O ESPIRITO NA GARRAFA DE CACHAÇA

Na primeira aula da faculdade, ao se olharem com um pouco de estranheza, aqueles três jovens já sabiam que os próximos cinco anos seriam os melhores de suas vidas, com namoros, farras e uma série de descobertas, tanto do ponto de vista acadêmico, quanto sexual e congêneres. Todos eram de famílias abastadas.

Ainda no primeiro ano de faculdade, durante o intervalo entre as aulas, um grupo de alunos se reuniu no pátio. Ficaram conversando sobre coisas triviais até que alguém começou a falar da lenda da Mulher de Branco. Como é notório, esta incrível criatura está presente em quase todas as culturas existentes com algumas adaptações específicas. Acontece que a lenda neste caso tinha um pouco mais de veracidade. Tratava-se da história de Enya, uma jovem linda, de olhos azuis, cabelos ruivos e pele clara. Há dez anos havia sido estuprada e assassinada no camping da faculdade, durante uma festa regada a álcool e drogas. Nunca descobriram os culpados, mas a perícia constatou que era provável que vários a tenham violentado.

Após o ocorrido, sempre que alguma coisa estranha ocorria, os moradores da região logo tratavam de culpar o fantasma da Enya, por mais estranho que possa parecer e assim crescia a lenda da Mulher de Branco, a bela garota morta em uma festa, que no ato de covardia que tirou sua vida, vestia saia e blusa brancas.

Certa noite, após mais uma longa festa onde imperou o caos, o sexo e a distração, um dos amigos, chamado Paulo, chamou os outros para fazer uma brincadeira que chamou de "tirar espírito da garrafa de cachaça". Paulo colocou no centro deles uma garrafa de pinga e começou a fazer gestos em cima dela, emitindo sons como se estivesse cantarolando cânticos árabes. Depois falou:

— Te ordeno que saia desta garrafa coisa ruim!

Pegou um fósforo, riscou e jogou dentro da garrafa. Uma chama azulada surgiu rapidamente de dentro da mesma, fazendo um estridente barulho. Por alguns segundos eles se entreolharam, pois pareceu surgir de dentro da garrafa uma figura espectral, lembrando o corpo de uma mulher. Logo o vulto sumiu, os amigos gargalhavam e rebolavam, comemorando a saída do "espírito".

Os três ficaram ainda um bom tempo bebendo e contando causos variados, mas foram interrompidos por um barulho no interior da casa, como se alguma coisa tivesse sido estilhaçada. Como não tinha ninguém no interior da residência, eles foram verificar o que tinha acontecido e viram que um grande espelho da sala estava quebrado. Um deles ainda falou sorrindo que deveria ser o espírito libertado e continuaram a bebedeira até esgotar a última gota de álcool.

Uma semana após a festa, Paulo estava indo para a faculdade em alta velocidade no seu carro quando surgiu de repente um vulto branco em sua frente. Em puro ato de reflexo, virou a direção bruscamente e o carro acabou se espatifando junto a um poste. Paulo morreu imediatamente. Câmeras de segurança não mostraram nenhuma pessoa ou animal passando em frente ao veículo, mas no interior foi encontrada uma garrafa de cachaça, que estranhamente exalava um odor de queimado.

Um mês após o ocorrido, Wesley, outro dos três amigos que promoveram a farra da libertação na cachaça, estava nadando no mar quando sentiu uma presença a sua volta, ficou todo arrepiado e resolveu ir para um local menos profundo. Começou a caminhada e algo segurou suas pernas, lhe puxando para dentro do mar; com medo de que fosse um tubarão ele começou a gritar por socorro. Logo um salva-vidas foi ao seu encontro, mas já era tarde, Wesley se afogou. Ao tentar fazer respiração boca a boca, o salva vidas notou que Wesley estava com hálito de cachaça. No seu pescoço havia marcas de queimaduras recentes.

O último dos amigos era Sandro. Após os acontecimentos nefastos ocorridos com seus amigos ele passou a viver quase que inteiramente recluso, deixou inclusive de frequentar a faculdade. Mesmo em casa, sente com frequência cheiro de queimado e cachaça e vez ou outra enxerga um vulto branco, que parece cada vez mais perto, como se ganhando força, ouvindo vez ou outra um som gutural que parece ressoar: "finalmente livre".

Crowvox
Enviado por Crowvox em 22/04/2017
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