Joelma - DTRL 22

Um Jovem rapaz caminha tranquilamente enquanto segura um copo de café e uma maleta em direção ao 8º Distrito Policial, localizado no centro de São Paulo. Sentado na escadaria que dá acesso a entrada do distrito, um homem de aparência cansada e taciturna chama a sua atenção por um momento. O jovem adentra a delegacia.

- Bom dia, sou o investigador Almeida Cavalcante, fui transferido do 13° distrito para cá. Diz o homem para a oficial na recepção.

- Bom dia Almeida, por favor sente-se enquanto chamo o comissário para apresenta-lo ao lugar.

- Muito obrigado, seu nome é?

- Oficial Marly.

- Marly, quem é o sujeito nas escadas?

- Ah não, esse traste novamente. Marques, por favor tire o nosso amigo da escadaria. Diz a oficial a um policial que monta guarda ao seu lado.

- Deixa comigo.

- Não ligue para ele Almeida, é um lunático que vem todo o dia aqui implorando para ser preso.

- É cada tipo que essa cidade oferece. Diz Almeida.

- Nem me fale.

- Investigador Almeida, muito prazer. Sou o comissário Nascimento. Seu sargento falou muito bem sobre você. Diz o comissário de braços abertos.

- O prazer é meu, comissário. Fico feliz em ter feito um bom serviço no meu último distrito.

- Venha, vou-lhe apresentar o lugar.

O comissário integra o investigador Almeida no 8º Distrito e ele rapidamente adapta-se ao novo trabalho e rotina.

Por acaso do destino, obteve sucesso em um caso de latrocínio, resolvendo-o de forma rápida e sagaz.

Fato que lhe trouxe méritos e um ganho rápido de confiança. Sua carreira seguia um ritmo rápido de ascenção, entretanto, algo o incomodava. Toda manhã que chegava ao trabalho, lá estava o estranho sentado na escadaria com seus tristes olhos vermelhos.

- Posso ajudar? Almeida pergunta ao estranho em um momento de máxima curiosidade e empatia.

- Só se o senhor me prender.

- Mas para te prender, você precisa cometer ou ter cometido um crime. Ser um criminoso.

- Múltiplos assassinatos servem para você?

- Você tem a minha atenção. Venha. Diz Almeida para o homem.

O estranho homem acompanha o investigador até sua sala.

- Sente-se. Há café e biscoitos no armário.

- Obrigado, estou faminto.

- Qual o seu nome estranho? Já teve algum problema com a justiça?

- Meu nome é Humberto Zanard Huck e não, nunca tive problema algum com a justiça.

- Me diga, que crime cometeu?

- Você ouviu falar do incêndio que ceifou centenas de vidas no edifício Joelma?

- Todo o Brasil acompanhou perplexo essa tragédia.

- Você acreditaria se eu dissesse que tenho parte na tragédia? Não ativa, mas de certa forma, passiva?

- Explique-me.

- Investigador, eu possuía uma empresa que realizava manutenção nos aparelhos de ar condicionado do prédio e posso lhe dizer sem sombra de dúvidas que meu ex sócio elaborou um plano para que por meio do incêndio, fosse beneficiado de uma fortuna em seguros.

- E quem era o seu sócio?

- Walfred Georges. Sócio majoritário da Termotempo. Nossa ex empresa.

- E você pode provar o que fala Humberto?

- Infelizmente não, tudo o que o fogo não consumiu, ou foi jogado no lixo ou fora recolhido pela polícia.

- Sem provas não tenho como ajuda-lo infelizmente.

- Mas eu estou confessando.

- Já disse, sem provas... talvez se fossemos no local, alguma coisa poderia ter ficado para trás depois da reforma, afinal, não faz muito tempo que reformaram o edifício.

- Ir até lá? De forma alguma.

- Por quê?

- Porque não, é o que posso dizer.

- Nesse caso, feche a porta após sair.

Algo que Almeida não soube explicar eriçou os pelos de sua nuca. Um arrepio gélido percorreu todo o seu corpo trazendo uma terrível sensação de mal estar. Ao olhar para Humberto, o estranho, viu nele uma expressão de terror em seu rosto enquanto lágrimas escorriam pela sua face, gotejando em sua camisa surrada. O que mais causou estranheza em Almeida, foi o fato de que Humberto olhava fixamente para o teto atrás dele, como se algo invisível o encarava.

- Tudo bem, vamos até lá. Disse Humberto cabisbaixo.

- Excelente, venha amanhã as 10:00hrs.

- Combinado. Diz Humberto ainda atordoado.

No dia seguinte, no horário acordado Almeida e Humberto tomam um táxi até o edifício e em poucos minutos já estão em frente ao gigantesco colosso de concreto e aço. Um rápido bate papo com a recepcionista garante o acesso ao interior do edifício. Uma mudança no semblante de Humberto era nitidamente percebida, sua pele ficou pálida e ele tremia e transpirava muito. Ao entrar no elevador sua respiração ficou estranhamente ofegante.

- Acalme-se Humberto.

Humberto não respondia. Apenas respirava com dificuldade enquanto o elevador vencia os andares até o 12º. Local aonde a Termotempo mantinha escritório.

Almeida sentiu um calor diferente no elevador, e em alguns momentos, tinha a certeza de que sentira o cheiro de carne queimada. Deve ser da churrascaria no piso térreo. Pensou.

A medida que elevador subia, Humberto ficava cada vez mais transtornado. Ao chegar no 12º andar, o horror se instalou dentro do cubículo do elevador.

- As luzes piscavam alternando entre a cor amarelada e a vermelha da luz de emergência. Humberto tombou de joelhos tentando tampar os ouvidos com as mãos, se protegendo de algum ruído imperceptível.

- O que está acontecendo Humberto? Mantenha a calma, com certeza é uma pane momentânea no elevador.

Humberto não ouvia nenhuma palavra de Almeida pois pressionava os ouvidos com tanta força que machucou as orelhas.

Finalmente a porta do elevador abriu. Humberto precipitou-se para fora daquela armadilha claustrofóbica, apresentando em poucos instantes, melhora em sua respiração e faculdades mentais.

- Me perdoe, senti algo terrível que não pude controlar. Justifica-se Humberto.

- Sente-se melhor?

- Sim, acho que passou.

Os dois caminham em direção a sala aonde ficava o escritório da Termotempo, o andar está inteiramente reformado, o cheiro de tinta fresca exala das paredes. Ao se aproximar do antigo escritório, Humberto hesita por um momento, Almeida percebe que ele treme novamente, só que dessa vez sua boca também espuma como se estivesse convulsionando, seus olhos viraram para trás, transformando-se em esferas cor de leite. Almeida corre para segura-lo, entretanto, no preciso momento que foi prestar socorro ao enigmático homem, ele dispara em direção a janela em uma velocidade sobre humana.

- Humberto! Espere!

- Me deixem em paz. Humberto grita. E atravessa a janela do 12º andar.

- Droga. Almeida pragueja.

Almeida para rente a borda da janela estilhaçada e vê o corpo de Humberto inerte na calçada em uma poça de sangue. Diversos Populares aglomeram-se em volta.

- O que foi isso? Uma voz feminina questiona atrás de Almeida.

- Por favor, não se aproxime, pode ser uma imagem perturbadora para você.

- Suicídio? Ela pergunta mais próxima.

- Sim.

- Trágico.

- Com certeza. Pior que agora tenho mais perguntas do que respostas.

- Eu posso ajudar em algo?

- Depende, você trabalha há muito tempo aqui?

- Mais do que eu queria acredite. Bom, muito prazer, me chamo Valquimar. Diz a moça estendendo a mão.

- Investigador Almeida.

- Muito prazer investigador.

- O prazer é meu. Bom, preciso ir lá embaixo. Amanhã posso retornar e falar com você? Tenho algumas perguntas sobre a Termotempo e o incêndio.

- Claro, estou sempre aqui.

- Combinado, até amanhã.

Durante a descida no elevador, Almeida sente o odor de carne queimada ainda mais forte. Uma vez mais pensa na churrascaria no pavimento térreo do edifício e conjectura algum possível problema entre a exaustão da cozinha e o ar condicionado do elevador.

Almeida passou o restante do dia tratando de procedimentos burocráticos referente ao suicídio de Humberto e somente no dia seguinte, conforme combinado com a Valquimar, voltou ao prédio.

No momento em que pressiona o botão do elevador, Valquimar surge atrás dele novamente, os dois sobem para o 12º andar.

- Está sentindo esse cheiro? Almeida pergunta.

- Não ligue para isso. Responde Valquimar.

- Você sabe de algo sobre o escritório da Termotempo?

- Walfred Georges, sujeito desprezível. Eu o detestava.

- O sócio dele foi o suicida de ontem.

- Meu Deus, Humberto?

- Precisamente. Viemos aqui ontem com o objetivo de procurar algumas evidências.

- Sobre o que?

- Sobre o possível incêndio criminoso deste edifício há quatro anos atrás.

- Não pode ser.

- É o que Humberto afirmava. Entretanto, dificilmente sua palavra valerá alguma coisa.

- Acho que deveria investigar mesmo assim Almeida. Podemos procurar algo no antigo escritório.

- Vamos conferir.

Almeida força a maçaneta da porta e percebe que está aberta. Os dois adentram a sala e vasculham o local.

Por sorte, a sala continha grande parte da mobília do antigo escritório, cobertas apenas por filme plástico e uma densa camada de fuligem.

- Acho que não mexeram neste aqui. Diz a moça enquanto olha alguns papeis espalhados.

- Aparentemente não. Responde Almeida.

- Humberto havia dito algo sobre seguro, se eu conseguisse algum documento, poderia dar corpo a este caso.

- Eu procuro nesta sala e você na outra. O que acha?

- Por que está me ajudando Valquimar?

- Porque acredito que todas as pessoas que morreram aqui, merecem justiça.

- Vou procurar na outra sala então.

Os dois vasculham todo o escritório, cada gaveta, caderno e pasta, e em uma pequena agenda que pertencia provavelmente a recepcionista do escritório, Valquimar encontra alguns números dispostos em forma de código ou coordenada.

- Veja Almeida.

- Parece a senha de um cofre.

- Vasculhamos o lugar todo Almeida, se tivesse um cofre aqui teríamos visto.

- Acho que deixamos passar algo.

- Almeida, atrás daquela mesa, aquele quadro parece não pertencer a este lugar.

- Tem razão. Deixe me ver.

Ao mover o quadro, Almeida deixa a mostra a porta do cofre.

- Já pensou em entrar para a polícia Valquimar?

A moça ri com as bochechas vermelhas.

- Me diga a combinação.

- Dois para direita, cinco para a esquerda e oitenta e cinco para esquerda.

- Abriu. - Almeida exclama.

Almeida e Valquimar examinam cuidadosamente todo o conteúdo do cofre. Um caderno de notas, diversos recibos, uma pasta de contratos, um rádio gravador e dezenas de fitas.

- Vou levar esse material pra casa e examinarei com mais calma.

- Tubo bem Almeida, você sabe aonde me encontrar. Fico feliz em ter ajudado.

- Quando esse caso for solucionado, eu te levo para jantar.

- Combinado. A moça responde sorrindo.

Almeida prepara uma garrafa de café e confortavelmente no sofá da sala de sua casa, passa a ouvir as gravações enquanto vasculha os documentos em busca de alguma evidência. As gravações nas fitas, dão a entender que são escutas do telefone de Walfred Georges. O intuito da gravação no entanto, permanece um mistério.

Em meio aos contratos da Termotempo com toda a sorte de cliente, alguns contratos de seguradoras chamaram a atenção de Almeida, junto com recibos de aluguel de cerca de oito salas no edifício Joelma no nome de Walfred e de Humberto.

As seis diferentes seguradoras indenizariam Walfred em pouco mais de cento e sessenta mil dólares para cada sala locada, ultrapassando um milhão de dólares em apólices.

- Filho da mãe. Pensa.

Neste instante, a conversa entre Walfred e Humberto nas gravações prende toda a atenção de Almeida.

INICIO DA GRAVAÇÃO

(Voz do Walfred)

- Sexta feira agora, dia primeiro, vamos colocar em prática o nosso plano.

(Voz do Humberto)

- Já disse Walfred, não vou fazer isso. É muito perigoso.

(Voz do Walfred)

- Eu tomei o cuidado de não deixar rastros Humberto, além do mais, quer queira quer não, você é meu sócio e qualquer investigação que me focar, invariavelmente chegará a você também.

- Me arrependo do dia que te conheci.

- É tarde demais para se lamuriar, siga o plano e aproveite a fortuna que faremos.

FINAL DA GRAVAÇÃO

- Isso é uma bomba comissário. Almeida diz para o comissário em sua sala.

- É você tem razão garoto. Esse caso nos trará toda a atenção possível. Sobretudo para você.

- O que importa é colocar atrás das grades esse assassino em massa.

- Vou analisar o seu arquivo e deixo-lhe saber o quanto antes investigador.

- Obrigado comissário.

Almeida sai rumo ao Edifício Joelma para contar as novidades para Valquimar. Na recepção, um segurança que ele nunca havia visto, o impede de entrar.

- Preciso falar com a Valquimar do 12º andar.

- Senhor, o andar está completamente desativado.

- Garoto, aqui é polícia. Almeida diz com um ar severo.

- Tudo bem senhor, mas afirmo que não há ninguém lá.

Almeida ignora o jovem segurança e pressiona o botão do elevador.

- Odeio dar “carteirada”. Pensa.

O cheiro de carne queimada torna-se insuportável para Almeida, causando-lhe ânsia de vomito.

Estranhamente, no 11º o elevador para e as luzes apagam-se por um breve momento. Talvez a emoção de concluir um caso dessa importância e tudo o que ocorreu nos últimos dias faz Almeida escutar coisas, ou talvez o forte odor de carne queimada, o fato é que Almeida pode escutar nitidamente o choro de diversas pessoas volteando-o dentro do cubículo do elevador.

- Será que foi essa a sensação que Humberto sentiu naquele dia? Pensa.

Subitamente o elevador começa a subir ainda com as luzes desligadas, no andar seguinte ele para novamente.

Os sons das engrenagens parecem intermináveis para Almeida, lentamente a porta abre e no momento que a luz volta uma imagem aterroriza Almeida por um instante.

Duas pessoas dependuradas de ponta cabeça com sacos amarrados no rosto. Um grito de horror escapa da garganta do investigador.

- Tudo bem? Uma voz conhecida pergunta.

- Acho que fiquei louco. Almeida responde para Valquimar.

- Venha, sente-se aqui. Vou buscar um copo d'agua.

Após alguns minutos, o investigador Almeida se recompõe, embora ele tenha a convicção que aquela terrível imagem jamais será esquecida. E convida Valquimar para o almoço prometido.

- Não posso aceitar Almeida.

- Vamos, eu deixo você pagar se for este o problema?

Valquimar fica com o rosto corado. Tudo bem. Ela diz.

Almeida que não é religioso, reza mentalmente as partes que se recorda do "Pai nosso" enquanto o elevador desce andar por andar. Um suspiro de alivio sai de sua boca quando a porta do elevador abre e o andar térreo encontra-se sem nenhuma visão ou anormalidade. Juntos atravessam a rua e vão em um tradicional restaurante da região central.

- Mesa para um? Pergunta o garçom.

- Para dois oras. Responde Almeida.

- Me acompanhe senhor. Complementa o garçom.

- Aqui está o menu. Quando escolher o pedido, por favor me avise.

- Que garçonzinho mais mal educado. Nem ao menos se importou em lhe entregar um menu. Almeida diz para Valquimar.

- Não se incomode Almeida. Sabe gostei muito de conhecer você e espero que tenha sucesso nessa investigação.

- Isso é o que queria te contar. O meu comissário acredita que eu tenho um caso de verdade.

- Os culpados serão punidos?

- Com as provas que temos? Não há dúvida.

- Isso é ótimo, é o que todos nós queremos.

- Bom, o que vai querer? Pode escolher com o meu menu.

- Almeida, me lembrei que preciso ver algo urgente no escritório, nos falamos depois. Diz Valquimar saindo rapidamente, sem ao menos dar chance de Almeida falar algo.

- Vai entender as mulheres. Pensa Almeida.

Ele volta rapidamente para o distrito policial e para sua surpresa o lugar está cheio de repórteres, o comissário esta de frente ao distrito, fazendo uma declaração para diversos repórteres de diversos meios de comunicação.

- Como dizia, foi o investigador Almeida que levantou as evidências necessárias para indiciar o Walfred Georges, e tudo leva a crer, que o incêndio trágico que marcou a cidade foi iniciado por ele com fins de lucro. Obrigado.

- Venha Almeida. Diz o comissário abraçando-o.

- O que está acontecendo comissário?

- Acontece que a sua investigação deu muitos frutos meu perspicaz jovem, toda a história que você investigou bate e estamos trabalhando nesse momento com a polícia internacional, afim de quebrar o sigilo de contas que supostamente escoaram o dinheiro das apólices para fora do país. Tenho uma viatura que está trazendo o Walfred para cá enquanto conversamos para prestar depoimento.

Isso lhe abrirá muitas portas garoto. Meus parabéns.

- Obrigado comissário.

- Reuni todo o material do caso para você analisar. Tire o restante do dia para ficar a par de todos os pormenores descobertos até agora.

- Obrigado comissário.

Almeida vai para a sua casa, e acompanhado uma vez mais de uma grande garrafa de café, passa a estudar todo o caso.

O relatório dos bombeiros, a lista de empresas que ocupavam o lugar e até mesmo a lista de vítimas é lida minunciosamente pelo investigador. Uma velha página de jornal se solta entre os demais documentos e chama a sua atenção. Um crime cometido no local aonde hoje é o Edifício Joelma estampa a capa do Jornal Sensacionalista com o título:

O CRIME DO POÇO

Dia 23 de novembro de 1948, depois de várias denúncias do estranho desaparecimento das mulheres em uma casa da Rua Santo Antonio, nº 104, região central de São Paulo, o químico e professor Paulo Ferreira de Camargo, com 25 anos de idade, suicida-se no exato momento em que a polícia retirava do poço do seu quintal os corpos de sua mãe, Benedita de Camargo, com 56 anos de idade, e de suas duas irmãs, Maria Ferreira de Camargo, 23 anos e de Cordélia Ferreira de Camargo, 19 anos, pessoas que ele havia matado há 19 dias.

“O Crime do Poço” como ficou conhecido, foi uma vingança de Paulo contra sua família que não aceitava seu romance com uma enfermeira, a qual não era mais virgem, indo totalmente contra os padrões da época, sendo um completo escândalo para a sociedade da década de 1940.

Paulo Ferreira enfrentava constantes brigas com sua mãe e irmãs, as quais eram totalmente contra seu namoro com a enfermeira.

Irritado ao extremo, arquitetou o modo como resolveria aquilo.

Mandou então que fosse construído um poço nos fundos da casa, já como parte do seu plano.

No dia 23 de novembro de 1948, Paulo se reuniu com sua família para lancharem, como normalmente faziam.

De modo furtivo, Paulo colocou sonífero no alimento de sua mãe e irmãs.

Drogadas, elas dormiram rapidamente. Em seguida Paulo peqa um revólver e efetua vários disparos contra todas elas, as quais morrem na hora.

Após o assassinato, Paulo coloca capuzes nas cabeças das vítimas, arrasta os corpos para os fundos da casa, e os joga no poço recém construído. Nos dias que se seguem, Paulo leva uma vida normal.

Passados alguns dias, as pessoas estranham o desaparecimento das três mulheres.

A polícia então visita a casa de Paulo, o qual entra em contradição, dizendo ora que sua mãe e irmãs viajaram, ora que sofreram um acidente.

Vizinhos então contam à polícia que alguns dias antes ouviram barulho de tiros e uma estranha movimentação nos fundos da casa, próximo ao novo poço.

Quando a polícia vai verificar o local, acaba encontrado a horrível cena do crime, com os corpos dentro do poço.

Vendo que não havia mais saída, Paulo Ferreira pede para ir ao banheiro. Chegando lá, pega o revólver que havia escondido nesse local, e comete suicídio com um tiro no peito, deixando para sempre dúvidas e suposições das mais absurdas.

Paulo Ferreira de Camargo era Professor do Departamento de Química da Universidade de são Paulo, a qual se localizava naquela época na alameda Glette. Uma carreira brilhante, interrompida estupidamente.

Descobriu-se posteriormente que o Professor Paulo Ferreira fazia uso de drogas, isso talvez devido ao fácil acesso aos produtos químicos em sua profissão.

Também foi revelado por companheiros de onde lecionava, que o Professor Paulo Ferreira já apresentava à algum tempo um comportamento desiquilibrado, pois andava armado, e segundo constatado, havia efetuado disparos com seu revolver no interior do laboratório de química da faculdade.

Os corpos de Paulo Ferreira de Camargo, Benedita de Camargo, Maria Ferreira de Camargo e Cordélia Ferreira de Camargo, foram enterrados no dia 25/11/1948 no jazigo da família nas dependências do Cemitério da Consolação em São Paulo.

Observa-se que após a retirada dos corpos das vítimas de dentro do poço, um dos bombeiros morreu de infecção cadavérica. Os corpos das Vítimas após terem sido retirados do poço pelos soldados do corpo de bombeiros constatou-se que os corpos estavam de cabeça para baixo com sacos cobrindo suas cabeças.

Instantaneamente a imagem do elevador invadiu a mente de Almeida, fazendo o sangue gelar por todo o corpo. Ele afasta aquele jornal amarelado e com a mão tremula, serve-se de um copo cheio de café e passa a ler o relatório de vítimas dos bombeiros. O horror se instalou em sua forma mais insana quando sua leitura se aproximava do fim e seus olhos chegaram na letra "V":

Valquimar Carvalho dos Santos, 21 anos, solteira.

Ao ler esta linha, o ar faltou nos pulmões de Almeida e sua visão embaraçou completamente.

O relatório policial continha o endereço de Valquimar e sem hesitar, Almeida pegou um taxi a caminho de sua residência.

- Boa noite senhora, sou o investigador Almeida, gostaria de lhe fazer algumas perguntas, se não for incomodo.

- Eu sei quem você é filho.

- Como assim?

- Ela nos contou.

- Mas... Falta palavras para o investigador.

- Tudo bem senhor Almeida, ela pediu para agradecer tudo o que você fez em beneficio a todas aquelas pobres almas. Agora elas podem descansar em paz.

- Não, não pode ser.

Almeida sai desnorteado da porta da casa de Valquimar. O mundo gira a sua volta. Com muito esforço ele entra de volta no taxi.

- Para casa senhor?

- Não, você sabe aonde fica o edifício Joelma?

- Sim senhor.

- Então vamos para lá.

- Ok.

Na recepção do edifício, o segurança assiste hipnotizado a coletiva de imprensa aonde o comissário Nascimento é o interlocutor.

- O acusado confessou o crime comissário?

- Sim, após alguns minutos de interrogatório, o mesmo visivelmente perturbado psicologicamente confessou com detalhes a trama que culminou na morte de centenas de pessoas.

- Escute, você havia dito que não há ninguém no 12º andar?

- Sim senhor, na verdade poucas empresas voltaram as atividades no prédio, a reforma ainda não está 100% concluída.

- Tudo bem se eu der um pulo lá?

- Sem problema algum policial.

Almeida pressiona rapidamente o botão do elevador e ao entrar no cubículo, nenhum odor é perceptível. O elevador funciona corretamente e em poucos instantes alcança o 12º andar.

- Valquimar. Almeida grita.

Ninguém responde. O lugar jaz no mais completo silencio. Ele anda pelos corredores vazios e nenhum sinal de Valquimar. Nesse momento alguns fatos lhe vêm à mente.

O segurança que dizia que não havia ninguém no 12º andar, o garçom no restaurante que ignorou a presença dela completamente, a enigmática conversa com a senhora na casa de Valquimar e por fim o relatório de vítimas dos bombeiros.

Melancolia atinge Almeida como um trem descarrilhado, o que causa esse sentimento não é o fato de que uma mulher morta o ajudou a resolver o caso mais importante de sua carreira, mas sim o fato de estar apaixonado por ela.

NOTA: O conto é baseado no triste acontecimento que marcou o dia 1º de fevereiro de 1974, é recheado de informações reais e o escrevi com o único intuito de prestar minha homenagem a todas as vítimas.

Tema: Fantasmas.