Mirella

Durante a noite fria de inverno o vento rugia lá fora, a vista pouca iluminada do quintal era aterrorizante. Mirella estava sozinha em casa. Seus pais haviam saído para um baile. Era uma semana de julho e a noite anunciava geada ao amanhecer. Mirella estava preocupada com os pais, haviam saído a pouco e era provável que não fossem voltar, pois a tempestade de inverno estava ficando critica. Logo Mirella ouviu o aterrador barulho do telefone tocando. Mirella atendeu ao telefone, era sua mãe.

- Oi filha, seu pai e eu iremos dormir na tia Ellen começou a chover muito forte logo que chegamos ao clube. Feche toda a casa e tome cuidado, beijos.

A casa da tia Ellen era muito perto do clube e a casa dos pais de Mirella era muitíssimo longe e estava se tornando especialmente complicada aquela tempestade, chovia e ventava muito. É muito comum em Favínia, cidade no sul do Paraná, estas tempestades de inverno. Favínia ficava próxima a divisa com Santa Catarina e o inverno era especialmente rigoroso na cidade. Sob tal prerrogativa era prudente aos pais de Mirella passarem a noite na casa da tia Ellen.

Mirella, uma bela menina de doze para treze anos era filha única do casal Shawerls, família de origem supostamente germânica como pressupõe o sobrenome, mas a bem da verdade não sei. Desculpem minha pouca memória, mas vale ressaltar que Mirella iria completar treze anos no dia posterior.

Mirella sobressaltada com a ideia de passar a noite sozinha naquela grandiosa casa logo tratou de seguir o conselho da mãe e trancou toda a casa, terminado isso, subiu as escadas em direção ao seu quarto. Era dez e meia, queria ocupar-se antes que Orpheu não vinha, ligou o notebook, mas devida a tempestade não havia internet. Tentou entreter-se com Paciência, mas logo se entediou, não queria ir dormir aquela hora.

- Dálha! Gritou, procurando o celular. Mas logo fora frustrada em suas intenções, estava sem rede.

Deitou-se sobre a grande cama aborrecida com a situação, fez um longo – Aff! E decidiu-se por tentar dormir. Sem ajeitar-se por debaixo das cobertas ainda, deitou-se apenas para ver se agora Orpheu viria. Nada! Decididamente estava exasperada com a ideia de dormir sozinha pela primeira vez em sua vida, de repente se pôs a pensar que se seus pais tivessem outra criança ela não estaria tão sozinha.

Subitamente, lá embaixo o telefone tocou, tudo estava tão mortalmente silencioso que se levantou assustada. Aquele som de telefone lá embaixo era aterrador, aquele barulho intermitente. Saíra do quarto e desceu as escadas para ir atender ao telefone imaginando que fosse a mãe novamente com boas notícias. Atendeu o telefone.

- Alo! Disse. O eco se fez ouvir do outro lado.

Ainda com o telefone aos ouvidos – PLIM PLIM!- tocou a companhia. Virou de súbito o rosto em direção a porta. Havia um vulto na porta de vidro com cortinas brancas. Imaginando não ser nada que pudesse temer foi ate a porta e prudentemente gritou.

- Quem está ai?

Mirella nada ouviu do vulto imóvel à porta. Então decidida de que era o pai querendo fazer uma surpresa nas últimas réstias de horas para seu aniversário, abriu a porta. E para seu terror completo não havia ninguém à porta. Mirella sentiu o coração nas mãos a bater freneticamente. Então como que uma baforada da tempestade beijou-lhe a face e algo sussurrou em seu ouvido – Deixe-me entrar...

Assustada fechou rapidamente a porta e subiu correndo as escadas e trancou se no seu quarto e deitou se na cama e cobriu-se por completo.

Passados os momentos de pânicos olhou o relógio e para sua surpresa era duas e cinquenta e cinco. Pensou que estava num sonho, mas não. Como a hora poderia ter passado tão rápido assim se indagava ela. Então quando desviou os olhos do relógio viu um vulto de homem a sua frente, sinistro e medonhamente fixava-lhe olhos tremendos, era só o que distinguia do borrão, havia também duas espécies de antenas em sua cabeça como pôde identificar antes do pânico lhe tomar por completo e soltar o horrendo grito. De repente a figura estranha puxa-lhe as cobertas e avança sobre ela. Mirella grita desesperada. Borrão...

Mirella levanta aturdida, descabelada e nua. Olha aos lados como a procurar algo e caminha desorientada como a procurar sentido as coisas. Percebe-se nua. Nônsencia, sua face era de pura ausência, olhos inquisidores a perscrutar o quarto todo, mas não havia nada ali. Percebeu que algo lhe doía, não sabia o quê, só que lhe doía algo. Abre a porta do quarto e caminha aérea de si mesma, estrangeira de sua própria casa. Dirigi-se ao banheiro, sente necessidade de se limpar.

No banheiro, olha a si mesma ao espelho, não se reconhece refletida nele. Parece que um que uma outra identidade lhe apossara de seu corpo, um quê de perdição, de não ser o que se era. Percebeu os cabelos desgrenhados e os lábios muito vermelhos, sangravam vermelhidão. Decide tomar uma ducha, entra no Box e fecha a cortina, liga o chuveiro e entra embaixo da água, sentia a água escorrer sobre seu corpo a lavando toda, necessitava daquela purificação. Gozando do prazer que só desfrutamos debaixo de um chuveiro, ela não percebe a água tingida de vermelho a escorrer para o ralo, continua a se deliciar com a água quentinha a lhe banhar o corpo mulheril, a cada segundo mais tingida de vermelho, vivo, a água continua a escorrer para o ralo.

Quando sentiu necessidade de acariciar a bela flor, percebeu que a flor sangrava e escorria por entre suas pernas o mais vivo vermelho, escorria, escorria... até se juntar a água que se esvaia pelo ralo. Percebendo todo aquele sangue escorrendo de si, ficou pálida e desfalecida e como não pudera ver tanto sangue como que em último ímpeto agarra a cortina com intensão de fugir da situação incógnita, mas já sem força resvala e cai ao chão desmaiada e o sangue continua a escorrer e descer ao ralo como últimas gotas da menina descendo em fios de água circulares...

Adailton Almeida Barros
Enviado por Adailton Almeida Barros em 21/04/2014
Código do texto: T4776510
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