Motivo

 

 

Eu canto porque o instante existe

e a minha vida está completa.

Não sou alegre nem sou triste:

sou poeta.

 

Irmão das coisas fugidias,

não sinto gozo nem tormento.

Atravesso noites e dias

no vento.

 

Se desmorono ou se edifico,

se permaneço ou me desfaço,

- não sei, não sei. Não sei se fico

ou passo.

 

Sei que canto. E a canção é tudo.

Tem sangue eterno a asa ritmada.

E um dia sei que estarei mudo:

- mais nada.

 

Cecília Meireles,Antologia Poética. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2001.

 

Eu canto para alegrar o meu pranto

Então sigo perdida, na vã estrada...

Da vida, já não quero nem mais nada,

Nem mesmo sei, se tem algum encanto...

 

Sou lágrima sentida, por fim canto...

E tenho alma sofrida, tão cansada!

Eu vivo assim, também angustiada...

São lamentos meus, sombrios, quão suplanto...

 

São sonetos com rimas, logo invento...

Vou voando versos... nas entrelinhas...

Vou acalmando-me do tal tormento...

 

Reflexos são meus, eu sou sentimento...

Um rio dessas palavras já tão minhas:

- Eu não sou nem poeta... Sim, nem tento!

 

© SOL Figueiredo

20/01/2013 – 15:30h

 

SOL Figueiredo e Cecília Meireles
Enviado por SOL Figueiredo em 20/01/2013
Reeditado em 12/03/2017
Código do texto: T4095381
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