CRÔNICA PARA MINHA MÃE

Algumas pessoas têm facilidade de expressar sentimentos. Outros os guardam por timidez, por dificuldades de se expor, sendo mais fácil se expressarem através de atitudes do que por palavras. Entretanto os gestos, à vezes, são mal interpretados. As palavras até poderão ser, também, dependendo do momento ou do contexto. Porém, parecem ser mais facilmente compreendidas do que os gestos.

Muitas vezes percebemos que deveríamos ter falado certas coisas ou expressado determinados sentimentos e não o fizemos por barreiras internas, perdendo oportunidade enquanto ainda havia tempo para fazê-lo.

Por ocasião de datas especiais como esta, Dia das Mães, observamos que algumas pessoas escrevem, homenageando seus entes queridos, após eles já não estarem mais entre nós. É uma necessidade de quem escreve.

Aprendi que gratidão e reconhecimento são sentimentos que se manifestam na maturidade. Por isto, resolvi escrever, enquanto há tempo,e estas palavras possam ser lidas pela sua destinatária, por quem desejo expressar gratidão.

Não vou falar de perfeição, porque ninguém é perfeito. Desejo ressaltar a importância dos sonhos e da luta para realizá-los.

Refiro-me a alguém de família humilde, filha de um operário (funileiro) e uma dona de casa que se dedicava a dar aulas particulares em casa. Por isto e pela impossibilidade de oferecer escola para os sete filhos do casal que sobreviveram às doenças e dificuldades da época, estes foram alfabetizados em casa, com exceção de uma que freqüentou a escola por algum tempo. E, esta não foi ela. Isto não foi motivo de dores nem mágoas. Ao contrário, é grata por ter aprendido o que lhe proporcionou um dos maiores prazeres ao longo de seus 81 anos: a leitura o que a tornou uma pessoa capaz de se comunicar com clareza, interagir, freqüentar qualquer local com a maior dignidade. Foi capaz de falar de cinema, esporte, política, música com qualquer pessoa. Falo no passado, porque hoje os problemas com a memória já a impedem de ter o mesmo desempenho.

Dona de uma caligrafia invejável, admirada até por quem tinha curso superior, escrevia muito para aprender mais.

Batalhou com todo empenho para que os filhos estudassem e se formassem.

Na época do grupo escolar, se não havia dinheiro para o tecido do uniforme branco, era do lençol que ele era confeccionado; se não era possível comprar livros novos, era o usado que ela ia buscar, o curso de idiomas era realizado através de bolsa fornecida pelo consulado em Porto Alegre, para quem ela escrevia cartas solicitando a concessão.

Todos estes recursos permitiram que dois dos seus três filhos tivessem mais de um curso superior, além de quatro netos, hoje também formados e outros dois próximos desta conquista também. Por isto, várias vezes disse aos meus filhos, que se hoje eles podem usufruir de coisas que lhes proporcionei ao longo da vida, se estão formados, trabalhando, sendo pessoas responsáveis, dignas, produtivas, que agradeçam ao esforço da avó, cuja luta me permitiu ter uma vida infinitamente melhor do que a dela, em vários aspectos, embora ela jamais se queixe das dificuldades pelas quais passou e sempre demonstre agradecimento e amor pela família unida em que nasceu.

Por tudo isto, nesta data, achei que seria o momento apropriado, para repetir:

Obrigado por tudo, Mãe.

Com amor...

Este texto foi dedicado à minha mãe em 2007.

Isabel C. S. Vargas