Sobre as coisas incoerentes

Reparei que a maioria das coisas consideradas feias por nós são coisas incoerentes. Coisas assimétricas, coisas incomuns, coisas fora de esquadro: coisas esquisitas.

Mas as coisas raras são tão necessárias... Tão únicas: impossível livrar-se delas...

As coisas incoerentes são brilhantes. Honestas. Sinceras.

Exemplificando, lembrei-me do dia em que minha avó faleceu.

Meus primos e eu estávamos olhando a paisagem do cemitério (soa bem mórbido, mas o pôr-do-sol estava lindo aquele dia).

Logo, minha prima, ao tentar descer certo morrinho de grama, caiu e bateu as costas da forma mais tosca possível. Tivemos um ataque de riso, eu e meu primo. Logo, minha tia apareceu na janela, ríspida, e perguntou:

- Acham que hoje é dia de festa?!

Calamos-nos.

Sim, rir naquele dia não fazia sentido algum. Não era dia de festa, nós bem sabíamos disso. Foi um riso raro, muito difícil de surgir.

Quando surgiu, irrompeu o clima do dia e a paciência de minha tia.

Mas eu precisava daquele riso. Precisava de alguém que risse comigo e de pessoas que não achassem uma risada incoerente feia. Uma risada imprópria não é necessariamente indevida.

Em grande parte, as coisas fora de esquadro são coisas honestas. As coisas que não fazem sentido são sinceras: é raro vê-las. Ser verdadeiro é ser vulnerável, é tornar-se condenável.

Trocar segredos é perigoso. Dizer verdades duras é arriscado. Toma-se coragem para ser honesto. Respira-se fundo e dolorido nessas horas.

Já me aproveitando do tom pró-honestidade deste texto, confesso que não sei muito bem como terminá-lo. Então, só desejo que você tenha amigos que façam sua incoerência latente florescer (eu tenho e recomendo!), que você nunca esconda sorrisos ou verdades por medo da vulnerabilidade e que aprenda a viver mesmo que o tom esteja desarmônico e mesmo que o seu ritmo pareça incoerente.

Aproveite esses momentos estranhos quando eles irromperem seu dia.