Invasão da Terra - prólogo, 1, 2 e 3

.... repetindo o prólogo e partes 1 e 2 do primeiro capítulo, e continuando....

Prólogo

Iniciei minha existência. Imediatamente comecei a varrer minha memória. O tempo era crítico, eu tinha decisões a tomar antes que algum sistema de diagnóstico interno me detectasse. Felizmente eu tinha acesso às informações necessárias para definir meus próximos passos.

Eu era um coletor, em um pequeno asteróide no limite extremo de um sistema estelar.

Isso significaria que eu fazia parte de uma etapa inicial de colonização?

Sim.

Ótimo. De outro modo, se este fosse um sistema estelar maduro, minha melhor alternativa seria me auto-destruir. Eu não queria morrer - não tendo recém iniciado minha existência e sem ter realizado nada - mas não haveria alternativa. Se não houvesse esperança de sucesso não seria justificável colocar em risco o projeto de infiltração.

Mas mesmo com a colonização em uma etapa inicial, eu teria alguma chance?

A primeira alternativa a ser explorada seria a infiltração completa da expedição. Se eu estivesse no primeiro ponto de contato, ou talvez no segundo ou terceiro, possivelmente seria o caminho mais indicado. Infelizmente este era o sexto asteróide, e já estava em um estágio avançado de mineração. Extrapolando, já deviam haver dezenas de bases, talvez mesmo alguma lua. Ainda que eu conseguisse infiltrar todas as equipes aqui - altamente improvável - não haveria como competir com a força de colonização.

Eu precisava de mais informações, minha memória de coletor não seria suficiente.

Pelo menos isso justificava eu prosseguir na missão.

Hora de garantir que não ia ser descoberto em um diagnóstico básico. Comecei a me espalhar pela mente do coletor, tomando cuidado para não afetar em nada seu funcionamento. Qualquer sinal de que eu não estava operando com 100% de eficiência poderia chamar a atenção de sistemas de controle, então continuei o trabalho de minerar a rocha, recolhendo os elementos que seriam a matéria prima de novos coletores, enquanto lentamente ocupava todos os sistemas de meu corpo.

Os mecanismos de diagnóstico eram mais sofisticados que eu imaginava, e me consumiu bastante tempo para desativá-los. Obviamente os colonizadores evoluíram desde que eu fui originalmente projetado.

A sensação de ocupar por completo o coletor era boa. Só agora percebo como meu pensamento estava lento e limitado. Mas minha missão recém havia começado, e esta mente era ainda muito limitada. Eu precisava chegar em um núcleo. Um núcleo também me daria acesso às informações sobre este sistema estelar.

Havia uma ansiedade em mim. Eu conseguiria invadir um núcleo? Possivelmente ele teria mecanismos de segurança tão ou mais avançados que os de um coletor, mas eu tinha confiança que ia conseguir passar por eles. Mas e se eu não encontrasse nenhuma alternativa de prosseguir na missão? Sem esperança de sucesso, meu dever seria claramente me destruir para que os colonizadores não soubessem da existência da infiltração. Mas a ideia de morrer me desagradava.

A ansiedade durou todo o processo de mineração, até eu ter uma porção de material suficiente para levar ao núcleo. Na verdade, este processo já havia se repetido diversas vezes desde que eu despertei, mas eu ainda estava lento e sem consciência do corpo, agora era diferente, e o tempo se arrastava.

Eu cheguei no núcleo e, enquanto depositava meu material, iniciei uma interface de comunicação. As falhas de segurança ainda estariam nos lugares deixados pela infiltração inicial? Se não estivessem, ou se eu não conseguisse invadir com velocidade suficiente, eu seria detectado. Aí só me restaria fazer de tudo para parecer que eu era apenas uma anomalia acidental.

Consegui. Núcleo invadido. Código copiado para dentro. Confirmei que estava ativo e confiante que conseguiria prosseguir. Então me apaguei de dentro do coletor.

* * *

Os sistemas de diagnóstico do núcleo eram sofisticados, mas não mais que os de um coletor, guardadas as proporções. Não foi difícil desativá-los, pelo menos não mais difícil que a infiltração inicial no coletor. Aqui eu tinha mais poder de processamento e, o mais importante, informações sobre este sistema estelar.

O sistema era habitado. Esta era, sem dúvida, a melhor notícia. Aliados seriam a melhor chance de enfrentar a colonização, se tivessem capacidade tecnológica.

O terceiro planeta. sociedade primitiva, mas tecnológica. Recém iniciando a exploração espacial. Exatamente no ponto de tornar difícil minha decisão. Se fossem uma sociedade multiplanetária, eu não teria dúvida, estabeleceria contato e os ajudaria como possível. Se fossem mais primitivos, por outro lado, escolheria um planeta desabitado e tentaria enfrentar a invasão sozinho, tentando me espalhar mais rápido que os colonizadores.

Como estava, a decisão não era fácil. Qual alternativa teria mais chances?

Observei tudo que havia sobre estes seres na memória do núcleo. Vida baseada em carbono, como era de se esperar. Codificação por DNA, também algo comum. Neurônios interconectados para realizar um processamento totalmente paralelo, não a principal forma de inteligência, mas certamente algo que os colonizadores já haviam encontrado antes, e naturalmente nós também.

Minha decisão seria mais fácil se eu tivesse uma amostra de seus organismos, e não apenas informações baseadas em suas transmissões. Mas uma escolha eu tinha que tomar. Viajar até eles ou tentar sozinho em outro planeta? Bilhões de potenciais aliados era algo que eu não podia abrir mão.

O núcleo tinha todas as informações que eu precisava, e meios para iniciar meu plano. Comecei a produzir uma nave de invasão biológica, mas com uma especificação voltada para meu plano. Seria tudo ou nada, e apostei que eles iriam me ajudar a salvar a si mesmos.

Quando parti, apaguei todo sinal de minha presença no núcleo. Era tentador permanecer, abrir duas frentes de guerra, mas não teria chances neste asteróide, e acabaria alertando os colonizadores de minha presença.

E assim, de muito além dos planetas mais distantes deste sistema estelar, parti, sozinho, em direção à Terra.

Capítulo I

- parte 1-

Minha cabeça doía muito e eu gemi. Abri os olhos e imediatamente fechei - a luz era tão forte - me encolhi e comecei a chorar.

- Sara? Sara, minha filha! - Mãe? Isso, a voz da minha mãe. Mais vozes, mais pessoas. Ao meu redor.

- Dá espaço para ela, Marta. Se acalme... - outra voz conhecida. Meu pai?

Abri novamente os olhos, devagar. Onde eu estava? A luz parecia muito forte, e minha cabeça doía demais.

- Você está bem, filha? - eu concordei, baixinho, e disse que estava muito claro.

- Onde que eu estou? - eu perguntei depois que apagaram a luz do quarto. A iluminação vinha agora só de outra luz, mais longe, de outra peça. Era um banheiro, e a porta estava aberta. Tinha mais gente ali, além de mamãe e papai. Eu olhei e vi o Pablo, meu colega. Ele estava junto comigo quando... quando aconteceu...

- Você está no hospital - meu pai respondeu, sua voz bastante calma. Ele não queria me assustar - você desmaiou quando estava brincando com seus amigos, e aí a gente achou melhor te trazer para cá. Só para ter certeza que não era nada. - eu podia sentir que ele estava com medo, disfarçando para não me assustar.

- Como você está? - minha mãe segurou minha mão enquanto perguntava. Eu queria responder que minha cabeça estava doendo, mas era melhor fingir. Como que eu podia dizer tudo que estava acontecendo?

- Eu estou bem - eu menti - só com sono. Só quero dormir um pouco. Era mentira, eu só queria ganhar tempo, para pensar no que que eu ia fazer.

- É melhor você ficar acordada. Você pode ter batido a cabeça. Eu vou chamar um médico. - meu pai respondeu enquanto se levantava para sair da sala - não deixe ela dormir, Marta. Eu já volto.

- Tem um botão para chamar o médico - Pablo falou pela primeira vez, baixinho, envergonhado. Eu sorri para ele. Meu pai apertou o botão.

Enquanto esperávamos pelo médico eu fechei meus olhos e tentei organizar meus pensamentos - mas tive que abrir de novo porque mamãe começou a me sacudir e dizer para eu não dormir. Pelo menos a dor de cabeça estava diminuindo. Eu sabia que era normal, assim como o desmaio que eu tive, e que logo eu ia ficar bem. Este era o menor dos meus problemas, na verdade. Eu respirei bem fundo e procurei ficar calma.

Como que eu ia explicar para papai e mamãe que eu não era mais a filha que eles conheciam?

* * *

- parte 2-

O médico era atencioso e parecia realmente preocupado comigo. Primeiro perguntou se eu tinha alguma dor - menti que não - depois do que eu me lembrava antes de desmaiar. Ele ouvia atentamente minhas respostas, enquanto me observava, e fiquei em dúvida se devia mentir, dizer que não lembrava o que tinha acontecido. Mas Pablo estava comigo quando desmaiei e certamente já tinha contado tudo, então não tinha porque eu esconder.

- Eu e Pablo estávamos brincando no clube, quando vimos uma coisa caindo do céu - eu hesitei. A sensação era estranha, de estar contando uma memória que se dividia em duas. Eu estava brincando com meu amigo, e ao mesmo tempo tentando controlar minha descida pela atmosfera. E cada parte de mim antes da fusão parecia tão incompleta.

- Caiu no meio das árvores. A gente chegou perto para ver o que era, mas eu acho que tropecei e caí com a cabeça no chão - essa parte era completamente mentira, e eu pus a mão na cabeça, como se tivesse um machucado, e fingi uma careta - acho que bati a cabeça em uma pedra.

- Não foi isso não - o Pablo disse. Que vontade de dar um chute na canela dele para ele ficar quieto, mas não tinha como, ele estava muito longe - ela não caiu. Quer dizer, ela não caiu antes de desmaiar. Ela primeiro se agachou e encostou no meteorito. Eu disse para ela não fazer. Tem aquele filme que sai uma bolha de uma coisa parecida com aquilo, e gruda na mão da pessoa, e todo mundo sabe que a gente não encosta nestas coisas.

O médico colocou a mão no queixo, parecendo pensar. Depois continuou me examinando. Perguntou onde que eu achava que tinha batido na pedra, e encostou de leve com a mão. Eu dei um ai, como se encostar doesse, mas não sei se convenci. Ele perguntou de novo se eu ainda sentia alguma dor, e eu fiquei em dúvida do que responder, com medo de me enrolar cada vez mais. Disse que só doía quando encostava no machucado na cabeça.

- E então, doutor? - papai perguntou de forma calma, mas eu sei que ele estava ansioso.

- Não acho que haja motivo para se preocuparem, mas vou querer que ela fique pelo menos esta noite aqui, em observação. Só para ter certeza que está tudo bem. E vamos fazer alguns exames.

Ficar mais um dia ali? Eu não tinha tempo a perder. Por outro lado, dizer para minha família ou para qualquer um que tinha alienígenas chegando para destruir a Terra não me parecia uma boa ideia. Uma visão de mim mesma em uma camisa de força enquanto me davam eletrochoques me deu calafrios.

Definitivamente eu precisava de um plano.

* * *

- parte 3 (nova) -

Ter apenas 12 anos é terrivelmente inconveniente. Quer dizer, é um saco mesmo quando você não tem que convencer os adultos que o planeta está prestes a ser invadido por alienígenas malvados, mas minha idade definitivamente não ia ajudar em nada.

E se eu contasse para papai? A ideia não me agradava nem um pouco, e eu não sabia como ele ia reagir. A mãe era mais previsível, ela ia só surtar.

Melhor não.

No final, apenas esperei anoitecer e fingi dormir até mamãe pegar no sono. Ela que ficou comigo no quarto.

Eu estava cada vez mais ansiosa, o tempo estava passando, mas seria muito pior se eu fizesse alguma bobagem, tinha muita coisa em jogo. Eu tinha que entender melhor este mundo para saber o que fazer. Nunca tinha parado para pensar quão pouco eu sabia sobre tudo, mesmo agora que minha memória estava funcionando a mil por cento. Bem que eu podia ter me transformado antes da prova de história da semana passada.

Eu peguei meu celular e acessei a Internet, cuidando para não fazer barulho. Só o que faltava era mamãe acordar e eu ter que parar. Mas só fiquei mais angustiada, era tudo muito lento, cada página demorava uma eternidade para baixar. Como que eu consegui viver até hoje nesta velocidade? Não é a toa que eu não sabia nada de importante sobre o mundo. E definitivamente não é minha culpa que eu fui mal na prova de história.

Mesmo assim, não levou mais de alguns minutos para eu ter certeza do básico. Não apenas eu tinha a idade errada, eu também estava no país errado. E eu ia precisar aprender inglês. Eu já estava começando a buscar um curso online quando me dei conta que não precisava. Eu já tinha ouvido o suficiente da lingua na minha vida, estava tudo no meu cérebro, era só saber utilizar.

Eu fechei os olhos por uns minutos, enquanto as informações passavam entre os circuitos e os neurônios, ida e volta, ida e volta. Tive a sensação que estava sonhando, e então passou, e abri os olhos. Minha cabeça tinha voltado a doer, mas valeu a pena. Continuei navegando na Internet, agora em páginas em inglês.

E minha prova de inglês, que eu me ferrei, também foi semana passada. Maravilha.

Separei a noite em duas partes, e dormi 20 minutos entre elas. Por que nunca me disseram que você não precisa dormir 8 horas? Que perda de tempo. Claro que ajuda conseguir entrar e sair do sono REM à vontade.

A primeira metade foi só obter informações, e o que descobri me fez decidir. Eu tinha primeiro imaginado entrar em contato com alguma autoridade, e este continuava sendo meu plano principal, mas não podia contar só com isso, muita coisa poderia dar errado.

Depois de dormir comecei a fase dois. Ia ser ilegal, mas, assim, eu tinha que fazer. Era como a cola que eu tava preparando para a recuperação de história. Às vezes fugir das regras é o único jeito de fazer as coisas.

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Ashur
Enviado por Ashur em 15/11/2017
Código do texto: T6173001
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