Na Competição

[Continuação de "Pondo em ação"]

Na penumbra cálida da cave da Rainha dos Amaldiçoados, seu corpo parecia flutuar, embora estivesse na verdade deitado sobre um leito de folhas e ervas aromáticas. E a sensação era reforçada pelo fato da capitã Marjani Nnamani estar deitada ao seu lado, tão próxima dele que quase podia sentir o calor do corpo escuro dela. E ambos somente em roupa de baixo, besuntados de cima a baixo com a secreção produzida pelas servas melkis e que cheirava à flores.

- Wilmer... - sussurrou a capitã. - Agora entendi o porquê de gostar tanto de Arapa-IV. Isso é melhor do que massagem tailandesa...

O inspetor corou. A alusão era obviamente sexual, embora ele nunca houvesse pensado na experiência naqueles termos. Junto da bela Marjani, contudo, fazia todo sentido. Isto é, exceto pelo fato de que não estavam sozinhos, mas acompanhados pela Rainha em pessoa, uma criatura que lembrava uma abelha-rainha de seis metros de comprimento, e que pairava sobre eles com seus quatro braços de manipulação e duas longas antenas, que tocavam ora o corpo dele, ora o dela, enquanto conversava com ambos - um cricrilar contínuo, baixo e hipnótico, traduzido pelo Tradutor Universal que pendia do seu pescoço maciço.

- Você é a rainha dele? - Indagou a melki.

A capitã riu baixinho.

- Nunca pensei em nós nesses termos, majestade - respondeu ela.

- Nossa espécie já teve machos independentes num passado muito remoto - prosseguiu a rainha. - Mas nós os eliminamos, por serem inúteis.

O inspetor Hasselblad engoliu em seco. A rainha o tocou delicadamente com as duas antenas.

- Mas a dinâmica da sua espécie é diferente. Vocês não tem uma Mãe única, como nós. Portanto, justifica-se que mantenham a dualidade de sexos.

E enquanto o inspetor relaxava novamente, ela acrescentou:

- E ter homens como Wilmer Hasselblad é vantajoso. Se os seus machos forem todos à sua semelhança, é até compreensível que não queiram dispor deles.

- Nossos homens tiveram um longo aprendizado, majestade. Sabem respeitar e apreciar as suas mulheres... a maioria, pelo menos. Mas, certamente, o inspetor Hasselblad é um indivíduo excepcional...

Hasselblad sentiu que a mão de Marjani procurava a sua e segurou a dela. Com as antenas da rainha em contato com os corpos de ambos, uma conexão mental entre os três criou-se quase de imediato. Sensações e pensamentos fluíam entre os dois humanos e a melki, como se houvessem subitamente transformado-se numa terceira entidade que transcendia os limites do tempo e do espaço.

E nesse limbo entre os universos, a tríade ouviu uma voz sem palavras, que dizia:

- Eles estão aqui.

* * *

Já novamente vestidos e de volta à tenda destinada aos visitantes, Hasselblad e Nnamani entreolharam-se, embaraçados.

- Vimos e sentimos realmente aquilo, ou foi um "barato" provocado por alguma substância contida nessa secreção que as melkis nos esfregaram? - Indagou a capitã.

- Creio que humanos e melkis podem realmente transcender as barreiras entre as espécies e criar um tipo de vínculo mental temporário... - analisou o inspetor. - Eu já havia sentido isso em contato com a rainha, mas nunca tão forte quanto nessa experiência de hoje.

- Talvez porque estivéssemos juntos... humanos de ambos os sexos... a completude.

- A plenitude - complementou ele.

Ficaram um instante em silêncio e depois, deram-se as mãos, frente à frente.

- Sabemos o que tem que ser feito, então - disse ele.

- Eu sei... e é arriscado - ela estava tensa.

- Mas o que está lá fora exige que corramos esse risco.

E em tom enfático:

- Provavelmente, é a nossa única esperança.

Nnamani apertou as mãos dele entre as dela.

- Mas foi você quem descobriu que as melkis estão sendo mantidas prisioneiras em Arapa-IV... e que tentar ajudá-las pode trazer consequências imprevisíveis, mas potencialmente desastrosas...

Hasselblad sorriu.

- Desastrosas, sim. Mas, para quem?

* * *

A mensagem encaminhada pela capitã Marjani Nnamani ao Corpo de Monitores e à Federação Galática, antes de decolar com seu cruzador de Arapa-IV, foi curta e concisa: estava partindo para o Rabicho de Nawagar, distante 2.500 anos-luz da Via-Láctea, com sua tripulação e convidados de última hora: a Rainha dos Amaldiçoados e duas servas.

A capitã lamentava antecipadamente qualquer problema decorrente de sua atitude, mas concluía dizendo que esta talvez fosse a única maneira de resolver um grave problema que ameaçava não somente a Galáxia, mas todo o Universo.

Marjani Nnamani tornara-se conhecida no Corpo de Monitores por não entrar em competições que não pudesse ganhar. E nesta, não poderia ser diferente.

[Continua]

- [12-11-2017]