NO TEMPO DOS PIRILAMPOS

Era na altura, do princípio do verão, que na aldeia tudo mudava, para melhor é claro. Os dias estavam mais bonitos, mais compridos, o ar cheirava a alecrim, rosmaninho, e palha fresca. Os trigais já tinham sido ceifados, o trigo amontoava-se na eira, em molhos, á espera da chegada da máquina debulhadora, que todos os anos vinha e se instalava no mesmo local, para proceder á debulha do trigo.

Eram momentos de brincadeira e excitação para as crianças que vinham atrás da máquina em alegre correria até a ver preparada para começar a sua faina e todos os dias se afadigavam a ver como o trigo corria no bocal para encher os sacos de linhagem e os fardos de palha eram transportados no tapete rolante, até serem retirados e empilhados.

Mas o melhor de tudo eram os serões, as noites deitada no mato fresco com cheiro de alecrim com que a minha mãe atapetava o pátio agora coberto de cimento e há muito esquecido de como era estar verdejante e cheiroso.

O meu pai trazia uma manta de retalhos que estendia em cima do mato em frente á casa. Não havia electricidade, nem televisão, nem rádio sequer e os computadores só faziam parte da ficção cientifica da qual aliás só viria a ser apaixonada anos mais tarde, já adolescente.

Em cima da manta estendiamo-nos a olhar as estrelas, a contá-los, a ver a lua brilhante, a sentir a brisa morna. e o meu pai contava-me histórias. Falava-me das estrelas, e como á volta delas - que eram sóis- existiam outros planetas, outras terras, com outras pessoas que viviam lá. Mostrava-me o braço prateado da Via Láctea, que se estendia para sul e uma vez até me acordou de madrugada e á minha irmã, para irmos ver um cometa, no céu por detrás da casa.

O meu pai era um sonhador, e ensinou-me a sonhar. Ensinou-me a amar a leitura e os livros, e a escrever.

No entanto, o maior encanto daquelas noites, eram os pirilampos. Pequeninas estrelas brilhantes voadoras, que perseguiamos, eu e a minha irmã e apanhavamos, fechadas na palma húmida da mão.

Palpitavam com os seus corpos pequenos e macios, brilhantes, entre os dedos. Corriamos a metê-los debaixo de copos voltados ao contrário, porque nos diziam que de manhã estariam lá moedas.

Na verdade estavam....mas era a minha mãe que as colocava lá. Iamos felizes á mercearia da aldeia comprar rebuçados. Um dia eu descobri que era a minha mãe que colocava as moedas, e dispensei os pirilampos como desculpa. Fui buscar as moedas e comprar os rebuçados. O pior é que fui descoberta e levei uma tareia pelo pequeno delito. Claro que me senti injustiçada. Mas pelo menos deixei de sacrificar os belos pirilampos, estrelas aladas da minha infância.