AS CHINELAS

Folheando uma antiga revista de variedades, me deparei com uma notícia, tão velha e tão recente, o advogado Norberto Furtado dos Reis, foi impedido de comparecer à uma audiência, de um processo criminal, por ter sido abduzido em sua fazenda nos confins de Goiás, custei a crer no que estava lendo, e fui pesquisar, em uma biblioteca, em outros jornais antigos da época, dos anos 40, e pasmem, existiram outros causos semelhantes, embora em situações diversas, no mesmo município de Goiás. Curioso por natureza, estava de férias e sem planos definidos, resolvi conhecer o lugar, me informei de pousadas ou albergues no lugar e parti, não sei bem o que esperava encontrar, mas, fui, não tinha nada a perder, assim eu acreditava, pelo menos valeria o passeio. Depois de alguns dias, dinheiro curto, nada de avião, o lugar era bem afastado do centro de qualquer cidade, mas alguns moradores, alugavam pequenos quartos com banheiro e geladeira, para visitantes, por um preço módico, muitas tendinhas por perto, para se comer uma boa comida goiana, pareceu-me, bem agradável. Aluguei uma bicicleta, num armazém rústico, mas, de dono bem gentil, muito falante, que me deu um mapa da região, então, comecei por ele mesmo a minha pesquisa, pois ele já tinha idade, e poderia lembrar do caso da revista, e de outros, e acertei em cheio. Naquele município parecia, que todo mundo já tivera algum encontro extraterreno, a princípio, me pareceu crendice, para atrair turistas para o lugar. Depois de minhas andanças, achei estranho, pois lugar era muito, muito simples, moradores tipo “minhocas da terra”, gente comum e brejeira, nada de luxo, ou pontos turísticos, só um rio gostoso de se banhar. Gente simpática e falante, muito verde, pomares pela estrada, com frutas que qualquer um podia pegar, bem gostoso mesmo. Depois de muitas perguntas cheguei até a fazenda do tal advogado, que pelo tempo, já não devia ser vivo, mas, talvez, algum parente ainda morasse por lá, quando se fala de fazenda, se imagina, alguma coisa grandiosa, mas, esta era simples, com muitos lotes é verdade, pouquíssimos animais, poucas plantações, como se criassem e cultivassem, apenas para o sustento. A casa principal, também, não era grande, tinha uma construção forte, pra resistir ao tempo, uma varanda que rodeava toda a casa, tinha uma casinha, que mais parecia um abrigo para ferramentas e sementes, do que uma casa, deveria ser um depósito. Um pequeno estábulo, para mais ou menos 06 cavalos, e um espaço maior algumas poucas vacas e bois que avistei logo a minha chegada. Bati palmas no portão, gritei e depois de algum tempo, uma senhora com roupa de tropeiro, lenço na cabeça e chapéu de palha, parecendo ter uns quarenta anos, veio me receber na cancela. Me apresentei, disse o motivo estranho da minha visita, o nome dela era Nádia Maria, era neta do finado advogado, ela me convidou para entrar, me acomodou na varanda, me trouxe uma jarra de limonada estupidamente gelada, com rodelas de limão e gelo dentro, uns biscoitinhos de polvilho doce, se sentou a meu lado, perguntou meu nome, respondi que me chamava Francisco Alencar, e era apenas um curioso em férias. Ela foi muito educada, simpática e gentil. Me relatou o que sabia da história do avô, que faleceu quando ela ainda era muito novinha, e não se lembrava muito dele, só sabia o que lhe contaram, sobre o assunto da abdução, não lhe causava estranheza, pois diversos fatos já haviam acontecido naquele município. Voltando ao avô dela, ele estava defendendo um sitiante num caso de roubo de gado de um outro fazendeiro, e era um caso complicado, com muitas testemunhas de ambos os lados, mas, que acabou não dando em nada, o tempo passou e o processo acabou arquivado. No dia da famigerada audiência, seu avô saiu bem antes do horário, pois era uma pessoa muito pontual em seus compromissos, seguiu numa caminhonete velha, mas, ainda muito parceira, e não chegou a nenhum lugar, três depois, depois de muito se procurar ele apareceu na fazenda, de cuecas e chinelos, com os cabelos branco azulados e meio abobado, ficou assim por pelo menos, mais uns três dias, todo mundo estranhou, o médico da cidade, não percebeu nenhuma enfermidade aparente, febre ou coisa que o valha, o estranho eram os cabelos branco azulados, os cabelos dele eram castanhos escuros, curtos e meio anelados, não se sabia ainda, o que pudesse ter acontecido. Até que no último dos três dias, ele despertou daquele estado, um tanto catatônico, e começou a falar aos borbotões, coisas sem nexo ou sentido, quem havia de acreditar em um fato surreal assim, só no rádio, e era ficção científica, mas, aos poucos voltando a calma, se alimentando, se banhando, colocando roupas confortáveis e frescas, ele foi dizendo, que do nada, no meio da estrada de terra, a caminho do fórum , onde seria a audiência, ele viu uma luz muito clara, ofuscante até, e bem azulada, tal qual estavam seus cabelos, essa luz veio se aproximando, se aproximando, até que cobriu todo o carro, e ele se sentiu subindo pela luz, de cuecas e chinelas, chinelas essas, as quais ela não calçava, nem conhecia, e se perdeu nessa luz, nada lembrava do que tinha acontecido entre subir pela luz e aparecer próximo à sua fazenda, de cuecas e chinelas, e só se dera conta dos cabelos branco azulados, pois lhe falaram quando ele voltou a si. Fiquei achando, que era uma história simples demais, para que tivesse valido uma página na revista, mas, enfim, agradeci e parti, como a conversa demorou, já anoitecia, quando pilotava minha bicicleta, pela estrada de terra, de volta ao meu pequeno quarto alugado. No caminho, encontrei uma menina de cabelos branco azulados, bem novinha, de seus 12 anos, ao que parecia. Levando em seus braços uma cesta de frutas recém colhidas, fomos conversando, e perguntei da cor de seus cabelos, ela me contou que quando tinha apenas 09 anos, uma luz apareceu, na beira do rio onde brincava com seus irmãos mais velhos de 10 e 12 anos, e essa luz a levou pra cima, sem roupa e de chinelas, chinelas que ela nunca vira, mas, que estavam em seus pés, seus irmãos, a princípio, não deram por sua falta, pois nas brincadeiras de mergulhar e voltar, não viram a tal luz, e ela também só apareceu 03 dias depois, no mesmo estado do advogado, coisa estranha. Cheguei ao meu destino, nos despedimos, nem perguntei seu nome, e ela seguiu pela estrada. Fiquei uns 15 dias naquele lugar, e ouvi muitas estórias parecidas, sempre relatavam, a nova cor dos cabelos, a luz, a falta de algumas roupas e as benditas chinelas. Comida boa da cidade, engordei um pouquinho, mas, minhas pernas estavam mais fortes, de tanto andar de bicicleta e nadar no rio, águas maravilhosas para amenizar o calor de Goiás, até me aventurei nas vendinhas, tomando algumas talagadas da caninha que desce redondo, comum por lá. Paguei minha conta do quarto alugado, me despedi dos proprietários, e segui pela estrada, até o ponto onde o ônibus passaria, e do nada veio uma luz forte e clara, meio azulada, e me senti subindo por ela, não senti minha mala, roupas nem nada, mas percebi chinelas em meus pés, não me lembro de mais nada, acordei em minha cama, na minha cidade, três dias depois, sem saber como havia chegado até lá, e meus cabelos ...use a imaginação......


Rio de Janeiro, 23/01/2015

Cristina Gaspar
Cristina Gaspar
Enviado por Cristina Gaspar em 24/01/2015
Reeditado em 28/08/2016
Código do texto: T5112262
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