CRÔNICA DE UMA PROFESSORA: Uma Experiência Surpreendente!

Por: Tânia de Oliveira
Na época eu ensinava Filosofia em escola pública. Era mãe de três filhos e o dinheiro era curto. Até que uma coordenadora pedagógica, colega de trabalho do Liceu Alagoano me convidou para trabalhar em uma escola particular da afilhada dela. Deu-me um bilhete de apresentação e fui alegre me apresentar na escola que estava ainda em processo de abertura.
Ao chegar na escola vi uma fila enorme de pessoas que estavam se candidatando a fazer teste. Pensei então em fazer o teste e esperar o resultado confiante que assim surpreenderia a direção. E assim fiz. Fiz a prova escrita fiz a oral o que me colocou entre as primeiras classificadas. Aí sim, mostrei o bilhete de apresentação o que deixou a proprietária surpreendida, pois viu que eu não precisava ter passado por todos aqueles testes já que sua madrinha era criteriosa e uma indicação dela era suficiente. E essa confiança gerou uma maior aproximação entre nós.
Fui inteirada de que o colégio iniciaria apenas com turmas do Ensino Infantil até o 4ª série ( Hoje 5º Ano) e depois se expandia de poucos alunos iria até o Ensino médio. Fiquei feliz com uma turma de 4ª série . Pensei em colocar toda minha experiência de professora em funcionamento. Preparei um Plano de Ação dentro do currículo com possibilidades de um Planejamento rico com temas transversais em ação para uma educação significativa.
Fiz amizade com os outros professores e criamos um clima de harmonia com reuniões periódicas tanto entre nós educadores como também com os pais, onde as donas do colégio ouviam nossas sugestões e construíamos um clima de harmonia entre todos.
Com menos de um mês descobri que estava grávida. Fiquei receosa de ser rejeitada pois ainda não havia um contrato formal. Mas esse receio foi logo dissipado. Ao contrário, pois além de me aceitarem ainda contrataram meu esposo que na época que era Professor .
Esse clima de paz foi uma constante até o dia que contrataram a pessoa que seria a Diretora do Colégio. Logo na primeira reunião, naquele clima de positividade e amor onde minhas colegas me tratavam com carinho especial. Ela me lançou um olhar desafiador, mostrando abertamente sua antipatia à primeira vista. Desdobrei-me em atenção. Preparava minhas aulas com o maior zelo e a elogiava tentando desfazer aquele clima crescente de rejeição.
Tudo caminhava em oposição ao sonho que eu havia formatado para minha nova experiência. Nas reuniões ela fingia que ouvia minhas sugestões mas na realidade desviava meus passos para outra direção. Sempre negava minhas sugestões e depreciava minhas iniciativas.
Certo dia a auxiliar de disciplina falou que ela, a Diretora, queria falar comigo. Era hora de intervalo e subi até sua sala no primeiro andar. Ao indagar ela falou não era nada e que eu podia descer. Depois me chamou novamente. Dessa vez me disse que a dona do colégio iria aniversariar e que ela estava planejando uma festinha surpresa. Seria um momento descontraído só com as pessoas do colégio com uma cervejinha e alguns tira-gostos. Perguntou se eu podia trazer um peixe frito grande decorado. Fiquei animada disse que sim e saí satisfeita, pois chegou a oportunidade de ser gentil...
Caprichei. Mandei preparar um prato bonito e qual não foi minha surpresa quando ao chegar à festa vi tudo estavam decorados com bolos, tortas, docinhos e refrigerantes. Ao chegar com o peixão na bandeja ela foi a primeira a apontar e dizer rindo: - que ridículo trouxe um peixe? Eu falei que trouxesse docinhos...? Não a desmenti. Olhei-a profundamente, sentindo vontade de chorar, de sumir daquela situação constrangedora. Mas como as colegas eram amigas logo se desfez aquele clima. Apenas minha alma continuou entristecida sem entender o porquê daquela antipatia gratuita.
Passaram-se os dias onde eu evitava qualquer forma de desagradar a minha chefe. Mergulhei na minha tarefa de ser uma boa educadora e fui cativando pais e alunos. Até que chegou o mês de abril que datava meu aniversário. Os alunos e alunas se alvoroçavam em fazer uma festa surpresa. Embora criança não consiga guardar a ansiedade. As meninas me ligavam dizendo: - “Fessora” vamos fazer uma festa surpresa no seu aniversário e como é dia do índio o bolo vai ser uma aldeia e a gente vai vestida de índia. E riam!
Muito feliz eu aguardava o Dia do Índio! Mas foi desolador. Nem cheguei a ver meu bolo. Na portaria mesmo, me disseram que eu nem entrasse na minha sala e fosse direto para a diretoria. Ainda me passou na cabeça que aquilo fizesse parte da surpresa...
Entrei na sala e encontrei a Diretora de costa na cadeira. Virou-se de repente e me olhando friamente, melhor, diabolicamente, falou com voz irônica e pausadamente: Você está demitida! Meu coração disparou e por um momento pensei que aquilo era um pesadelo. Consegui dizer entre dentes:- Porque? Onde errei? Qual o motivo? Ela empurrou alguns papéis da demissão, enquanto eu argumentava quase desesperada: - não podem demitir uma pessoa grávida, sem motivo? E ela me surpreendeu dizendo; O colégio está disposto a pagar multa qualquer coisa, mas não queremos você aqui mais! E continuou dizendo: - Coloquei a questão para o colégio: - Aqui ou eu ou você! Supliquei o motivo a razão de tanto ódio...e ela simplesmente me respondeu: - Não existe motivo, simplesmente não a suporto, só isso!
Tentei falar com as irmãs donas do Colégio. Nenhuma delas, para surpresa, quisera me receber. Que houve? Pareciam gostar tanto de mim. Desci os degraus tremendo, tomei um táxi e cheguei em casa soluçando.
Fui ao Ministério do Trabalho. Tentamos uma conversa, conciliação. Eles estavam irredutíveis. Não queriam minha presença no Colégio. Fizemos um acordo. A dor me acompanhou durante toda a gravidez e até hoje me dói falar sobre isso. Mas a história não termina aqui.
Anos depois, recebo a triste notícia que a filha de uma grande amiga e conterrânea de Viçosa estava no Hospital se ultimando devido a uma infecção generalizada. Livinha que me chamava de tia estava morrendo e todos estavam desesperados: família, amigos, o namoradinho e a sogra que a adorava. Fui até o hospital. E na recepção da UTI além da dor da trágica situação estava a minha algoz. Ela era a sogra de minha “sobrinha”. Quando ela me viu abafou um grito: Você?
Livia tinha 15 anos e morreu. No velório ela, a sogra, a minha algoz, chorava copiosamente. Soube que ele era filho único, e ambos a adoravam. Tudo foi muito doloroso.
Após o enterro entre covas, ela me puxou e chorando desesperadamente me pediu perdão. Falou que fez horrores comigo. Mentiu para a dona do colégio dizendo coisas que nunca fiz. Que eu ditava textos comunistas para os alunos(as). Que eu a contestava desafiadora, não a respeitava, nem a considerava! Mentiras, calúnias... Enquanto ela desesperada me pedia que em nome da Livinha eu a perdoasse eu simplesmente balbuciei uma pergunta: - Por quê você fez tudo isso? Que lhe fiz?
Ela me respondeu de cabeça baixa:
- O motivo foi que senti um certo despeito desde o momento que entrei no colégio! Desse seu jeito, de seu carisma, da amizade que todos de lá tinham por você!
- Por Favor me perdoe!
Levantei os olhos, balancei a cabeça, ainda chorando a morte de Livinha somei aquela situação surpreendente e sai sem entender muito como pode acontecer coisas desse tipo na vida real!
Tânia de Oliveira
Enviado por Tânia de Oliveira em 27/07/2014
Reeditado em 20/11/2016
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