A conservadora e o causo da bolsa

Não era de seguir tendências, modismo. Do meio que fazia parte, se a aceitavam era porque um pouco dela, eles carregavam, e vice-versa.

Dia desses ela se deu mal. Precisava urgentemente de uma bolsa. Teria um caso de amor eterno com esse objeto, não fosse ele não a levar a sério.

As bolsas se desgastam numa velocidade maior que temos capacidade de processar uma história. Digo, sentimento. Fiel amiga de tantos encontros, desencontros e encantos, aquela bolsa não dava mais para usar. Estava zuada, completamente deteriorada.

Sendo garota, não fazia questão da mudança de bolsa a cada troca de roupa. Pois bem, lá foi ela atrás de uma nova.

Engraçado, mulher é meio canguru, tem que ter certeza que ao sair de casa esta preparada pra levar a vida dentro de um "saco".

Entrou numa loja e se deparou com aquela variedade de modelos, como sempre, só pra ferrar a gente.

Perderia um tempo que não tinha, procurando o bem desejado, comparando mínimos tons e detalhes.

Ela estava atrás de uma bolsa de couro, preta e com arrebite prata. Achou uma, vermelha, de couro e arrebite dourado. Não hesitou. Seria essa que levaria.

Foi pra casa. Emocionada, realizou o rito de passagem de uma bolsa para outra.

A última homenagem; agradeceu aquela que jazeria em algum aterro. Cemitério do excesso que dispensamos do que não nos serve mais.

E, como era de se esperar, e o relacionamento já havia ido para o ralo, o melhor seria decretar logo o fim. Lançou no lixo. Cresceu vendo a importância das mudanças, consertando, renovando e o que não dava, indo pra terra do jaz.

(na manhã seguinte incomodo e martírio)

Saindo pro trabalho com a nova bolsa , ela se achando toda prosa, percebe pelas transeuntes no caminho algo que não a anima... Um festival de bolsa igual a cor que ela comprara.. Tripudiou. Na hora, ficou vermelha de raiva. Caíra na armadilha. Não era mesmo de trocar de bolsa, mas se tem algo que a ela causava fobia, era o fato de andar pela rua com uma mesma peça de acessório ou vestuário. Não tinha pretensão alguma em se dispersar na multidão sendo igual a John Malkovich. Dizia ainda, Vá lá se eu pertencesse a um time. Para esse tremor, certamente algum psicólogo viria com alguma resposta. Ouviria apenas Nietzsche. Decidiu que compraria outra, não suportou dois dias a ideia de dependência do tal presente que se dera, parecia um encosto em agonia. Foi a caça de uma nova bolsa.

Por onde quer que olha-se, vermelho, o tom lá estava. Bolsa, sacolas, sapatos, cabelo colorido, até os rubros carros em seu ato falo a perseguiam. Indo de loja em loja, já um tanto transtornada, via a coisa desandar. Nada. Mas nada mesmo a agradara. Tremor, prenuncia as palpitações, o suor escorria. Levou a mão direita ao pescoço, faltava o ar. Uma sinfonia, quem sabe, "La Traviata" combinava com a ânsia e sensação estranha, puro incomodo no estomago. Começava ver tudo girar. Queria gritar, mas como, se se sentia sufocar? Suspirou, parou numa esquina, não que ela queira, mas subjugada por sua natureza, naquele momento, se tornara a presa. A batalha nesse dia, teve outro vencedor. Deixou pra lá. Por hora, melhor não pensar mais nisso. Voltou pra casa com a bolsa vermelha, em passos minimalistas.

Sandra Frietha
Enviado por Sandra Frietha em 27/09/2014
Reeditado em 30/09/2015
Código do texto: T4978964
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2014. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.