CUIDADO COM O AGENTE FEDERAL INFILTRADO

Lembro bem do Regime Militar. Minha adolescência toda e parte de minha juventude deu-se nesse período e eu morria de medo. Sim, medo, muito medo. Principalmente porque minha família precisava de meu salário mínimo mensal para ajudar na feira e a possibilidade de ser preso pelos militares implicaria em prejuízo e angustia para minha sofredora mãe. Confesso também que quando adolescente não tinha nenhum interesse por política, meu negócio era trabalhar, estudar, namorar, jogar futebol e beber cachaça – Não necessariamente nessa mesma ordem. Meu amor pela minha família, principalmente pela minha mãe e pelas minhas irmãs pequenas, fez de mim um estudante e trabalhador aplicado, em paralelo, minha mente vadia fez de mim um Don Juan da periferia e um pinguço brincalhão.

Mas foi em 1977 que entrei, “de prima”, na faculdade. UECE- Universidade Estadual do Ceará, curso de Administração de Empresas, um dos mais concorridos à época. Foi ai que senti o peso do Regime Militar. Permita-me contar: Em 1978 surgiu uma oportunidade de fazer concurso para Agente da Polícia Federal. Impressionado pelo salário e sem ter noção que iria trabalhar para o Regime, fiz o concurso e passei. Porém, não sei se para minha desgraça ou para o meu bem, fui excluído da PF sete dias antes de viajar para Brasília para fazer o curso de Agente. “Você é indigno dos quadros da Polícia Federal”, foi o que me disseram. O verdadeiro motivo eu nunca soube, mas desconfio que foi tão somente pelo fato de ter feito a primeira prova bêbado. Visivelmente em estado de embriagues, vindo de uma farra, amanheci no Ginásio Paulo Sarasate, local da prova, os Agentes Federais perceberam e me fizeram sentar bem à frente de todo mundo, olhando para cara deles. Acho que marcaram minha prova. Mas eu passei. Era bêbado, mas não era burro. Acho que foi só por isso. Bobagem.

O problema é que eu já tinha falado para meus colegas de faculdade que tinha passado no concurso, mostrei meu nome no jornal, etc., etc. Daí eles já ficaram meio cabreiros comigo e, imagina, dias depois eu chego pra eles e digo que foi expulso da PF e que não sabia o porquê disso. Resultado, eles não acreditaram na minha história e ficaram convictos que eu era um policial federal infiltrado na UECE. Ah, meu amigo, foi uma aflição. Ninguém queria mais conversar comigo. Chegava numa roda de estudantes e, um a um, iam se afastando. Arriscava falar algo contra o Regime, para ver se eles se aproximavam de mim, mas eles pensavam que eu estava provocando para ver quem eu ia delatar para o Sistema. Não tentei, mas se eu comentasse algo positivamente dos Generais ou da PF, com certeza minha situação se agravaria entre os colegas. Agora eu vivia entre medos, meu medo do Sistema e os colegas com medo de mim. Horrível.

Não sei, mas acho que ainda hoje tem gente daquela época que acredita que eu era mesmo um Agente Federal infiltrado na Universidade.