Crônica VII: Loucas por Chimarrão

Aventuras da Mochileira Tupiniquim

Ana Esther

Loucas por Chimarrão

Outubro de 1987. Minha mãe e eu saímos de Porto Alegre em um ônibus de excursão rumo a Guarapari no Espírito Santo. Como em toda a excursão, antes de chegarmos ao destino principal, passamos por vários pontos turísticos ao longo do caminho. E por estes caminhos a última vez que compramos erva-mate para o inseparável chimarrão foi em Curitiba. No Rio de Janeiro quando fomos fazer um pequeno ranchinho para a viagem até Guarapari –mochileiros que se prezam sempre pensam em economizar dinheiro, peso e volume- desdenhamos o pacote de erva-mate pois ainda tínhamos um pouco e achamos melhor deixar para comprar mais somente em solo capixaba. Cruel engano!

Ao chegarmos em Guarapari, um calor gostoso nos atraiu para a Praia das Castanheiras. Com aquela sombra maravilhosa e um mar fabuloso nada mais natural do tomarmos um bom mate amargo em baixo de uma frondosa castanheira. E a roda de chimarrão rendeu bons papos com os colegas de excursão, todos gaúchos, naturalmente.

Retornando ao hotel percebemos que a erva-mate havia acabado. Sem nenhuma suspeita macabra decidimos dar uma camihadinha até algum mercado próximo e comprar um quilo. Na recepção fomos avisadas de que não seria fácil encontrarmos tal produto em Guarapari. Imaginem, que bobagem, pensamos nós surpresas...

Totalmente atônitas constatamos que realmente nenhuma bodega oferecia a preciosa erva-mate. Não acreditávamos que um produto de primeira necessidade fosse tão escasso por aquelas bandas. Que fazer? Nossa indignação foi tamanha que falamos para Deus e o mundo sobre a falta de erva-mate que assolava o mercado local. Tanto nos clamamos que alguém com um sorriso maroto indicou-nos um armazém cujo dono era um capixaba mateador, raridade sem par. Ele adquirira o hábito de matear com um amigo gaúcho morador de Garapari e quiçá único comprador do produto exótico.

A pé, cruzamos Guarapari inteira, atravessamos uma ponte, passamos por um estaleiro artesanal de barcos típicos e todos confirmavam, há quilômetros, que o armazém era logo ali. Com determinação ferrenha após horas de caminhada chegamos lá. E não é que o dono era mateador mesmo? Lá estava a cuia dele no balcão para provar. Aleluia! Nosso esforço foi recompensado. Outro cruel engano... O simpático mateador informou-nos com tristeza genuína que seu estoque de erva-mate estava quase zerado, não havia mais pacotes à venda, só um tiquinho de nada para seu próprio uso. Mostrou-nos consternado a caixa de isopor onde vimos estarrecidas menos de um quilo de erva-mate bem lá no fundo! Porém, graças à santa intervenção da Nossa Senhora Gaúcha do Mate, o bondoso comerciante nos presenteou com meio quilo de erva-mate.

Saímos de lá com a promessa de que tão logo retornássemos ao lar no Rio Grande do Sul retribuiríamos o gesto nobre do amigo. Enquanto isso, o meio quilo teve que durar até chegarmos novamente a Curitiba, um sufoco. Nada de roda de chimarrão, tomávamos nosso mate amargo no quarto do hotel sem fazer propaganda para os outros gaúchos que reclamavam da falta de chimarrão naqueles lindos pagos. Ah, é claro que pagamos nossa promessa, enviamos alguns quilos de erva-mate ao mateador capixaba, nosso salvador!

*Escrevi esta crônica em 10/04/2011.