O gosto que o vento tem

Vivemos em uma sociedade nostálgica. Na qual as memórias, sejam elas visuais, olfativas ou de paladar impregnam nossa história e imaginário. Para mim, a memória dos lugares que eu fui vem pelo cheiro do vento.

Cidade do Porto, no norte de Portugal, o vento tem cheiro de pasteis de natas recém saídos do forno. O cheiro morno preenche as ruas apertadas e instáveis, os casarões abandoados e desfalecidos, dá peso à alma velha e desgastada dos habitantes sem a antiga glória da porta de escape da Europa.

Lisboa não, o vento de Lisboa tem gosto de sal. O vento bate forte nas paredes das velhas igrejas no alto dos morros. O vento assobia salgado nas portas dos comércios e dos palácios. O vento corta fundo, arrasta, judia. O sal doi na ferida do tempo e na perda da magnificência de ser o centro do mundo. Gosto rançoso, ruim de engolir. Lisboa é uma cidade salgada.

Mas Londres tem cheiro de frango frito, empanado, da senhora chinesa que não entende uma palavra de inglês – duvido que chinês ela entenda também, acho que ela é surda. Esse maldito frango frito vendido na feira de comida de Camden Town, bairro alternativo no norte-nordeste de Londres, é uma das melhores coisas de lá. A cidade em si não cheira a frango frito, mas o cheiro dessa comida é umas das melhores partes da cidade. Londres cheira a água corrente, a chá, a cerveja, café e a whiskey. Londres cheira líquidos, em suas mais variáveis formas.

O vento de Madrid tem gosto de churros, churros e kebab, por incrível que pareça. Madrid tem gosto de história para ser mais precisa. Madrid tem cheiro de churros, kebab, história e folhas secas que correm nos parques durante o outono. O vento lá tem cheiro de sossego.

Falta ainda sentir o cheiro do vento do resto do mundo. Imagino que o vento da Índia tenha cheiro de curry, e que o Egito tenha cheiro de incenso. Mas o que mais me intriga é o interior da Tosacana na Itália. Ficarei extremamente decepcionada, se o vento de lá não cheirar a pão assado.

Giovana Paganini
Enviado por Giovana Paganini em 21/11/2014
Reeditado em 21/11/2014
Código do texto: T5043456
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