fone do gancho e digitou o número do seu colega Lev Dmitriyevich, no Segundo Instituto de Medicina Espacial, em Moscou. A ligação foi atendida no segundo toque:

- Markovic.

- Lev Dmitriyevich? Bosko. Escute, quanto tempo faz que não temos um caso novo de cosmopsicopatologia?

- Novo? O último com alguma repercussão de que me lembro foi a Síndrome do Pinguim. Há uns vinte anos, se não me engano...

- Acabo de receber um relatório... classificado. Não se parece com nada que eu tenha visto antes, mas envolve um Pioneiro em trânsito no hiperespaço. Ele está tendo sonhos, ou alucinações, estranhos e repetitivos.

- Talvez esteja há muito tempo sozinho; não seria o primeiro caso de alucinação, nestas circunstâncias. E não temos estudos conclusivos da influência da permanência prolongada no hiperespaço sobre a psique humana. Já falou com ele?

- Esse vai ser meu próximo passo. Só queria ter certeza de que não se tratava de algo conhecido.

- Enfim... mantenha-me informado. Se for algo realmente novo, talvez tenhamos que montar um grupo interdisciplinar de estudos. Como no caso do Pinguim.

- Sim. Grato pela atenção, Lev Dmitriyevich!

- Às ordens, Lucjan.

Após desligar, o cosmopsicólogo fez uma ligação para um ramal interno:

- Emma? Bosko. Preciso de uma conexão remota.

- Para quando, doutor?

- Pode preparar a seção que já estou indo.

- Em 10 minutos, doutor.

Bosko desligou. Em seguida, trancou o envelope numa gaveta e saiu do consultório.

[01-09-2014]