Simples Despertar

A manhã era um presente a cada dia e ela a recebia com o coração cheio da presença de Deus. Confiava plenamente neste Deus, mas naquele dia, especialmente, seu olhar vagava pelo céu azul, procurando um amparo, um sinal, uma luz.

Um dia cheio de projetos, mas também de muitas lutas. Nenhuma novidade: com a experiência de vida, já aprendera que as pequenas vitórias e derrotas se constituem em emoções que pontuam o estado da alma.

O sol agora já coloria tudo, trazendo pequenos raios brilhantes por entre as vidraças da janela de seu quarto. Um espetáculo que se repete e que nem por isso se torna semelhante. É a vida que penetra em seu mundo, o mundo de todos nós e nos traz a energia para que se possa seguir adiante.

Espreguiçou-se languidamente, concluindo não poder se permitir mais permanecer naquele estado de cômoda letargia. Era preciso agir. Olhos e ouvidos já se encontravam atentos aos primeiros ruídos e sinais daquela jornada que se iniciava.

Mas, apesar de tudo, de toda reflexão, de toda fé, sentia-se cansada. Era como se o mundo estivesse à parte e ela ali, sozinha. Difícil era caminhar. Mecanicamente se dirigiu à cozinha, que ainda conservava os aspectos da algazarra da véspera. Sorriu, apesar de suas preocupações, ao lembrar do dia anterior. Calmamente, começou a colocar em ordem uns poucos objetos que quebravam a harmonia daquele ambiente.

Sentiu saudades, uma saudade profunda, intensa que lhe fazia doer sua cabeça já meio confusa. Ultimamente, esta torrente de sentimentos sempre lhe invadia a alma. Algumas lágrimas desceram-lhe pela face, denunciando uma tristeza que insistia em se fazer companhia.

Já era dezembro. Sentia-se estranhamente só. Dezembro era mensageiro de muitas e estranhas sensações. O Natal se aproximava, o que sempre exige rostos felizes e troca de presentes. Nada disto fazia parte de seu universo naquele momento. Não tinha vontade de cantar, de comprar grandes e dispendiosos presentes.

Queria estar ali e uma música ao fundo, vinda da rua ou de algum apartamento próximo lhe aguçou os sentidos. Pessoas que se vão, que não voltam, que partem sem nem mesmo se saber o motivo. Etapas que se fecham, um mundo que se descortina, do qual ela fazia parte, atuante, protegendo, agindo, decidindo.

Era este o motivo de sua solidão. Refletia e se via ainda criança, encantada com o calor daquele mês tão cheio de novidades. Sensações há muito não sentidas. Os coloridos enfeites que adornavam as ruas do bairro onde habitara. Saudade da inocência perdida.

Mas, hoje estava ali, já não tinha certeza de tanta coisa! Velhos hábitos foram substituídos. A música também era outra. O sol se apresentava diferente. E o dia por vir, não era de brincadeira. Tudo muito real, tudo muito claro e objetivo.

Calmamente fez sua refeição matinal, tomou um banho quente e se vestiu corretamente para mais um dia de trabalho.