As Aventuras de Rizzie Contra a Louca do Rocambole! - Parte 1

Estávamos todos entorpecidos pelo começo letárgico de 2014. Passeava por aí descompromissadamente e encontrava alguns amigos no bar com alguma regularidade. A vida estava pacata, boa, podia ser sempre assim.

Lá pelos dias de março, uma estranha conhecida fez contato virtual comigo. Lembrava-me dela, era do trabalho, o último, como operador de telemarketing. Uma das tantas pessoas que vi entrar, morrer e sair antes da minha demissão. Não significávamos nada um para o outro, não fazíamos nada além de acenar com a cabeça por educação quando por qualquer coincidência nos víamos no corredor da empresa. Fez contato.

O diálogo foi completamente banal. Sabia que ela ficava com um conhecido, e ela queria apenas que eu a ajudasse a escolher um presente para o tal rapaz. Rizzie, Rizzie... Você deveria ter sentido o cheiro de encrenca. Estava tão óbvio! Sugeri uma camiseta, e pelo que me lembro dele, era um cara pacífico e humilde, se alegraria com qualquer coisa, talvez até mesmo pelo simples fato de ter sido presenteado. Um cara decente, bom, do tipo que não se encontra facilmente.

Deste ponto em diante, algumas facetas desta estranha figura, esta intrigante garotinha, começam a se manifestar. A aparente doçura começa a dissolver e o que está por trás é... Me acompanhem e descobrirão. Ela começou a pegar confiança e dizer que estava decepcionada com o rapaz que iria presentear. Que era um covarde pois terminou com ela e ela realmente o amava... Parou, parou, para tudo! Se ela ama ele, por que não perdia uma maldita chance de ofendê-lo? Xingava-o de idiota, covarde, insensível, tudo isso porque... Ele terminou com ela e meses depois estava com outra. E mal sabia eu mas a lista apenas aumentava conforme o tempo passava. Falava mal de todos os homens com quem se relacionou, até mesmo na infância.

Era patológico. Só pode!

Conforme eu analisava esta estranha criatura, fascinado com a perspectiva quase científica de que um espécime como este poderia existir... A tal começou a se apegar, e demandar uma quantidade de atenção inumana para nutrir sua carência. Já me senti carente, conheci pessoas carentes mas isto estava acima de tudo que já vi, e que jamais verei! Ela dizia que me amava e era um pecado vil e criminoso não atender a seus anseios vinte e quatro malditas horas por dia. E então... Era eu quem passou a ser alvo das ofensas.

Ela ficava absurdamente brava e grosseira, como uma mula distribuindo coices. Em certo ponto, tentei trazê-la para a razão, mostrar que aquilo não era o fim do mundo, mas a louca estava em chamas! Nada iria detê-la, ela estava disposta a ir longe para me irritar ou me entristecer com sua grosseria ofensiva.

Porém, o único sentimento que ela nutriu-me com esmero foi a indiferença.

Mas quanto mais eu a ignorava, mais débil e estupefata ela ficava! E me escrevia diversas asneiras pelo mensageiro virtual. Ao menos era corajosa, foi o que pensei... Até encontrá-la pessoalmente. Foi então que vi que toda aquela braveza não passava de um grande dramalhão pra chamar atenção e conseguir o que quer. Pessoalmente, era infinitamente mais sem graça, balbuciava palavras, parecia não ser capaz de levantar a voz contra nenhuma de minhas constatações. Ela era algo entre nascer e nascer morto. Imaginem a decepção: Fui esperando um belo combate e tudo que encontrei foi uma criança tímida, tediosa ao limite.

Saindo deste encontro certo de que aquilo não se repetiria, não foi preciso mais que algumas horas pra recomeçarem as ofensas. Foi neste ponto que percebi que era maluca, uma causa completamente perdida. Perdida em seu próprio eu, não conseguia enxergar que as falhas que apontava nos outros, não eram outras se não as suas próprias, veja! Acusou a todos de serem covardes, quando ela mesma não conseguia nem mesmo olhar nos meus olhos pessoalmente, se expressava através da doente virtualidade de nossos tempos, que permitem que esse tipo de comportamento aberrante ganhe força e deturpa o caráter (já muito deturpado por anos de criação ruim e igreja, muita igreja). Abandonei, usei de bloqueios para que não mais entrasse em contato comigo.

Entretanto, era assustador: Conforme bloqueava em uma rede, a garota encontrava outro caminho até mim por outra rede, e por outra, e por outra... Parecia não ter fim!

A princípio, bloqueei o WhatsApp. Depois o Facebook. Começou a enviar mensagens (SMS) pelo celular, ignorei. Passou a me ligar, e depois de um tempo não mais atendi. Então enviou-me uma carta!

Comentei com uma amiga sobre o caso.

"Nossa, Rizzie. Isso é meio assustador, não acha? Ela parece que 'tá' te perseguindo. Deixou claro que não queria mais nada?"

"Ao ponto dela precisar me enviar uma carta pra fazer contato? Acho que sim, 'né'?"

"É."

"Foda."

"Vai ver ela 'tá' preparando sinais de fumaça."

"Ahahahahaha!"

"Não, sério! Ela me parece aquele tipo de louco que quando é contrariado vai pro canto de um quartinho escuro e fica bolando planos enquanto come rocambole. Só que ela fica pensando em formas de te perseguir, enquanto segura sua faquinha de plástico e fatia e devora o rocambole."

"O que 'cê' tá usando? 'Tá' louca também? Ninguém bola planos malignos comendo rocambole."

"Quem avisa, amiga é. Eu se fosse você me preparava pra facada de plástico."

"Porra, de plástico? Que morte besta."

"Rizzie, toda morte é besta."

"É."

Tudo isso me pareceu deveras insensatez. Nenhuma vilania seria completa em sua maleficência usando de uma faca de plástico suja de bolo e recheio de morango. Ignorei, a princípio, tal aviso.

Porém, conforme passaram-se os dias, entreguei-me a curiosidade. E se aquilo fosse verdade? E se houvesse uma conspiração para ganhar minha atenção apenas para me ofender de novo em grande estilo? E se, após perder toda dignidade, fosse esfaqueado, o plástico arranhando minha pele como unha de gato, o sorriso no rosto de uma louca se deliciando em seu delírio em que meu braço verte morango e não sangue e minha carne é massa, farinha de trigo, leite e ovos?

Precisava descobrir a verdade, por mais horrenda que fosse. Iria me infiltrar no covil da louca do rocambole e impediria tal complô traiçoeiro. Mas antes fui ao bar beber uma cerveja com meus amigos e quando contei a história toda e minha próxima empreitada, fiz todos rirem.

Continua...

Vinícius Risério Custódio
Enviado por Vinícius Risério Custódio em 17/07/2014
Reeditado em 30/04/2016
Código do texto: T4884976
Classificação de conteúdo: seguro