Um conto do irmão da fraternidade

- Confesso que já estou ficando cansado dessa vida dupla - Dizia para sí mesmo enquanto dirigia até Embu das artes. Seu destino era a igreja da Nossa Senhora do Rosario. Seu nome era um nome falso, para que não fosse identificado no mundo real. Eles o chamavam de Marlon. Sempre com a barba por fazer, trajado de terno preto, louro, magro e sempre com uma expressão de que já havia visto o suficiente em sua vida.

Ora, aquela igreja no passado não era católica. A irmandade sempre se reuniu ali, e por isso a igreja contém no altar o símbolo da águia de duas cabeças, que há mais de seis séculos representa a prática da alquimia e a dualidade onde o bem e o mal nunca foram contrários mas sim são entrelaçados pelas escolhas do homem, onde tudo pertence á lei. Tal como as romãs plantadas por todo o local, simbolizando que lá é um local seguro para os que trabalham nas sombras.

Ao chegar na paróquia cerca de 11 horas da noite, outros dois já o esperavam.

- Ela está aí dentro? - Perguntou Marlon antes mesmo de dizer olá.

- Sim. E ela já deu muito trabalho. - Respondeu um deles.

- Antigamente as pessoas tinham respeito por entidades. Hoje em dia todo adolescente quer sair por aí brincando com o que não conhece e dando trabalho pra nós. - Retrucou Marlon.

- Eu concordo, irmão. Mas essa é a nossa missão. Ela é só uma garota boba. Em tudo existe uma razão. Obrigado por ter vindo até aqui.

Ao entrar na igreja, seguiram pelo canto esquerdo até uma pequena saleta. Ao entrarem, lá estava ela. amarrada na cadeira de madeira com a cabeça baixa.

- Sic Transit Gloria Mundi - Disse a garota com voz rouca, sem levantar a cabeça.

Marlon franziu a testa:

- Conhecer nossas frases e em especial a que eu tenho tatuada por baixo do terno não vai te ajudar.

- As marcas de seu corpo não me interessam. Comparado a quantas marcas você tem na sua alma. - A garota começou a erguer a cabeça, a face totalmente desfigurada, pálida. olhava para ele como uma flecha para seu alvo. A garota continuou:

- Eu estava esperando você. Mas precisamos conversar a sós.

Neste momento, os dois outros homens foram lançados para fora da saleta por uma força invisível e a porta fechou com força, trancando Marlon e a garota dentro da saleta. em segundos Marlon retornou seu olhar para a garota, que agora estava de pé na frente dele, solta, segurando a corda com as mãos. Cabelos soltos em frente a face, ela ria como ninguém.

Marlon olhou firmemente para a garota, sem qualquer espanto ou medo e disse as palavras e aramaico:

- Kraal Satán!

Ela parou de rir. Levantou a cabeça. Marlon evitava olhar no olho dela, pois deve-se evitar o contato direto de sua alma com uma entidade negativa, e os olhos são a porta para a alma. Mas enquanto Marlon desviava o olhar, sentiu o tapa na cara. Foi arremessado na parede. Realmente, essa doeu. Ainda no chão, desnorteado, ele tentava se restabelecer.

- Mais uma brincadeirinha de magia e eu te esmago seu bruxinho desprezível! - A voz dela agora era como que duplicada com outra mais grave que a de um ser humano.

- Quem é você? E por qual razão fica parada me olhando? - Dizia Marlon enquanto se levantava.

- Eu não vim aqui pra matar essa garota idiota, nem ficar nela! Eu vim aqui por sua causa! Não queira saber de onde eu venho, nem que história eu carrego! E nem tente começar com as tolices que vocês fazem há 700 anos nessa irmandadezinha mequetrefe!

- O que você quer? Estou ouvindo! Nestes últimos dez anos conversei mais com coisas absurdas do que com gente normal! - Dizia Marlon colocando a mão no rosto por conta da dor do tapa.

(continua)

*OBS: Você pode visitar a igreja descrita no texto e procurar os símbolos por você mesmo. Eles estão lá. A história também.

Marcello Morettoni
Enviado por Marcello Morettoni em 19/10/2016
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