DONA IPÊ - A MORTE DE GIL - 1ª PARTE

A tarde aproximava-se, quando encostou um carro de praça, bem em frente da casa, que estava fechada desde que seu Hilário viuvara. Já se passara, pelo menos uns 8 anos, desde que dona Amelinha falecera, dizem que fora desnutrição, ela não gostava de comer, de falar e tão pouco de visitas. Dentro da casa estava toda a mobília, que era simples.

O velho cadeado, já bastante enferrujado, não abria.

A senhora que descera do carro de praça (assim eram denominados os táxis de hoje), já estava ofegante, de tanto forcejar. Impaciente, pois queria entrar com seus dois filhos pequenos e três malas, daquelas de madeira, com arestas de metal, bem antigas por sinal.

O vizinho do lado aproximou-se tentando saber o que ela queria fazer ali. Disse ela:

- Meu marido abandonou-nos por uma sirigaita, então venho à capital tentar melhorar a vida, pois lá na fronteira as coisas estão difíceis.

O seu Hilário sabe disto? indagou o vizinho. Claro pois ele é meu primo.

O vizinho apertou a bochecha do menino mais velho, tentando descontrai-los, pois encolhiam-se tanto, que já estavam quase dentro das malas.

Dizendo que iria buscar uma serra, lá se foi ele e voltou quase no mesmo pé. Serra para lá, serra para cá e o cadeado partiu-se.

Com o portão aberto entraram as malas, a senhora, os dois meninos e

o vizinho.

Nem precisou virar chave na porta, pois já estava destrancada. Num gemido interminável ela foi arrastada, até ficar escancarada.

Os poucos móveis estavam cobertos por panos que um dia foram brancos. Havia teias de aranhas para todos os lados. Cansados, suspiraram e sentaram sobre as malas, havia muito o que fazer, mas primeiro tinham que descansar. Pelo trem, foram da fronteira com o Uruguai até Cacequi, depois até a capital, quase um dia em bancos de segunda classe.

Não deu nem meia hora e lá estava o vizinho de bule de café com leite na mão e algumas fatias de pão, já amanteigadas e com uma fina lâmina de chimia, e ofereceu à mulher e aos dois garotos, que ainda estavam sentados sobre as malas.

Só então apresentaram-se, o vizinho como Apolinário, ela como Ofélia e os dois pequenos como Gil e Zeca. Sobre o café dona Ofélia disse preferir um chá de flores de Ipê roxo, no que foi contrariada pelo vizinho, que disse nem conhecer tal planta e assim foi obrigado a ouvir um tratado sobre as propriedades de tal árvore, inclusive as medicinais. Então sem as flores ela serviu-se do café com leite.

Os dias passaram-se, Ofélia matriculou as crianças na escola, logo em seguida empregou-se num banco, como a senhora do cafezinho, embora naquele tempo dessem-lhe outras atribuições.

Enquanto arrumava a casa, repunha as vidraças e substitui-a algumas tábuas já apodrecidas, ela conseguiu duas mudas de ipê roxo, uma ela plantou na frente da casa e a outra ela fez com que Norinha, plantasse na sua casa. Norinha, esposa de Apolinário, não tardou para aderir aos chás de flores de ipê e para tanto, juntava as flores na Primavera e desidratava-as para que tivesse chá o ano todo.

Enquanto dona Ofélia não estava por perto, a vizinhança referia-se a ela como dona Ipê, de tanto que ela alardeava suas propriedades.

Gil era um aluno de médio desempenho na escola, fazia amizades com facilidade e de certa form parecia um pouco ingênuo, o que lhe rendeu alguns contratempos ao ser passado para trás.

Aos 14 anos, para ajudar no sustento da família, arranjaram-lhe um emprego como estagiário no mesmo banco onde sua mão trabalhava, mas mesmo assim continuou jogando no time da gurizada da vila, jogos que aconteciam aos domingos pela manhã. Claro que tal regalia era condicionada a presença dele, nos cultos aos sábados.

Os vizinhos admiravam-se da disposição e coragem que ela tinha, pois criava dois filho com um salário miserável, morando de favor.

Depois os vizinho souberam que um dia o Hilário apareceu e pediu a casa, ms ela bateu pé e não devolveu-lhe.

Zeca, que tinha a metade da idade do Gil, não ia bem na escola e não gostava de ter amigos, bem diferente do irmão mais velho.

Primeira Parte - Dona IPÊ, do conto policial: A morte de Gil.

ItamarCastro
Enviado por ItamarCastro em 14/07/2017
Reeditado em 17/07/2017
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