O CRONISTA ESTÁ SEM PALAVRAS

Um país em pleno caos moral
não pode ser descrito facilmente

   Os acontecimentos no Brasil, neste Ano da Graça de 2007, tiveram um efeito inesperado: deixaram este cronista sem palavras. Habitando algum lugar entre a mais profunda indignação e a sensação de que nada pode ser feito, as palavras me abandonaram, expondo minha insignificância diante de tanto absurdo.
   Depois do milionésimo episódio de corrupção e mau-caratismo envolvendo o Congresso Nacional, desta vez com o próprio presidente do Senado, Renan Calheiros, percebi que tenho sido massa de manobra nos últimos 20 anos para justificar um suposto regime democrático que não disse a que veio. Presidentes se sucedem, tornando cada vez mais podre a relação entre executivo e Congresso, aumentando a carga de impostos, distribuindo dinheiro e informações privilegiadas entre seus amigos e aliados.
   A promiscuidade do poder nunca foi tão intensa quanto hoje, tanto que tenho a sensação de que não posso usar as mesmas palavras indignadas de antes para falar dos escândalos de agora ... Elas, simplesmente, já não são suficientes. Ao mesmo tempo, um jogo pouco sutil de medidas provisórias e leis votadas na calada da noite, justifica aumentos de salário para os políticos, a volta da censura (Deus nos livre!) como uma espécie de “mordaça democrática”, a destruição do meio ambiente, a violência generalizada e a farra política sem precedentes.
   Tudo parece conspirar para que o Brasil se torne um país sem solução, sério candidato a uma ditadura de pseudo-esquerda ao estilo Hugo Chaves, como se não passasse de uma Venezuela (com todo o respeito aos nossos vizinhos). Lula não está longe disso, com seu messianismo, ostentando mãos supostamente limpas enquanto chafurda no pântano da corrupção, em meio a aliados dos mais diferentes gêneros e tendências.
   Diante de tudo isso, o que fazemos – e aí me incluo – como povo brasileiro? Assistimos ao Jornal Nacional, indignados com aqueles em que votamos e nos quais votaremos novamente (ainda mais se a excrescência do voto em listas fechadas for aprovada na Reforma Política). Quando até os mais íntegros pisam na bola, quando a esquerda e a direita se misturam num grande “centrão”, que saída? Se nem o futebol brasileiro consegue ser exemplo de talento, raça e qualidade, o que fazer? Chamar Bernardinho – o do vôlei – para comandar o país também fora das quadras?
   Leio os cronistas de jornais e revistas, como O Globo e Veja, e percebo que a falta de palavras está em todo o lugar – como aquela chamada “quarta parede” do teatro, que, mesmo invisível, separa o palco da platéia, o imaginário do real. Temo que o fim, o apocalipse de nossa estranha realidade brasileira, esteja próximo com seus cavaleiros e trombetas.
   Nos dias de hoje, se me fosse permitido dirigir algumas palavras ao Brasil, certamente não seriam minha, pois estas me fugiram. Tomaria emprestados os versos do cisne negro Cruz e Souza: “andas a apodrecer por sobre a terra / antes de apodrecer nos sete palmos”. Se uma nação pode morrer, será num momento de desagregação e queda dos valores morais como este que vivemos agora.