A volta do degredado.

Fui austero presidente

De um país peninsular

Deixei o povo doente

A muitos mandei matar

Prendi o meu concorrente

Para livre eu governar.

Deixei fazer arruaça

Até dentro do palácio

Muita maconha, cachaça,

Mulheres de vida fácil

E também saí à caça

Para ver fera no laço.

Todo o meu divertimento

Era feito de amargura

Sufocava o pensamento

Que pra mim era tortura

Desprezava o alimento

Não gostava de água pura.

Preferia andar de bote

Pra não ser incomodado

Procurava alguém com dote

Pra dele ser convidado

Lhe mandava um papelote

Com meu nome rabiscado.

Eu queria andar decente

Mas alguém aconselhava

Você é o presidente

E assim me esculhambava

Eu assim era inocente

Mas alguém me dominava.

Ao chegar a eleição

Eu subia nos palanques

Escondia a ambição

Prometendo doar tanques

Pela minha enganação

Punha culpa nos Ianques.

Muito tempo eu governei

Sob o freio e o chicote

Mas um dia eu fracassei

Fiquei preso no meu bote

E assim renunciei

Ante um que era mais forte.

Pra sair do meu país

Tive de abdicar

O errado que eu fiz

Planejava consertar

Entretanto o que se diz

Fui capaz de me matar.

Fui malhado todo dia

Sem jamais poder falar

Escondi minha agonia

Estava a recuperar

Vivia o meu dia a dia

Vendo o dia clarear.

Via o sol e via a lua

Cada um no seu horário

Via o clarão na rua

Onde passa o operário

Havia a multidão nua

Precisando de salário.

Via a cela da prisão

Apinhada de obreiros

Que caíram no desvão

Porque não tinham dinheiro

Já sabiam de antemão

Iam ser prisioneiros.

Todos eles malfadados

Triste sina os esperavam

Seriam logo enforcados

Disso não desconfiavam

Mas também ser libertados

Nisso não acreditavam.

Eu então entrei em cena

Chutei o pau da barraca

Retirei da quarentena

Quem sabia fazer faca

E mandei fazer centenas

Conhecia a porta fraca.

Preparei a invasão

Para o dia de finados

Dei a recomendação

Não queria machucados

Toda aquela operação

Feita só por degredados.

Eu também recomendei

Deixe o tirano em paz

Tudo aquilo que passei

Pra ninguém quero, jamais,

Se pro meu país voltei

Foi pra promover a paz.

Ponham a mão na consciência

Nunca façam o que eu fiz

Estamos na iminência

De fazer como eu quis

Só com força e paciência

Voltaremos pro país.

Ao entrarmos no palácio

Encontrei um lutador

Que me estendeu o braço

Com um sorriso encantador

Eu fiquei como um palhaço

Com tal prova de amor.

Era um pequeno infante

Com dois anos de idade

Carregava no semblante

Sinais de felicidade

Dizia de agora em diante

Vou ser dono da cidade.

Eu perdi a minha guerra

Mas ganhei um aliado

Eu reconquistei a terra

Dei ao povo resultado

Aprendi no que se erra

Serve de aprendizado.

Renato Lima
Enviado por Renato Lima em 07/10/2017
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