Nas vibrações de outono


A passagem do vento, que se fazia ouvir na folhagem dos galhos de árvores frondosas, trazia consigo suaves vibrações de outono. Numerosas folhas, conscientes do cumprimento de sua função primeira, deixavam-se cair, formando em terra vasto tapete orgânico. O Sol, no horizonte, soberbo, mas sem ferir a visão humana, proporcionava ao local um ambiente mágico para a reflexão.

É nesse espaço vivo que Leôncio gosta de estar, nas tardes de temperatura amena, sempre que o trabalho lhe permite. Tem ali um antigo banco de pedra, onde se senta, que para ele se tornou cativo. A visão do esplendor da natureza – que a grande metrópole ainda guarda, graças ao esforço de idealistas – traz-lhe um pouco de conforto nas lutas diárias.

Homem íntegro e de boa vontade, é muito procurado por sua vizinhança, que vê nele uma referência de socorro. Prestativo, seu objetivo é colaborar na solução de difíceis embates que acompanham a trajetória humana. Deseja minimizar as ansiedades e as aflições desnecessárias, que estão na causa de moléstias físicas e mentais.

Leôncio reconhece que antes de qualquer coisa, a vida na Terra é apenas uma passagem, em geral tumultuada, sofrida, mas benéfica para o aprendizado do Ser, que em sua original concepção é um Espírito eterno. Aprendera consistentemente a respeito disso com os estudos do professor Paiva Netto, da Legião da Boa Vontade, que desenvolveu esse e outros temas em seus livros. Um deles, “Reflexões da Alma”, Leôncio trazia sempre consigo.

Mas nessa tarde de verão, ele se encontrava visivelmente triste e preocupado. Vem observando nos últimos tempos que determinados setores da sociedade insistem em passar aos cidadãos a falsa ideia de que o aborto provocado, ato inconsequente que interrompe a gravidez, é uma prática de menor importância.

Ao tentar compreender esses acontecimentos, Leôncio reflete sobre a História da civilização: – De tempos em tempos e em lugares diferentes, depois de propagandas persuasivas e tendenciosas, discursos carismáticos e inflamados, muita gente acaba tolerando culturas cruéis. Então perseguem ou matam seu próximo, porque este não pertence à mesma raça ou simplesmente porque não segue o pensamento considerado superior.

Com os olhos para o Céu, naquele momento já tingido pelo crepúsculo vespertino, Leôncio suplica, pesaroso: – Meu Deus!, proteja a vida inocente, fragilíssima, que tem no útero materno o único refúgio.

Ele compreende que nenhuma alegação da Ciência, da Religião, da Política, dos interesses públicos ou pessoais, pode privar do direito que a criatura, ainda na fase embrionária, possui de sobreviver.

Que sua oração tenha alcançado o bom destino, pois apesar do avanço intelectual, social, ético, ainda tem muita gente querendo violar a sagrada natureza da Vida.